Com este preço, a matéria-prima passa uma das barreiras simbólicos nesta ascensão que já vem do início deste ano, mas que ganhou densidade com o triunfo da vacinação massiva das populações do Hemisfério Norte contra o Sars CoV-2, a caminho dos 90 USD por barril, como, alias, está previsto pela generalidade dos analistas.

Isto, pelo menos até que passe o Inverno nas grandes economias, dos EUA à Europa, passando pela China, Índia ou Japão..., tanto no que diz respeito às baixas temperaturas como no que toca ao "inverno" gerado pela crise pandémica que desde o início de 2020 levou o mundo a mergulhar no marasmo económico como não se via há muitas décadas.

Com este cenário em pano de fundo, o barril de Brent começou o dia de hoje, segunda-feira, 18, a subir, não só no Brent, como também no WTI, em Nova Iorque, onde chegou aos 83,39, cerca das 10:00, hora de Luanda.

Estas marcas são a cada vez mais evidente consolidação da ideia de que a economia global está na sua fase final de recuperação da crise pandémica e que os valores registados reflectem não só esse dado como também os efeitos provocados por esse período negro da história económica mundial sobre todo o negócio da energia, como é o caso, por exemplo, da deterioração da infra-estrutura produtiva na generalidade dos países exportadores, com Angola a emergir como bom exemplo disso com a sua produção em continuado declínio devido à falta de investimento na área da pesquisa e da manutenção.

E esta recuperação da economia global só não está a ter maior impacto na valorização do petróleo porque a China, que é o maior importador mundial, mesmo tendo sido o primeiro gigante económico a libertar-se das garras da crise covidiana, tem registado um menor crescimento, que resulta em grande medida, como têm apontado os media especializados, da recorrente falha no abastecimento energético, défice na cadeia de fornecimento das diversas matérias-primas e ainda de esporádicos surtos de Covid-19, sem esquecer que o gigante asiático está, efectivamente, a fazer a sua parte no processo global de transição energética devido à "guerra" que o mundo terá de travar quanto antes contra o aquecimento global.

Mas não é possível olhar para o contexto global que faz mexer os gráficos dos mercados internacionais sem considerar a política em curso pela OPEP+, organização que junta a OPEP e 10 não-alinhados liderados pela Rússia, que desde 2017, alimentam uma aliança estratégica que visa o equilíbrio dos mercados a favor do "cartel".

Isto, depois deste grupo ter decidido, apesar da pressão das grandes economias para aumentos mais expressivos, com os EUA à cabeça, no início do mês, manter o plano de retoma da produção nos 400 mil barris por dia/mês até final de 2021, o que representa, tendo em conta a saída da crise e o aumento do consumo mundial de energia, um entrave e uma forma de controlar os preços em alta à medida que a procura cresce.

Com a" rolha" na produção da OPEP+ e as perspectivas optimistas (na visão dos exportadores), da Agência Internacional de Energia (AIE), da OPEP ou do Instituto Americano dos Petróleos, que apontam para que em 2022 os valores de consumo pré-pandémicos, na casa dos 100 milhões de barris por dia (mbpd), sejam retomados e mesmo ultrapassados, tudo se congrega para a manutenção dos preços em crescendo, com «, por exemplo, a Goldman Sachs a admitir os 90 USD por barril nos próximos meses, ou o Presidente russo, Vladimir Putin, a ver já a nota de 100 USD colada no exterior dos barris comercializados.

No entanto, independentemente das previsões mais ou menos optimistas, há dois factores determinantes para admitir que o barril, pelo menos no imediato, vai manter a valorização.

Um deles é a deterioração da infra-estrutura produtiva na maior parte dos países produtores, como é disso exemplo Angola, cuja produção está em declínio desde 2014 devido ao desinvestimento, e que piorou com a Covid-19.

O outro é a pressão global para retrair a produção de energias fósseis devido ao seu contributo para a produção de gases com efeito de estufa e consequente aquecimento global, privilegiando as energias menos agressivas para o ambiente, o que se maximiza se os preços do crude e do gás natural se mantiverem altos.

Angola é um bom exemplo para se perceber o que se passa. Mesmo perante a alta evidente do valor da matéria-prima, tarda a verificar-se o interesse das grandes multinacionais do sector em investir, salvo raros exemplo, no offshore nacional, o que tem levado ao prolongado declínio da produção que já está abaixo dos 1,2 mbpd, quando ainda há cerca de uma década, estava acima dos 1,7 mbpd.

Esse desinvestimento tem levado a perspectivas pouco ou nada optimistas para a economia angolana, havendo mesmo quem antecipe uma queda ainda mais acentuada, como é o caso da consultora Fitch Solutions, que reviu em baixa a previsão para produção de petróleo em Angola para um milhão de barris por dia no final da década devido à falta de investimento e exploração

Outro aspecto que está a limitar o potencial deste sector no País é a pressão global em defesa do ambiente, especialmente num momento em que os sinais de alerta são cada vez mais evidentes, como o Secretário-Geral da ONU, António Guterres, tem repetido à exaustão, o que, não sendo o único factor, é um dos que está a reduzir o apetite das "majors" pelo potencial petrolífero angolano.

E o que se passar no próximo mês, em Glasgow, na Escócia, na COP26, uma das mais aguardadas cimeiras mundiais do clima, poderá ser fundamental para antever o futuro neste sector que, como se sabe, ainda é fundamental para a economia angolana.

E, apesar de tudo, como pode Angola aproveitar este momento?

Para países como Angola, cujas economias são extremamente dependentes das exportações de crude, este momento é, seguramente, gerador de derradeiras oportunidades para investir na diversificação das suas economias com os excedentes gerados pelos elevados preços da matéria-prima, escolhendo bem onde apostar.

Com o barril nos 85 USD, o Executivo angolano, que elaborou o OGE 2021 com 39 USD como valor de referência para o barril, conta com um bónus de 46 dólares, o que permite, mesmo que sejam gigantescos os compromissos com a dívida externa, colocar uma boa parte deste superavit na diversificação da sua asfixiada economia.

No entanto, para já, de forma a corresponder a urgências imediatas, como é o caso da redução dos gastos com a subsidiação dos combustíveis, gasolina e gasóleo, que leva dos cofres públicos quase 2 mil milhões USD/ano, o Governo tem colocado uma boa parte das fichas na aposta da construção de refinarias, contando com o abastecimento local e com a exportação de refinados para outros países do continente onde a transição energética, espera-se, venha a demorar mais a chegar.

Porém, como alguns especialistas têm vindo a chamar à atenção para isso, o calendário destes processos não obedece às leis a que estávamos habituados no passado e podem, de um momento para o outro - a COP26, em Glasgow, no próximo mês é um bom exemplo e uma possibilidade de algo inesperado suceder - conduzir a mudanças radicais de paradigma que deitem por terra tudo isso, face à já hoje evidente urgência de mudança, como lembrou na última Assembleia-Geral da ONU, o seu Secretário Geral, António Guterres, afirmando que o mundo vive o seu último curto intervalo temporal para levar a sério o "alerta vermelho" climático.

Ou seja, se não for nos próximos 2 a 3 anos, Angola terá, exponencialmente, mais e mais dificuldades em ter como investir na modernização da sua agricultura, na diversificação das fontes de rendimento, no aproveitamento do seu potencial mineiro...

Cenário de fundo

No entanto, este é o momento para aproveitar o que houver para aproveitar. Mas mesmo isso não está a ser fácil.

Se Angola, Nigéria, Líbia ou Argélia, os grandes produtores africanos, sofreram com a baixa do consumo, a recuperação não está a ser igualmente rápida, muito devido à fraca capacidade de resposta, de forma mais acentuada em Angola e na Nigéria, por causa da deterioração da sua infra-estrutura, do desinvestimento em pesquisa, em manutenção e já, também, resultado de uma desistência global do petróleo devido à poluição e o esforço mundial para uma transição energética que afaste a ameaça das alterações climáticas sobre a humanidade.

Mas o mesmo não se pode dizer dos países do Golfo, que tiveram melhor visão estratégica ao longo dos anos, investindo mais na diversificação e na manutenção dos seus campos, que, agora, estão a dar uma resposta adequada ao aumento da procura e a gerar optimismo entre os diversos sectores económicos, como é o caso da Arábia Saudita, cujo mercado bolsista cresceu mais de 42 por cento nos últimos 12 meses.

Este exemplo é ainda mais interessante porque o crescimento mais volumoso reflecte-se, segundo os media internacionais especializados, no sector não petrolífero, como as telecomunicações, o turismo, o comércio e a indústria química..., sendo que a petrolífera nacional, a ARAMCO, no mesmo período, ganhou uns meros 3,3%.

A ficar para trás

Entre os restantes exportadores de crude, a recuperação está a ser substancialmente mais lenta, como é o caso de Angola, onde a economia se debate com a pressão da inflação, que pode chegar, segundo o INE e o BNA, aos 27% nos próximos meses, uma crise social sem precedentes desde o fim da guerra, em 2002, e uma assinalável incapacidade para que os esforços da diversificação económica mostrem sinais de estar a produzir efeito.

Como pano de fundo para este cenário difícil, o País tem o acentuado declínio da sua produção de petróleo, que está actualmente abaixo dos 1,1 milhões de barris por dia e com tendência para diminuir ainda mais.

Tudo devido aos sobejamente conhecidos problemas do abandono de algumas das majors com investimentos no off shore nacional, face a uma "infecciosa" dependência do petróleo que, ao longo dos anos, criou uma inércia geral face à urgência de diversificar a economia apesar de ser bem conhecida essa urgência.

E o resultado é o que se sabia estar ao virar da esquina perante uma realidade em que o petróleo ainda é rei e senhor na economia nacional.

Sendo Angola um dos países na linha da frente das repercussões do sobe e desce dos mercados petrolíferos, devido à sua dependência das exportações de crude para o equilíbrio das suas contas - o petróleo ainda é responsável por mais de 94% das exportações e mais de 60 por cento dos gastos do Executivo e acima de 30% do PIB, este cenário de recuperação permite, ainda assim, algum optimismo nas contas nacionais mas ainda longe de um regresso ao patamar alcançado a partir de 2008, com o barril, como exemplo, a chegar aos 147 USD no Verão desse mesmo ano, permitindo um boom económico como nunca visto até ali.

A produção actual, em constante declínio, está abaixo dos 1,1 mbpd devido ao desinvestimento das "majors" a operar no offshore nacional, especialmente a partir de 2014, quando se verificou uma quebra abrupta do valor do barril, que passou de mais de 120 USD para menos de 30 dois anos depois, em 2016, bem como devido ao esgotamento/envelhecimento dos campos mais activos.

Apesar das mudanças substanciais na legislação referente ao sector e às alterações profundas nesta indústria decisiva para o País, a produção tem vindo a perder viço especialmente por causa da deterioração da infra-estrutura produtiva que desde 2014 viu os investimentos das "majors" descer, a fraca aposta na pesquisa por novas reservas e o envelhecimento de alguns dos mais importantes poços activos no offshore nacional.

E com a transição energética a impor cada vez mais a sua vontade, com o crude e os restantes hidrocarbonetos a ser olhado como uma infecção perigosa e contagiosa, o País tem agora de fazer o que não fez nos últimos 20 anos: diversificar a sua economia o mais rápido possível, porque o petróleo tem os dias contados. E são cada vez menos.