Esta declaração do Presidente chinês emerge de um contexto internacional em que países ocidentais, nomeadamente europeus como o Reino Unido, França e Alemanha, bem como os EUA, estão a fazer sucessivas investidas em África - Angela Merkel, da Alemanha, e Theresa May, do Reino Unido, estiveram estes dias em périplos africanos - para recuperar a influência e o território de investimento e de acesso a matérias-primas que nas últimas duas décadas Pequim ocupou com as suas gigantescas linhas de crédito, que já trouxeram, crêem alguns analistas, mais de 120 mil milhões de dólares para o continente só em investimento.

Angola é um dos territórios onde a influência chinesa mais se fez visível nos últimos 20 anos, quase exclusivamente a partir do seu papel decisivo na reconstrução do país após o fim da guerra, em 2002, tendo, segundo dados oficiosos, injectado mais de 20 mil milhões de dólares no país, estando presentemente o Executivo de João Lourenço a preparar mais um pacote de 11 mil milhões com as instituições financeiras chinesas.

Como a agência oficial chinesa, Xinhua, escreve a propósito do encontro entre Xi JInping e João Lourenço, o líder chinês prometeu ao Chefe de Estado angolano reforçar a parceria estratégia existente, assinada há oito anos, aproveitando a comemoração dos 35 anos desde que Luanda e Pequim estabeleceram relações diplomáticas.

Isso passará, garantiu Xi, por "apoiar as mudanças em execução pelo partido no poder (em Angola) e a experiência de governação, partilhando o aprofundamento da cooperação em todas as áreas e a consolidação do diálogo para formar posições sobre os assuntos internacionais de maior interesse".

Uma das promessas de Xi é incluir Angola na nova Rota da Seda - versão estrada, o mais gigante dos maiores projectos ambiciosos lançados pela China em muitos anos, lançado em 2013 - cujo objectivo é abrir acessos entre a Ásia, Europa e África, o que poderá, quando estiver concluída, "lubrificar" o comércio global favorecendo os países incluídos neste novo mapa mundi dos transportes, que contém também uma versão ferroviária e marítima.

Os valores envolvidos neste megaprojecto são astronómicos e só até agora Perquim já disponibilizou, directa ou via bancos estatais, cerca de 70 mil milhões USD, embora não existam dados oficiais definitivos, abrangendo este mapa rodoviário, ferroviário e marítimo mais de 2/3 da economia mundial, passando por 68 países quando estiver concluído.

Segundo o líder chinês, esta aposta - a inclusão de Angola no mapa da Nova Rota da Seda - vai ajudar a catapultar o esforço de diversificação da economia angolana, que é um dos grandes objectivos do Governo de Luanda, a quem garante manter apoio financeiro sem "quaisquer condições políticas" coladas a esta "oferta".

No entanto, como tem sido sublinhado por organismos internacionais, o investimento chinês em África é, quase sem excepções, constituído pelo financiamento, pela condução dos trabalhos, nomeadamente infra-estruturas - que é o caso de Angola -, com empresas e mão-de-obra exclusivamente chinesas, impedindo os países de absorverem conhecimento e formar os seus cidadãos nacionais nos domínios em questão.

JLo elogia Pequim

Por seu lado, o Presidente angolano, ainda de acordo com a Xinhua, sublinhou a solidez das relações entre os dois países, tendo agradecido o empenho chinês no processo de reconstrução nacional e o seu desenvolvimento económico e social, deixando claro o apoio de Luanda à política de uma só China, referindo-se à disputa pela ilha Formosa (Taiwan).

"A China sempre deu o seu precioso apoio a África quando o continente enfrentava dificuldades e desempenhou sempre um papel para o desenvolvimento e a paz em África", disse João Lourenço, acrescentando que a importância do Fórum para a Parceria África-China (FOCAC), tendo os dois lideres assistido a cerimónias de assinatura de acordos bilaterais

China reforça laços com África - ocidente vê o comboio a passar

Já fora do âmbito bilateral, o líder chinês, dirigindo-se aos seus homólogos e governantes africanos presentes para o FOCAC, que hoje começa em Pequim, retomou a ideia da ausência de condições políticas no investimento dirigido a África, afastando-se de forma clara e inequívoca daquela que é a tradição dos países ocidentais, que passa por condicionar a cooperação e ajuda no continente ao controlo das práticas democráticas dos países beneficiados.

Esta promessa reiterada surge numa altura em que, por exemplo, a Câmara de Comércio Americana em Angola (AmCham Angola) esteve reunida dois dias antes do arranque do FOCAC, divulgando dados sobre o comércio bilateral, que atingiu em 2017, 3,3 mil milhões USD, sendo que 2,6 mil milhões são quase em exclusivo exportações em petróleo angolano para os EUA, da qual emergiram promessas de aumentar o apoio de Washington à economia angolana.

E, ainda na mesma semana, a chanceler alemã, Angela Merkel esteve numa visita relâmpago por três países africanos, o mesmo número de países visitados no mesmo período pela primeira-ministra britânica Theresa May, naquilo que analistas já apontaram como um esforço europeu e norte-americano para minimizar o impacto da aceleração da parceria chinesa com os países africanos.

Alias, é dos países ocidentais que estão a sair as repetidas acusações de que a Nova Rota da Seda não leva apenas estradas para África, leva também como condição o alinhamento do continente com a política externa de Pequim, o que Xi Jinping refutou de forma clara ontem na capital chinesa em frente a dezenas de lideres africanos.

No entanto, como o NJOnline noticiou, hás alguns dias, o Presidente da Namíbia, que lidera actualmente a Presidência rotativa da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC), Hage Gingob, teve uma discussão curiosa com o embaixador chinês na Namíbia, revelando a hipótese de que Pequim não deixa de ter algumas pretensões de conduzir os Estados africanos para um alinhamento comas suas pretensões internacionais.

Isto, porque Geingob, num encontro em Windhoek, onde se preparava o arranque do FOCAC, e onde o Presidente namibiano vai falar na condição de líder da SADC, avisou o embaixador chinês para não lhe dizer o que devia ou não dizer no seu discurso em Pequim porque nem ele nem os seus assessores que escrevem os discursos são "marionetas".

Tal sucedeu, segundo o The Namibian, porque o diplomata chinês, mesmo perante jornalistas, disse a Hage Geingob que este deveria elogiar, na condição de "homem de Estado", a política chinesa para África e que o seu país apoiava de forma clara a visão de Pequim na arena internacional.

"Nós não somos marionetas", respondeu Gengob, avisando o representante chinês para não se intrometer naquilo que é a forma como a Namíbia define as suas políticas e posicionamentos internacionais.

No entanto, face a este cenário, Xi Jinping, na abertura da cerimónia do diálogo de alto nível entre líderes, que antecedeu a abertura do FOCAC, reforçou a ideia contrária perante os seus homólogos: "A China não interfere nos assuntos internos de África e não impõe a sua vontade sobre África", defendendo o diálogo para procurar aproximar pontos de vista.

PCC toma posição dura para com o ocidente

A esse respeito, o Global Times, jornal em língua inglesa do grupo Diário do Povo, órgão oficial do Partido Comunista Chinês (PCC), acusou mesmo o ocidente de "inveja" do papel crescente em importância da China em África.

Em Editorial, o Global Times, denuncia a forma como os países ocidentais acusam a China de estar a pilhar os recursos naturais africanos e agrilhoar os Estados com a dívida galopante para melhor os controlar.

"Preferem revelar dor de cotovelo, ao invés de refletirem por que é que a colaboração de África com os Estados Unidos e a Europa ficou para trás", acusa o jornal.

O "problema fundamental" é que o ocidente menospreza África e "trata o continente como se fosse o seu quintal", acrescenta o texto que reflecte a visão do PCC, citado pela Lusa.