Questionado sobre a intenção do Governo angolano de encerrar os consulados em Lisboa e Faro, o chefe da Diplomacia portuguesa respondeu não ter nada a dizer, acrescentando que "essas comunicações são por via formal".

Segundo Augusto Santos Silva, citado pela agência Lusa, "as relações diplomáticas entre os dois países são, neste momento, excelentes".

O governante luso deu como exemplo dessa excelência "a confirmação da hora e do local do próximo encontro bilateral de alto nível entre Portugal e Angola em Davos, na Suíça", que vai juntar o Presidente João Lourenço ao primeiro-ministro português, António Costa.

O ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal desvalorizou igualmente a polémica sobre possíveis retaliações de Luanda a Lisboa, em resposta à recusa da Justiça lusa de transferir para Angola o processo contra o ex-vice-Presidente Manuel Vicente.

"Não temo nada. Não ignoro que há aqui - como o primeiro-ministro disse, numa expressão que me pareceu feliz - um irritante. Há uma agravante que é: a solução desse irritante não está nas mãos, nem do presidente da República, nem da Assembleia da República, nem do governo. Não está nas mãos do poder político, mas com paciência, com sentido de Estado, com a responsabilidade de todos, superaremos esse irritante e convém não exagerá-lo", declarou.

Santos Silva demarcou-se dessa polémica judicial, sublinhando que "à justiça o que é da justiça, à política o que é da política", e lembrou que a sua missão é tratar apenas da política externa.

Neste domínio, o governante garante que ministério que tutela tem trabalhado para que "o relacionamento entre Portugal e Angola se intensifique" porque é um "interesse recíproco".

"Nós temos muito densas relações históricas, partilhamos a mesma língua, pertencemos a várias organizações multilaterais e concertamos as nossas posições dentro dessas organizações e temos um relacionamento económico muito denso", salientou.

As declarações do chefe da Diplomacia portuguesa foram entretanto secundadas pelo Presidente da República de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, que também não se quis pronunciar sobre o possível encerramento dos consulados angolanos em terras lusas.

"Não queria agora comentar nada. O senhor ministro dos Negócios Estrangeiros já disse que as relações diplomáticas estão a correr em muito bom plano, ele até utilizou a palavra excelentes", afirmou o Chefe de Estado, acrescentando: "Politicamente, diplomaticamente, é verdade".

A leitura portuguesa não parece coincidir com a angolana, a avaliar pelas recentes declarações do Presidente da República.

A "ofensa para Angola" que o caso Manuel Vicente representa

João Lourenço já deixou um claro aviso a Portugal de que as relações bilaterais podem ser seriamente afectadas, exigindo que o processo de Vicente seja transferido para os tribunais angolanos, como o prevê o acordo existente no âmbito da CPLP (Comunidade de Países de Língua Portuguesa).

O Chefe de Estado, recorde-se, disse, na conferência de imprensa realizada na semana passada, que Portugal não foi "lamentavelmente" ao encontro ao pedido de Angola, dizendo que "não confiava na Justiça angolana". O Presidente da República acrescentou que isso foi "uma ofensa para Angola", apesar de não estar em causa o pedido de absolvição ou de arquivamento do processo, mas tão só a transferência deste para os tribunais angolanos.

"Nós não somos juízes e não temos competência para dizer se o engenheiro Manuel Vicente cometeu ou não cometeu o crime de que é acusado", sublinhou ainda João Lourenço.

Em causa está o alegado pagamento de 760 mil euros ao ex-magistrado do Ministério Público de Portugal, Orlando Figueira, para arquivar dois processos, um deles o caso Portmill, relacionado com a suposta aquisição de um imóvel de luxo no Estoril.

"Não existem provas materiais para acusar Manuel Vicente", defende o Chefe da Diplomacia angolana, que alude às recentes declarações do advogado do ex-vice-Presidente da República, Paulo Blanco, bem como do ex-procurador Orlando Figueira, coincidentes na ilibação do antigo número um da Sonangol.

Manuel Augusto insiste que cabe a Portugal decidir o futuro da cooperação. "No dia em que este caso for solucionado, de um momento para o outro tanto o Presidente Marcelo [Rebelo de Sousa] como o primeiro-ministro [António] Costa poderão vir a Angola, assim como o nosso Presidente ir a Lisboa", antecipa o ministro das Relações Exteriores.