Este encontro entre Carlos Saturnino e os responsáveis de todas as multinacionais que operam o sector de produção angolano, segundo comunicado da petrolífera nacional enviado às redacções, visou analisar e discutir o estado do sector actual e propor que sejam avançadas novas ideias e projectos que permitam evitar a actual tendência para uma diminuição anual acentuada do número de barris extraídos.

Como a Agência Internacional de Energia (AIE) alerta no seu último relatório para 2018, a produção em Angola deverá decrescer dos actuais cerca de 1, 6 milhões de barris por dia para apenas 1,29 milhões em 2023.

As causas para esta diminuição, que poderá representar uma séria quebra das receitas para os cofres do Estado, que ainda tem no petróleo um clara dependência como motor económico nacional, é, em primeiro lugar, o desinvestimento, como explica a AIE, das multinacionais logo a seguir à quebra acentuada do preço do barril, em meados de 2014.

A quebra no valor do crude nos mercados internacionais não só levou a que Angola iniciasse um período de crise severa, que ainda está a viver, nomeadamente na dificuldade de acesso a divisas e a moeda estrangeira, como leque de consequências que se conhecem, como a dificuldade de importar matérias-primas e a manutenção do sector produtivo industrial activo, entre outras, como também ao abandono dos investimentos nos blocos operados pela multinacionais petrolíferas.

Essa realidade levou, por sua vez, a que as infra-estruturas sofressem um desgaste acentuado, impedindo agora a retoma da produção sem que, antes, sejam investidos milhões para a sua recuperação e reactivação, que as empresas tendem a não avançar devido à volatilidade dos mercados, que assistem agora a um aumento dos preços do barril mas por razões administrativas, como os cortes da OPEP ou crises internacionais, e não devido a escassez de reservas da matéria-prima.

No entanto, o Governo angolano e a Sonangol desenvolvem actualmente esforços para alterar este cenário - há mesmo um recente sinal positivo, segundo a OPEP, com um aumento de 14 mil barris por dia de Março para Maio - nomeadamente através da produção legislativa, como foi o recente caso dos decretos presidenciais que levaram a uma diminuição das taxas em redor dos 50 por cento aplicadas, por exemplo, aos campos marginais, normalmente aqueles com reservas inferiores a 300 milhões de barris e que as petrolíferas tendem a desconsiderar pela difícil rentabilização do investimento.

Neste encontro com as petrolíferas, o presidente do CA da Sonangol chamou especificamente à atenção para essa questão, quando foi abordado o ponto sobre a manutenção das infra-estruturas, "o que tem criado algumas perdas substanciais", avança o comunicado emitido pelo gabinete de comunicação da petrolífera nacional.

Este foi o primeiro dos vários encontros do género que a Sonangol pretende realizar, estando o próximo marcado para Julho, e para o qual Saturnino desafiou as operadoras a apresentarem propostas e projectos que permitam "a curto prazo" auxiliar as acções já em curso para levar a um aumento da produção nacional, contrariando a tendência para o declínio.

No entanto, os riscos no horizonte para o objectivo da Sonangol podem surgir já no próximo dia 22, quando a OPEP reunir em Viena de Áustria para analisar o actual estado dos mercados, estando em cima da mesa um possível aumento da produção, que levará auma diminuição do preço do barril e o consequente aumento da resistência das operadoras a investirem em Angola os milhões necessários para reactivarem a sua infra-estrutura produtiva.

OPEP e os amigos é que vão decidir

A Organização dos Países Produtores de Petróleo (OPEP) e os seus aliados na estratégia de cortes iniciada em Janeiro de 2017 para engordar o preço do barril, com a Rússia à frente, vão reunir a 22 deste mês, em Viena de Áustria, com a possibilidade de aumento da produção na agenda e, a antecipar esse encontro, o preço do barril a descer nos mercados internacionais.

Se até aqui, pelo menos nos últimos 18 meses, estes encontros antecipavam novos cortes na produção, ou novos prazos a prolongar o calendário estabelecido para manter a produção controlada, e os preços subiam, agora é ao contrário... a expectativa é de aumento na produção e os preços estão a descer ou, na melhor das hipóteses, estagnados.

Se se confirmar a possibilidade que tem sido admitida, mesmo que ainda não confirmada, pelos ministros da Energia e dos Petróleos da Rússia e da Arábia Saudita, os dois gigantes mundiais envolvidos nestas negociações, Alexander Novak e Khalid A. Al-Falih, de colocar um milhão de barris por dia (mbpd) extra no mercado, para compensar as quebras oriundas da Venezuela - cujos problemas são semelhantes aos de Angola - e as esperadas devido ao regresso das sanções norte-americanas ao Irão, o petróleo, alertam os analistas, pode dar um trambolhão histórico nos gráficos dos mercados internacionais.

Por exemplo, o Brent londrino, que há cerca de um mês bateu nos 80 USD por barril, está agora numa curva descendente de regresso aos 75 USD, com pequenas oscilações nos últimos dias.

E se a queda continuar, os países em maiores dificuldades vão ser aqueles que mais sofreram com a quebra no valor do crude em meados de 2014, como Angola ou a Venezuela, cujas economias mais dependem do petróleo e onde os grandes investidores globais, ou seja, as companhias petrolíferas que lideram os sectores da pesquisa e produção, mais depressa abandonaram ou colocaram em stand by as suas actividades devido ao elevado custo de produção - 18 USD por barril em média no que toca a Angola - em comparação com outras regiões, como o Médio Oriente - onde o barril sai do solo em média por 7/8 USD.

Neste momento, Angola observa uma folga substancial nas suas contas públicas porque o Orçamento Geral do Estado foi elaborado com o barril a 50 USD e está a ser vendido acima dos 75 dólares norte-americanos.

Mas tudo vai depender do que ficar decidido na capital austríaca, quando os países da OPEP, que inclui Angola como membro de pleno direito, e os aliados nesta circunstância, como a Rússia, o México ou o Cazaquistão, entre outros, se reunirem a 22 de Junho, para definirem ou redefinirem a sua estratégia de cortes ou de regresso aos aumentos na produção, que é o que, aparentemente o Presidente dos EUA, Donald Trump, já pediu, embora discretamente, à OPEP, para fazer, na ordem dos 1 mbpd, para controlar o preço da gasolina no seu país.

Os prolongados efeitos dos cortes de Janeiro de 2017

Actualmente, vigora o corte de 1,8 milhões de barris por dia, iniciado a 01 de Janeiro de 2017, o que permitiu elevar o preço do barril para os actuais 75 USD, quando, por exemplo, no início de 2016 chegou aos 27 USD por barril, o que fez soar as campainhas em todo o mapa dos produtores.

O que se sabe, a partir de algumas ideias avançadas pelos ministros Alexander Novak, da Rússia, actualmente o 2º maior produtor mundial, e Khalid A. Al-Falih, da Arábia Saudita, o líder mundial, apesar de circunstancialmente não o seja, é que os actuais preços são considerados bastante bons pelo grandes produtores e a possibilidade de crescerem ainda mais, devido a problemas, por exemplo, na Venezuela, ou no Irão, não é encarada como benigna.

Isto, porque, como disse o responsável saudita há escassos meses, o preço elevado do barril impede o controlo sobre a produção do petróleo de xisto, ou "fracking" nos EUA, que pode desequilibrar os mercados com a sua produção alternativa mas que só é viável se o barril ultrapassar os 70 USD no mercado de Nova Iorque, WTI, onde está, de facto, actualmente.

O que quer dizer que, para poderem ter algum controlo sobre este sector, onde o breakeven é alto, Riade e Moscovo, os líderes de facto da OPEP e da estratégia de cortes em vigor, podem ser levados a optar pelo aumento da produção, porque não deixar crescer muito os preços pode ser a melhor opção para os países produtores, mesmo para aqueles cujas economias dependem mais do crude, como é o caso da Arábia Saudita ou mesmo da Rússia.

Para já, mesmo sem se saber qual vai ser a decisão, havendo apenas pequenas pistas, os mercados já estão a reagir e a dar como certo que Riade e Moscovo vão acrescentar 1 mbpd à produção actual para compensar as quebras venezuelana, cuja infra-estrutura produtiva está em ruínas devido à crise política e económica que o país atravessa, mesmo sendo o que possui as maiores reservas em todo o mundo, e no Irão, onde os EUA de Trump voltaram a impor sanções depois de terem denunciado unilateralmente o acordo nuclear em vigor desde 2015.

No entanto, a decisão a sair de Viena pode muito bem ser outra e a todos surpreender: em vez de aumentar a produção, o cartel e a Rússia podem encurtar o período de manutenção do corte de 1,8 mbpd, que está previsto para o início de 2019.

A outra possibilidade, é, efectivamente aumentar a produção em algumas centenas de milhares de barris por dia, mas prolongar o calendário de cortes para meados de 2019.

O que se sabe de forma clara é que se Moscovo e Riade optarem por defender o aumento da produção, vão contar com a oposição de alguns dos colegas à mesa, porque estes aumentos no preço do barril têm sido uma verdadeira tábua de salvação, como é o caso de Angola, mas também da Nigéria, da Líbia, da Venezuela, entre outros.