A exploração de petróleo e gás natural pode vir a ser uma realidade no Parque Transfronteiriço Okabango-Zambese nos próximos anos se a ReconAfrica, uma empresa petrolífera canadense de pequena dimensão, levar avante o seu projecto de produzir crude numa vasta área dentro desta geografia protegida onde os especialistas, como o Novo Jornal noticiou, apontam para a existência da maior reserva de petróleo de xisto, ou fracking, uma indústria peculiar que extrai petróleo e gás a partir da injecção de químicos e água a grande pressão no subsolo, considerado altamente poluente.

Segundo relatos dos media namibianos, as populações das zonas onde tiveram lugar as obrigatórias auscultações públicas ficaram indignadas com a forma como os responsáveis pela ReconAfrica reagiram aos receios manifestados pelas pessoas que habitam na área e pelas organizações ambientalistas

A empresa ReconAfrica (Reconnaissance Africa) adquiriu os direitos para a exploração aos Governos da Namíbia e do Botsuana numa área de mais de 35 mil kms quadrados no interior da Bacia do Okavango, que é um delta natural único no mundo que abrange Angola, Botsuana, Namíbia, Zimbabué e a Zâmbia, alimentado essencialmente por cursos de água formados a norte, no Planalto angolano, senso considerada altamente sensível pelas organizações internacionais de defesa da natureza, sendo ainda a maior zona protegida transfronteiriça do mundo.

Citado pelo The Namibian, Max Muyemburuko, presidente de uma associação de conservação do Okavango Este e Okavango Oeste, explica que a indignação das populações parte das restrições impostas, por causa da Covid-19, durante os encontros de auscultação públicos, o que impossibilitou as comunidades de exprimirem de forma clara e abrangente os seus pontos de vista e as suas preocupações.

Uma das críticas mais veementes resultou da duração dos encontros, apenas duas horas, onde a empresa concessionada teve 1.45 oras enquanto as populações apenas 15 minutos, findos os quais, foram obrigadas a deixar a sala, fcando por responder muitas das questões, especialmente sobre os efeitos dos testes sísmicos e da solidez dos estudos de impacto ambiental exigidos por lei.

As questões colocadas posteriormente pelo líder associativo à ReconAfrica, ainda segundo o The Namibian, na resposta, o seu porta-voz mostrou-se "chocado" porque esta associação ambiental entender que "as populações locais não sabem o que é melhor para as suas vidas" nem tão pouco saberem "que tipo de projectos de desenvolvimento querem nas suas terras".

Apesar das restrições impostas nas sessões de auscultação, e da sua escassa abrangência, a ReconAfrica entende, como o manifestou na resposta escrita ao líder associativo, que os encontros públicos deixaram claro que as populações, as autoridades tradicionais e os conselhos regionais "apoiam firmemente os desenvolvimentos propostos" e a sua aplicação vai prosseguir como planeado.

O avanço das máquinas em busca da maior reserva onshore do mundo

Para já, o que se sabe é que a ReconAfrica, uma empresa de média dimensão, conseguiu iniciar a pesquisa numa área de 35 mil quilómetros quadrados no coração do Okavango onde estima, de acordo com dados divulgados na sua página oficial, estarem depositados milhões de barris de petróleo de grande qualidade e tem planeado o início das perfurações para Dezembro deste ano.

As perfurações estão planeadas para uma área considerada de enorme sensibilidade ambiental, localizada na área de influência e protegida por ser essencial para a escorrência das águas oriundas do norte, Angola, para o Delta do Okavango, já dentro da área de conservação transfronteiriça Okavango-Zambeze de que Angola faz parte, ocupando cerca de 35 mil km"s 2 entre a Namíbia e o Botsuana.

Tanto os governos de Windhoek como de Gaborone deram já oficialmente autorização para a pesquisa a esta empresa com inscrição em bolsa no Canadá, tendo a ReconAfrica admiido já que se trata de uma das maiores reservas onshore - em terra - de todo o mundo, ultrapassando mesmo uma das que é das mais conhecidas pelas suas imensas reservas, a de Eagle Ford, no Texas, EUA, que as autoridades norte-americanas consideram ser a maior em todo o mundo, incluindo petróleo e gás.

Porém, os riscos ambientais são de igual tamanho, sendo que o impacto que a exploração de hidrocarbonetos onshore na Bacia do Okavango-Zambeze não tem paralelo com a exploração no sul dos EUA, porque em causa está uma das mais importantes áreas naturais protegidas de todo o mundo.

Uma organização internacional de cientistas, denominada União dos Cientistas Preocupados, emitiu um sério aviso para os riscos considerando que são "massivos" e que podem colocar mesmo em dissolução a prazo de todo o complexo natural do Okavango-Zambeze.

Em causa está a tecnologia normalmente usada na extracção de crude e gás em terra, conhecida por fracking, que consiste, em síntese, na injecção de água e químicos altamente corrosivos no subsolo, implodindo a rocha para dela sugar hidrocarbonetos, como sucede em grande dimensão nos Estados Unidos gerando sérios problemas no ar respirável, na água dos lençóis freáticos e na vida e flora selvagens, havendo registos confirmados de um grande aumento de doenças cancerígenas entre as populações humanas.

Para além das áreas naturais, parques naturais, pelo menos uma considerada como património da humanidade, denominada Tsodilo Hills, no Botsuana, está ameaçada por estes planos para extracção de crude e gás, estando ainda em causa a comunidade San, a mais antiga comunidade humana na África Austral, a única que não tem origem Bantu, que já se encontra fortemente ameaçada devido ao "progresso".

Nada parece poder travar os buldozers

Num artigo publicado no site OIlPrice, Sarah Jennings sublinha que três dos mais proeminentes geólogos, geoquímicos e perfuradores em todo o mundo admitem e concordam é que o projecto existente para a Bacia do Okavango pode muito bem ser a última grande descoberta de hidrocarbonetos onshore.

Isto, porque, para além da revolução verde em curso em todo o mundo, que tende a substituir a energia fóssil por energia verde, seja a eólica, a hídrica ou solar, não são conhecidos quaisquer registos no planeta da existência de reservas importantes onshore, incluindo a Nigéria e Angola, o 1º e o 2º maiores produtores africanos, considerando a autora estes dois países como estando mergulhados num composto tóxico de desastres ambientais, corrupção e excesso de taxas, enquanto a Namíbia nunca produziu um único barril de crude.

E o problema é que as estimativas existentes apontam para a possibilidade de o Okavango ser reservatório natural de mais de 120 mil milhões de barris de petróleo, um número de tal modo gigante que só um esforço global de associações defensoras do ambiente e a ONU poderá evitar este desastre ambiental em curso.

Como comparação, para mensurar a importância destas alegadas reservas, Angola tem comprovadas menos de 8 mil milhões de barris, a Nigéria cerca de 36 milhões e os EUA não chegam sequer aos 38 mil milhões de barris, sendo que o país com mais reservas provadas é a Venezuela, como cerca de 300 mil milhões enquanto a Arábia Saudita tem pouco mais de 260 mil milhões de barris em reservas testadas.

Bill Cathey, geólogo conhecido mundialmente e presidente do Earthfield Technologies, em Houston, Texas, disse, citado pelo OilPrice, que não existe em lado nenhum do mundo uma bacia sedimentar com esta dimensão sem estar a produzir um único barril de crude.