Numa carta enviada à Procuradoria-Geral da República (PGR), datada da passada terça-feira, 15, e apresentada esta quinta-feira no Tribunal Supremo, em sessão de julgamento, o Banco de Negócios Internacional atesta que certificou junto do Banco Central das Filipinas que o cheque de 50 mil milhões de dólares que está no centro da investigação "megaburla tailandesa" não é verdadeiro.

Segundo o documento apresentado pelo Ministério Público, confrontado com a contestação do BNI, o Banco Central das Filipinas respondeu de forma expressa que não é prática do Banco emitir qualquer título de crédito em nome de pessoas singulares ou a favor de grupos empresariais, acrescentando que para além de não reconhecer a transacção, a empresa em questão não possui uma conta bancária em dólares.

"O BNI, perante tais factos e no cumprimento dos procedimentos e dos deveres plasmados na lei, encetou um conjunto de acções e diligências no sentido de apurar a legalidade da operação. Por existir infundadas dúvidas e suspeitas da operação, o BNI, no dia 3 de Dezembro de 2017, encerrou a conta bancária da entidade, tendo comunicado ao cliente", indica a missiva encaminhada à PGR.

A carta refere igualmente que o BNI formalizou a participação da operação à Unidade de Informação Financeira (UIF), para efeitosde investigação.

Em reacção, os advogados de defesa dos réus manifestaram-se contra a posição da PGR de apresentar essa carta na sessão do julgamento, uma vez que o presidente do Conselho de Administração da instituição, Mário Palhares, prestará depoimento na qualidade de declarante.

Em julgamento estão dez réus de quatro nacionalidades, sendo quatro angolanos, quatro tailandeses, um eritreu e um canadiano.

A dois outros arguidos foi aplicada a medida de coacção de prisão domiciliária, tendo um despacho de pronúncia ilibado o antigo Chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas Angolanas, Geraldo Sachipengo Nunda, arquivando o processo.

Dos oito arguidos que se encontram em prisão preventiva quatro são tailandeses, Raveeroj Ritchchoteanan, 50 anos, e considerado o mentor da tentativa de burla, Monthita Pribwai, 28 anos, Manin Wantchanon, 25 anos, e Theera Buanpeng, 29 anos, bem como André Louis Roy, canadiano de 65 anos, e Million Isaac Haile, eritreu de 29 anos.

Com a mesma medida de coacção encontram-se os arguidos Celeste de Brito António e Christian Albano de Lemos, ambos angolanos.

Em prisão domiciliária estão Ernesto Manuel Norberto Garcia, 51 anos, ex-director da Unidade Técnica para o Investimento Privado (UTIP) e antigo secretário para a Informação do MPLA e José Arsénio Manuel, general das FAA, de 62 anos.

Acusação coloca arguida angolana no centro da trama

Os arguidos foram pronunciados pela prática dos crimes de associação criminosa, fabrico e falsificação de títulos de crédito, falsificação de documentos e uso de documentos falsos, burla por defraudação na forma frustrada, promoção e auxílio à imigração ilegal e tráfico de influência.

Segundo a acusação, lida pelo representante do Ministério Público na sessão desta quinta-feira, 17, foi a 27 de Novembro de 2017, que chegou a Angola um grupo de dez pessoas com visto de fronteira, do qual faziam parte os quatro arguidos tailandeses, bem como Pracha Kanyaprasit, Kanphitchaya Kanyaprasit, Watcharinya Techapingwaranukul, igualmente oriundos da Tailândia e procurados pela Polícia.

A delegação era ainda composta pelo arguido canadiano e pelo seu conterrâneo, Pierre Rene Tchio Noukekkan (prófugo), e Miyazaki Yasuo, de nacionalidade japonesa, ambos também procurados pela Polícia.

O grupo chefiado por Raveeroj Ritchchoteanan, criador e presidente da fundação com o seu nome, criada alegadamente com o objectivo de erradicar a pobreza e promover educação e saúde de qualidade na Ásia e em África, chegou a Angola por intermédio da arguida Celeste de Brito, que foi estudante na Tailândia, onde conheceu Pierre Rene Tchio Noukekan e com o qual "manteve sempre contacto desde aquele período até à data da sua chegada a Angola".

O Ministério Público refere na acusação que foi Celeste de Brito quem solicitou cartas às instituições do Estado angolano a convidar a fundação a realizar financiamentos em Angola, tendo antecipadamente sido enviada uma cópia do cheque no valor de 5,2 mil milhões de dólares "para fazer prova da capacidade financeira da empresa", bem como de vários documentos da empresa Cetennial, sociedade em que é presidente Raveeroj Ritchchoteanan.

O visto de entrada dos cidadãos tailandeses, segundo a acusação, foi solicitado a 07 de Novembro de 2017 pelo ex-director da UTIP ao Serviço de Migração e Estrangeiros, em nome da empresa de Celeste de Brito.

De acordo com a acusação, no mesmo dia em que os arguidos chegaram a Angola foi realizado um encontro na sede da UTIP com representantes de bancos comerciais, ocasião em que Raveeroj Ritchchoteanan exibiu o cheque de 50 mil milhões de dólares.

A primeira sessão do julgamento, que durou seis horas e decorreu no Tribunal Supremo, conta com 38 declarantes, entre eles altas figuras da sociedade angolana, com destaque para o antigo Chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas Angolanas, Geraldo Sachipengo Nunda, o ex-Comandante-Geral da Polícia Nacional de Angola, Alfredo Mingas "Panda", Belarmino Van-Dúnem, ex- PCA do Conselho de Administração da Agência para a Promoção do Investimento e Exportação de Angola (APIEX) e Mário Palhares, PCA do BNI.