Foram 27 os anos de sofrimento devido ao conflito armado em Angola, que teve início em 1975, depois da independência, e só terminou em 2002, com a assinatura do acordo de paz entre o MPLA e a UNITA, mas, a juntar-se a esses anos, mais dezasseis passaram sem que a população visse chegar Luacano os benefícios de uma país em paz e em desenvolvimento.

O hospital e o centro de Saúde carecem de medicamentos. Não existe morgue. As doenças diarreicas somam e seguem, dia após dia. As escolas têm défice de carteiras e material escolar, há crianças fora do sistema do ensino, não há água potável, falta energia.

Quase que pode dizer-se que, para além dos habitantes, neste município não existe nada.

O NJOnline acompanhou o governador do Moxico, empossado há oito meses, numa volta pela região. Foi a primeira vez que Gonçalves Muandumba visitou o município, mas nada do que viu o surpreendeu, porque há muito que escutava relatos das dificuldades dos habitantes do Luacano.

Na reunião do Conselho da Auscultação Social (CAS) com a juventude, o governador tomou nota de todas as inquietações dos habitantes.

Umas das questões colocadas ao governador, e aquela que mais tem criado descontentamento aos cerca de 300 funcionários públicos e aos restantes moradores, é a falta de uma escola de formação de professores na província e a ausência de uma agência bancária.

Os funcionários públicos deste pequeno município gastam cerca de 10 por cento do seu ordenado em deslocações do Luacano ao Luau, numa viagem de ida e volta, que chega a custar a quantia de 6 mil Kwanzas, sem contar as despesas de hospedagem, para levantar o salário.

Se, por acaso, no município do Luau não houver dinheiro nas caixas electrónicas, ou por falta de sistema, eles são obrigados a deslocar-se até a Saurimo, na província da Lunda-Sul, e só o custo do táxi ronda os 9.500 Kwanzas.

Gonçalves Muandumba contou que vários cidadãos do Moxico que concorreram ao Concurso Público da Educação foram desqualificados por não terem feito o ensino médio numa escola de especialização de professores, e defendeu que tem de haver uma na província para que o panorama possa mudar.

O responsável destacou também a importância de rever a situação das estradas, das pontes e dos empregos para os jovens.

"Temos a questão da saúde que precisa de medicamentos, mais enfermeiros, mais médicos e mais centros de saúde, a educação que precisa de mais escolas, de mais e melhores professores, a agricultura precisa de apoios, de imputes, de sementes...e precisa de fazer circular o pouco que produz", admitiu.

O NJOnline observou também, no local, o abandono de três infraestruturas supostamente destinadas ao funcionamento da Televisão Pública de Angola (TPA), Rádio Nacional de Angola (RNA) e Agência de Notícias Angolana (ANGOP).

Todavia, o governante salientou que, a 60 quilómetros do município do Luacano, existe uma grande riqueza e fonte de desenvolvimento que pode ajudar a colmar os problemas do Luacano.

"É o famoso Lago Dilolo, o maior lago de Angola e o terceiro maior lago de África. Constitui uma atracção turística que aguarda pelos investimentos do Executivo e pelas iniciativas privadas para a sua valorização e exploração", afirmou, declarando que, há menos de um mês, o ministro da construção fez uma visita que começou no Luena e terminou no Luacano.

"O ministro (Manuel Tavares de Almeida) notou que a estrada que liga estes municípios está inutilizada devido ao estado avançado de degradação, esta via vai ser reparada, mas vai levar tempo", informou.

Viagem profunda a uma realidade obscura

A realidade do povo é "bastante profunda e obscura", segundo o médico calejado que desde 1978 trabalha no Hospital Municipal do Luacano, João Belo Gika. A falta de água potável é a causa de grande parte das doenças que assolam a população.

"A água só existe nos poços e nos rios, o que tem perigado a saúde pública dos habitantes", diz.

"A maioria dos munícipes está constantemente no Hospital Municipal e no Centro Materno Infantil com problemas de doenças diarreicas e vómitos", esclareceu, acrescentando que devido à carência de medicamentos, existem pessoas que têm optado pelo tratamento caseiro, ou seja, tratamento tradicional.

O médico revelou também que o município do Luacano carece de uma casa mortuária.

"No hospital Municipal e no Centro Materno Infantil nunca existiu morgue, quando morre alguém no município, no dia seguinte o funeral é logo realizado de imediato para o corpo não entrar em fase de decomposição em casa ou no hospital", afirmou.

Já o director municipal de Educação do Luacano, Domingos Lucunga Catepa, em declarações ao NJOnline, disse que tinha 200 professores no município, e que, por causa da extrema pobreza que existe nesta localidade, a maioria dos professores acabaram por abandonar a instituição.

"Aqui temos problemas de tudo, pedimos a este governador para aplicar a sua experiência de trabalho aqui para que tenhamos uma vida melhor no Luacano", apelou, acusando o antigo governador do Moxico, João Ernesto Liberdade dos Santos, de ser o causador do sofrimento da população.

"O senhor Liberdade é o culpado do nosso atraso de vida, ele andou uma vida no poder, e a comer nosso dinheiro", declarou.