Na direcção da Baixa, engolia ainda o morro depois da Comandante Arguelles, por trás da Clínica do Prenda, e que vai até ao antigo bairro dos cooperantes, da antiga Logitécnica, já tendo como fronteira a Revolução de Outubro. Juvelina vivia numa casa de renda nesse espaço, por trás da Clínica. Empregada doméstica em Talatona, para onde ia e vinha de táxi, que apanhava junto ao Nzamba 2, e tinha até uma filha que jogava basquetebol no CODEMN.

A vida de Juvelina deu uma reviravolta quando o pedaço de terreno onde se encontrava a casa em que vivia foi integrado num plano de remodelação urbana, estando prevista a demolição de toda a área construída naquela encosta. Depois de um momento de muita incerteza rem relação ao futuro, apareceu a oferta de um realojamento num dos novos bairros sociais em construção pelo Governo. Calhou-lhe o Panguila. Não já nos primeiros lotes, mais junto à estrada que liga Luanda a Caxito, mas lá para dentro. Construíram-se uns milhares de casas naquela zona.

As ruas não são asfaltadas, mas há as infra-estruturas indispensáveis, incluindo redes de água e electricidade.

- E a escola, Juvelina?

- Os meninos têm escola perto. A menina (a que sonhava ser campeã pelo D"Agosto, e, quiçá, representar as cores do País na selecção nacional) é que deixou de jogar. Não dá!

Juvelina ficou dividida. Perdeu o contacto com a realidade a que estava habituada. Passou do centro da cidade para uma distante periferia, que nem faz sequer parte da cidade. Nem da província. Mas passou a ter uma casa. Tem casa a Juvelina. Com quintal.

- E as compras, Juvelina?

- Tem um mamadou perto. E o mercado do Panguila está ali. Tem só de se apanhar um cupapata.

O emprego é que ficou muito longe. Mas Juvelina não o quer perder. Não é fácil arranjar emprego, e só com o dinheiro do marido, que é segurança, não dá para alimentar os quatro filhos. E os netos que as filhas já têm, e muito dependem deles. As filhas ainda estudam, e os pais das crianças também não têm emprego fixo.

Juvelina vem do Panguila a Talatona todos os dias. Começa por apanhar um moto-táxi até ao mercado. Depois um táxi até Cacuaco. Depois outro até ao Porto. E outro até Talatona. Chega ao local de trabalho de madrugada, pois a jornada tem de começar bem cedo: pouco depois das 3h, ainda o Sol dorme a sono solto. Chega a casa a meio da tarde. Vai e vem aperaltada, com a roupa vistosa de que tanto gosta.

O estado de emergência está a proporcionar-lhe umas férias prolongadas. Mas está preocupada. As novas regras já permitem que ela trabalhe, mas o cerco sanitário, e as dúvidas sobre o contágio, ainda o impede.

Será que está garantido o sustento da família, amanhã?