Segundo uma nota de imprensa do ministério a que o Novo Jornal Online teve acesso, em causa estão os relatos divulgados desde o dia 10 de Dezembro, nomeadamente nas redes sociais e em alguma imprensa nacional sobre a utilização de dejectos humanos na produção de hortícolas por uma empresa chinesa, no bairro Benfica, município de Belas, Luanda.

O ministério esclarece que, para "garantir a segurança alimentar dos cidadãos, tanto a nível da disponibilidade como da qualidade dos alimentos", foi já accionada uma equipa, formada por técnicos da tutela da Agricultura, da repartição municipal de Saúde Publica de Belas e da área de fiscalização, "que se deslocou ao local com o objectivo de apurar a veracidade da utilização de fezes na produção de hortícolas e as respectivas consequências para a saúde humana.

A nota acrescenta que "foram recolhidas no local amostras dos resíduos, dejectos e solos, para além das amostras das culturas de tomate, alface, repolho, cebola e pepino, para serem analisadas em laboratório, antes de comunicada qualquer decisão por parte do Ministério da Agricultura e Florestas".

O Novo Jornal Online foi ao local, ontem, quinta-feira, para ouvir os trabalhadores, que admitiram à equipa de reportagem que trabalham há mais de um ano com fezes humanas como fertilizante.

"Nos primeiros dias foi muito desagradável, por causa do cheiro e das moscas. Estamos há mais de um ano a trabalhar com fezes humanas. Um dos nossos superiores disse para não comentarmos na rua que estamos a trabalhar com fezes, e avisou que quem falar ou reclamar será expulso da quinta", disse Manuel Ginga.

Eduardo Paulo, também trabalhador agrícola, explicou que a maioria das vendedoras ambulantes da zona do Benfica compra diariamente produtos na quinta para serem comercializados nas ruas.

"Todos os dias recebemos mais de dez zungueiras que procuram os nossos produtos. Elas vêm comprar repolho, couve, alface, salsa, feijão, milho, cebola e tomate", disse.

Centro de Venda da Centralidade do Kilamba indicado como ponto de escoamento da produção

Paulo declarou ainda que todos os finais de mês os chineses saem da quinta com duas carrinhas cheias de alimentos hortícolas para o Centro de Venda da Centralidade do Kilamba.

"Normalmente vendemos os nossos produtos no Centro de Venda na Centralidade do Kilamba. Nunca recebemos nenhuma reclamação por parte dos clientes, os nossos produtos são de boa qualidade", assegurou.

Os moradores ouvidos pelo Novo Jornal Online contaram que sofrem com este problema há mais de um ano e já procuraram diversas vezes Administração Municipal de Belas, mas até agora nada foi feito.

"Não consigo ficar à vontade na minha casa, parece que tem uma fossa dentro de casa. Já tentámos varias vezes contactar o responsável pela Administração Municipal de Belas, mas infelizmente os nossos esforços nunca surtiram efeito", diz Chingamba Francisco, morador do Benfica há mais de quatro anos.

Outro morador é Bilenga Cardoso, que disse que teve de mandar os filhos morar com a sogra devido ao forte cheiro a fezes.

"Quem vem à minha casa não aguenta ficar no quintal nem dentro da habitação. Fiquei com medo de ver os meus filhos adoecer e optei por mandá-los para casa da minha sogra para não acontecer o pior", expôs.

Durante a nossa visita à fazenda, encontrámos cinco jovens adolescentes, todos a trabalharem sem botas, máscaras ou luvas de protecção.

Ouvidos pela equipa de reportagem do Novo Jornal Online, garantiram que foram orientados pelos cidadão chineses a trabalhar com fezes humanas como fertilizante, há mais de um ano, para aumentar o desenvolvimento dos produtos hortícolas.

Especialista alerta para risco de febre tifóide e cólera

Perante este cenário, o Novo Jornal Online, contactou a directora-geral do Laboratório Central Agro-alimentar de Luanda, Cleonice da Costa, que disse que o consumo dos produtos produzidos na quinta do Benfica pode provocar doenças como febre tifoide e cólera devido ao às fezes humanas nos produtos hortícolas.

"Não foi necessário fazer teste laboratorial, até porque não é da nossa competência fazê-lo. Mas, a olho nu, notámos que se tratava de fezes humanas", disse, salientando que em Angola existem muitas doenças gástricas devido à ingestão de alimentos desta natureza.

"Temos um elevado índice de febre tifóide em Angola, e as hortícolas são umas das principais fontes. Nos laboratórios, um dos parâmetros para analisar o alimento é verificar a presença de "coliformes fecais", ou seja, ver se o alimento foi ou não contaminado com fezes. Esse será o único teste que será realizado no nosso laboratório", esclareceu.

A responsável fez saber ainda que é responsabilidade da Direcção Nacional de Saúde Pública responder sobre análises de amostras de fezes humanas.

A directora do Gabinete da Saúde de Luanda, Rosa Bessa, contactada pelo Novo Jornal Online, afirmou que as pessoas estão a fazer maus juízos dos cidadãos chineses sem estarem por dentro do assunto.

"Não sou a pessoa indicada a falar sobre esta matéria, mas vou adiantar-vos que existem fertilizantes de diversas naturezas. Não podemos crucificar alguém sem saber da realidade das coisas", aponta, acrescentando que em breve o ministro da Agricultura e Florestas, Marcos Nhunga e a Direcção Nacional de Saúde Pública, vão esclarecer devidamente este assunto junto da sociedade.