Há algumas semanas chamámos à atenção para o facto de haver urgente necessidade de as instituições públicas começarem a ser mais abertas, mais transparentes e mais verdadeiras na abordagem dos seus problemas. Referimo-nos então ao INAGBE, o que, como é habitual entre nós, serviu apenas para chover mais no molhado. Cuidámos de lembrar que, tratando-se de um instituto público, não apenas não é propriedade dos seus responsáveis nem do Ministério que o superintende.

Somos agora surpreendidos com duas notícias que se limitam a demonstrar o que já estamos fartos de saber: Que a grande maioria das instituições do Estado a que pertencemos têm o mais profundo desprezo por quem as sustenta, não sendo capazes de agir - desde há décadas - obedecendo a parâmetros minimamente exigíveis a quem apenas deve obedecer aos seus regulamentos e funções.

A primeira, relativa a estudantes bolseiros no Reino de Marrocos, onde, no caso específico, além do complemento de bolsa nacional, têm uma componente financeira garantida pelas autoridades marroquinas.

Preocupados com esta situação, contactámos a nossa Embaixada, que, a título oficial, não apenas nos informou que os próprios funcionários da nossa representação diplomática, a começar pelo Embaixador Benigno Vieira Lopes, se solidarizaram com os estudantes, reunindo do seu próprio salário um valor entregue aos bolseiros, como, de caminho, nos deram a conhecer que parte substancial dos mesmos não tem aproveitamento escolar, mínimo que seja. O que, num país normal e organizado, devia levar ao regresso compulsivo desses bolseiros, dado ser inútil estarem fora do país a não estudar e a pressionar a já de si extremamente degradada situação económica.

A segunda questão tem a ver com as bolsas anualmente atribuídas a Angola pelo Estado português, via Instituto Camões. Que, só nos referindo a este ano, não só não foram anunciadas publicamente, como devem ter sido entregues já sabemos a quem. Ou seja: Não só são recebidas pela porta do cavalo, como não são publicitadas acabando por ir parar exactamente àqueles que tarde ou cedo - porque delas não têm necessidade - se virá a provar que não têm, quase nunca, aproveitamento.

A atribuição de bolsas de estudo, num país onde o ensino é dos piores do mundo e onde o nível de iliteracia e de ignorância é desmesurado, independentemente de quantos doutores e licenciados se apresentem oficialmente, cuja esmagadora maioria é incapaz de escrever uma redacção de uma dúzia de linhas sem dar um erro de língua portuguesa, deve obedecer a critérios rígidos, sérios, e não, como sucede desde há muitos anos, em função do estatuto social de quem concorre, das influências que move, de ser filho, neto ou bisneto seja de quem for.

Bem pelo contrário, devia concentrar-se nos bons estudantes (a sério) das classes mais desfavorecidas, ajudando assim a criar condições, a médio e longo prazos, para ajudar na diminuição das profundas e injustiças desigualdades sociais que se aprofundam dia após dia, falhada a política da acumulação primitiva do capital, na esperança desfeita de que parte substancial desses novos-ricos investissem o que lhes foi dado de mão beijada na sua própria terra e para benefício do povo que lhes permitiu acederem a esses privilégios.

Não. O efeito vem sendo exactamente o inverso. Várias demonstrações de uma perversidade sem limites, como se lhes desse um prazer escondido gozar com a miséria alheia, com a desgraça das comunidades, com o comportamento tipicamente neofeudal de impedir que jovens inteligentes, estudiosos, sérios, cujas origens sejam humildes, se vejam sistematicamente impedidos de terem acesso a um ensino muito mais sério, evoluído e preparado que o nosso.

Fechando-lhes as portas da possibilidade de um processo de aprofundamento das suas futuras áreas de especialidade e de um posterior retorno ao País, como cidadãos com mais-valias reais e concretas, ajudando-nos de forma efectiva e palpável a levar a cabo as profundas transformações que a nossa sociedade exige.

Nada disso. Continua-se a brincar com o que é sério, mantendo as prerrogativas de meia dúzia de privilegiados que nem sequer têm necessidade destas bolsas e, estranhamente, mantendo alunos sem aproveitamento e sem perfil moral nem intelectual como bolseiros. E que tal pôr um ponto final "nisto" e colocar o INAGBE dependente do Gabinete de Formação de Quadros da PR?