Uma das vozes mais críticas é a de Ngola Kabangu, antigo líder do grupo parlamentar da FNLA, que considerou que "o Parlamento está manietado pelo titular do Poder Executivo, o Presidente da República, que usa e abusa da maioria do seu partido, o MPLA, para encomendar as leis que mais lhe interessam".

"Foi, portanto, uma legislatura sem acções reais de fiscalização dos actos do Governo", acusou, salientando que "não se podia esperar um balanço positivo de um Parlamento que abdicou da essência do seu poder legislativo".

Segundo o político, os diplomas mais importantes, os que poderiam ter um impacto sobre a vida das populações nos domínios da educação, saúde, segurança alimentar, fornecimento de água e energia, transporte e habitação, não só não foram votados, como também não houve um debate sério e democrático sobre os mesmos.

"O balanço da legislatura que chega ao seu término foi negativo. É lamentável para um País que se proclama democrático", concluiu.

O porta-voz da UNITA, Alcides Sakala, referiu que, durante estes últimos cinco anos, podiam ter avançado mais sobre um conjunto de questões que dizem respeito à construção do processo democrático e da própria reconciliação nacional.

"A primeira nota negativa é sobre a não transmissão em directo dos debates parlamentares o que criou a percepção de um parlamento que trabalha pouco. Os debates em directo permitem a avaliação do desempenho dos deputados e não só. Ao impor a censura às intervenções dos deputados, criou-se a ideia de um parlamento às ordens do executivo, do poder central, contrariamente à doutrina da separação de poderes", argumentou.

A segunda nota negativa avançada pelo deputado da UNITA é sobre a proibição dos deputados de fiscalizarem os actos da governação.

"A terceira questão foi a falta de vontade política da maioria parlamentar de acatar as várias recomendações decorrentes das discussões sobre os vários Orçamentos Gerais do Estado, aprovados nestes últimos cinco anos", esclareceu, salientando que " foram recomendações pertinentes que poderiam ter melhorado substancialmente os conteúdos sociais dos vários orçamentos".

"Infelizmente verificou-se que as áreas sociais foram sempre as mais prejudicadas, ficando os órgãos centrais com mais de 80% do bolo orçamental, o que teve um impacto muito negativo na vida das populações, nas áreas da saúde, educação, saneamento básico e emprego", frisou.

Uma das notas positivas, segundo Alcides Sakala, tem a ver com os consensos nas discussões sobre as autarquias e respectivo enquadramento jurídico a que se chegou: "É um passo importante sobre a descentralização".

O director da Associação Rede Terra, Bernardo Castro, disse que em nenhum momento a Assembleia Nacional se preocupou em questionar como é a governação fundiária no País.

"Vários instrumentos normativos previstos na legislação fundiária não foram publicados. O maior exemplo é o Despacho Conjunto sobre a Tabela do Preço da Terra, fonte legal de receitas fundiárias do Estado", precisou.

Segundo ele, o Governo não sabe, desde 2004, a área total do território que foi objecto de concessão nem o quanto ganhou com o negócio fundiário.

"Os conflitos de terras cresceram, de forma assustadora, mas não foram respondidos de forma inteligente e justa. As terras rurais comunitárias continuam sem títulos de reconhecimento e, por isso, desprotegidas", acrescentou.

"As famílias estão aqui, hoje, mas não sabem para onde poderão estar amanhã. Trata-se de insegurança de posse do património natural e construído, inserido no Domínio Útil Consuetudinário", disse.

Na sua opinião, em meio urbano continuou a existir uma colonização urbana que permitiu todo o tipo de especulação imobiliária, expondo as classes sem poder de decisão e com baixos rendimentos em condições de risco e vulnerabilidade nas periferias.

"A política continuou a ser alimentada mais por opiniões do que pela ciência. O acesso à informação sobretudo para os pesquisadores, amigos do saber, não melhorou", notou.

De acordo com Bernardo Castro, a sociedade civil continuou a ser vista como uma força do mal, tendo-se infernizado o trabalho daqueles que se entregam à causa da filantropia através das Organizações Não-Governamentais.

"Grande parte de políticas públicas que tivemos não foi guiada segundo os critérios da ética da sustentabilidade nem vigilantes face ao risco. Muitas comunidades em meio rural continuam sob o cerco dos marcos coloniais", concluiu.

O presidente da Associação Mãos Livres, Salvador Freire, faz uma apreciação negativa do ano legislativo. "A apreciação que faço é negativa porque, para mim, significa que o Parlamento Angolano não esteve engajado num conjunto de normas recolhidas e escritas, baseadas na experiência e realidade angolanas, que servem para ligar os factos ou os acontecimentos ao direito, em ordem a paz social e reconstrução nacional e assim atingir a igualdade e a liberdade entre os cidadãos", acrescentou.

Já o deputado do MPLA, Tomás da Silva, defende que a legislatura prestes a terminar foi um sucesso, face a vários diplomas importantes que foram aprovados. "A própria oposição sabe que muita boa coisa foi aprovada nesta legislatura. Vamos transitar para a futura legislatura com a cabeça erguida".

A Assembleia Nacional aprovou, durante o Ano Legislativo 2015/2016, 38 leis e 59 resoluções.

Dos documentos anuídos, o relatório destaca a Lei de Registo Eleitoral Oficioso, Lei da alteração a Lei da Nacionalidade, Lei de alteração ao Código de Registo Predial, Lei sobre a Comunicação de Fixação e Alteração de Residência dos Cidadãos, Lei dos Contratos Públicos, Lei da Acessibilidades e a Lei de Amnistia.

Nos termos do Regimento da Assembleia Nacional, a Legislatura compreende cinco sessões Legislativas ou anos parlamentares, sendo que cada ciclo inicia a 15 de Outubro e termina a 15 de Agosto do ano seguinte.

Na legislatura a finalizar, o MPLA contou com 175 deputados, a UNITA com 32, a CASA-CE com oito, o PRS com três, e a FNLA com dois.

A recordar que o programa solene de encerramento da 5ª Sessão Legislativa da III Legislatura da Assembleia Nacional está divido em dois momentos, sendo o primeiro reservado à apresentação do balanço do ano parlamentar 2016/2017 e o segundo para o discurso de encerramento do período parlamentar em referência, pelo Presidente da Assembleia Nacional, Fernando da Piedade Dias dos Santos.

A Assembleia Nacional é o parlamento da República de Angola, um órgão de soberania, de legislatura unicameral. De acordo com a Constituição, representa o povo e é investida de poder legislativo.

É composta por 220 deputados (legisladores), sendo que 130 são eleitos pela representação proporcional e 90 pelos círculos provinciais. Teoricamente a Assembleia Nacional é renovada a cada cinco anos.

Segundo apurou o Novo Jornal Online, os primeiros secretários provinciais do MPLA também vão interromper a campanha no dia do encerramento da 5ª Sessão Legislativa da III Legislatura da Assembleia Nacional.