Com o resultado deste concurso, realizado, explica a Sonangol em comunicado, a partir da responsabilidade de superintendência da empresa sobre o fornecimento de derivados do petróleo, ficou definido que a Trafigura fica responsável pelo abastecimento do mercado de gasóleo e gasóleo marinha, enquanto a Total está agora encarregada de fazer chegar ao mercado angolano a gasolina necessária para os próximos 12 meses.

Este concurso, cujos envelopes com as propostasa foram abertos em Março, vê assim os resultados divulgados, com a Francesa Total e a empresa com sede em genebra, na Suíça, Trafigura, a deixarem para trás um conjunto de nove concorrentes que chegaram à fase da análise das propostas e das vantagens comerciais, depois de terem sido convidadas 29 companhias.

Esta informação surge agora num contexto de "day after" de uma grave crise de abastecimento de combustíveis, com vários dias sem combustíveis nos postos de abastecimento, que levou à exoneração da Administração de Carlos Saturnino, na Sonangol.

Este concurso resultou ainda no regresso da Trafigura, com ligações aos generais Leopoldino do Nascimento "Dino" e Hélder Vieira Dias "Kopelipa", como fornecedor de combustíveis ao país, depois de ter sido afastada do sector, onde estava em sistema de monopólio, em Setembro de 2018, num cenário onde o Presidente João Lourenço estava em fase de construção da sua marca pessoal e território de governação.

Segundo o comunicado da Sonangol, a decisão da escolha da Total e da Trafigura resultou da avaliação da "economicidade" das propostas concluída após as devidas "clarificações e negociações".

Com este resultado, a Sonangol garante que não vão surgir quaisquer oscilações no mercado.

Exportar petróleo, importar derivados

Apesar de Angola ser o segundo maior exportador de petróleo do continente africano, com cerca de 1,4 milhões de barris por dia, a sua capacidade de refinação, processo que permite transformar o crude em bruto em gasolina, gasóleo e outros refinados, como lubrificantes, é muito limitada, o que obriga a que a solução passe pela importação, o que consome anualmente cerca de mil milhões de USD aos cofres do Estado.

A única refinaria do país, construída na longínqua década de 1950, situada em Luanda, tem uma capacidade limitada de refinação, apenas 60 mil barris por dia, quando o país carece de mais de 200 mil barris por dia.

Todo o restante combustível é adquirido nos mercados internacionais a um preço médio muito superior ao valor na bomba para venda ao consumidor em Angola, que é de 160 Akz/litro.

Para manter estes preços, o Estado atribui um subsídio - via Sonangol - estimado, segundo algumas fontes, em cerca de 100 Akz por cada litro de combustível adquirido pelo público.

A Sonangol alude ainda a dívidas pesadas das empresas industriais angolanas, que são responsáveis por 40 por cento do consumo de combustíveis no país, seja na laboração da maquinaria, seja na geração de energia eléctrica através de grupos geradores.

O fim anunciado dos subsídios

Face a este gasto avultado, que é de cerca de 74 milhões de USD por mês, segundo as contas referentes ao primeiro trimestre deste ano, duas novas refinarias, recorde-se, estão em fase de lançamento em Angola, uma em Cabinda, com capacidade para 70 mil barris de crude bruto refiando por dia, e a do Lobito, com 200 mil barris diários de capacidade.

Mas, como o Fundo Monetário Internacional (FMI), já veio dizer de forma clara, o maior problema de Angola nesta questão resulta dos gastos avultados com a subsidiação dos combustíveis via Sonangol, estando em curso um processo de retirada desses mesmos subsídios pelo Estado para que o mercado se possa regularizar.

Isso mesmo foi dito pelo Ministério dos Recursos Naturais e Petróleo (MIREMPET), no mês passado, ao anunciar que a subvenção aos combustíveis, que permite manter em Angola o preço da gasolina e do gasóleo muito abaixo do preço de mercado, vai cair até meados de 2020.

Esta decisão do Executivo, que é uma exigência do FMI com vários anos, vai ser aplicada quando, em Junho de 2020, entrar em vigor o novo modelo de importação de derivados do petróleo, que liberaliza a importação da gasolina e do gasóleo, o que deverá gerar uma profunda alteração nas regras que hoje garantem o preço fixo nos postos de abastecimento.

A ideia de proceder à liberalização total do mercado de importação de derivados de petróleo foi avançada primeiramente, de forma oficial, em 22 de Novembro de 2018 pelo então secretário de Estado dos Petróleos angolano, Paulino Jerónimo, actual presidente da Agência Nacional de Petróleo, Gás (ANPG), em que indicou que seria aberta às empresas petrolíferas interessadas no negócio.

"Vamos liberalizar totalmente para que entrem outras empresas distribuidoras de derivados de petróleo", afirmou na ocasião Paulino Jerónimo, realçando que a Sonangol, por decisão do Governo, não é a detentora do monopólio.

No entanto, há vários anos que a imprensa nacional e internacional tem vindo a dar como garantido que, mais cedo ou mais tarde, o estado angolano vai ter de deixar de subsidiar os combustíveis, o que vai gerar fortes protestos populares devido ao impacto que isso vai ter na vida das pessoas, desde logo no preço dos táxis utilizados por centenas de milhares de pessoas diariamente, só na cidade de Luanda.