Ghandi dizia que "a pobreza é pior forma de violência" que uma pessoa pode experimentar. Infelizmente, não só não conseguimos combater a pobreza como fomos capazes de a multiplicar depois da Independência, com requintes de malvadez e uma Mão de Midas ao contrário que conseguiu transformar ouro em fezes. Somos épicos na indiferença, na surdez dos choros das mães que perdem os filhos todos os dias e na robustez da banga governativa.

Um país com uma população maioritariamente pobre jamais será um país rico por mais recursos que tenha, porque precisará sempre de importar um consultor estrangeiro, pago em divisas, para acender o interruptor. E foi neste desvario que fomos derrotados. A pobreza cresceu tanto que ganhou estatuto, e os pobres criaram um novo país. Criaram um sistema de justiça "olho por olho", porque foram abandonados e não podiam pagar advogados. Um sistema de educação que o Governo teve que incorporar dando um nome bonito para dignificar os quintais onde, apesar da deformação das crianças, um direito foi conquistado com as "escolas comparticipadas". Um sistema de saúde onde o aprendiz virou enfermeiro e em dias de inspiração até faz cirurgias. Mas, muitas vezes, o enfermeiro de facto, naquela "clínica" sem nada que garanta sucesso, consegue reconhecer o perigo e também salva pessoas ficando mais barato que o hospital público, que é gratuito, mas paga-se sempre a alguém. Criou um sistema de crédito popular que não tem "malparados", a "Kixikila", (muito mais eficaz que o Programa Bué) e ajuda milhares de pessoas, sem juros, que de outra forma não conseguiriam viver pela insignificância do salário que perde todos os dias valor na luta desigual contra a inflação. Criou uma economia paralela, com um gigantesco mercado que gera milhões, mas, tal como uma mangueira esburacada, não tem eficácia para criar riqueza, porque nunca houve inteligência institucional para o dignificar.

O povo esforçou-se. Não ficou parado à espera. Arregaçou as mangas e construiu um milhão de casas de chapa que lhe tinham prometido na campanha eleitoral. Criou milhões de "empregos" com arte e engenho, contribuindo para um novo dicionário das profissões, roboteiro, chamateiro, bagageiro, micheiro, mosaiqueiro, instalador de "gatos" eléctricos, lotador, kinguila/o, pedicuro, atravessador de lagoa, entre outros, "diminuindo", assim, o impacto negativo da radiografia do desemprego angolano. O povo é heróico e continua a ser generoso. Mas tem sido reiteradamente abandonado e continua na periferia do Desenvolvimento Humano.

Somos um povo bom, crente, devoto e, por isso, para a maioria, a oração continua a ser a única fórmula para manter a sanidade mental e a força para nos levantarmos todos os dias para a luta pelos mínimos olímpicos da sobrevivência e para conseguirmos continuar a sorrir. E é com base nesta relação persistente que mantemos com Deus que me pergunto quando acontecerá o Milagre da Materialização com sucesso dos programas que nos vão tirar da pobreza. Oramos e pedimos a Deus, que tudo pode, que salve o país, fortaleça a nossa fé e construa a inspiração necessária aos nossos governantes para serem capazes de construir um novo país sem distorções.

Estamos a viver um tempo de confronto com as coisas que andámos a adiar e hoje se entornam em cima de nós como se fossem um aguaceiro. O país tem fome de grandeza. Não falo de arranha-céus, nem de metros de superfície. Falo de grandeza na Liderança, no Ensino e na Postura. Falo dos 11 milhões de angolanos que não têm um nome e uma nacionalidade conferidos pelo Registo Civil e que, por isso, não existem, não obstante termos gasto quase três mil milhões de dólares para resolver o problema, "desconseguindo" de forma vergonhosa. Falo do sentimento de pertença e patriotismo que quem tem o poder deveria ostentar até à exaustão, mas não o faz. Falo da convicção profunda que só faz sentido governar quando percebemos que, em todas as acções, o bem, o belo e o outro são o nosso único objectivo.

Temos de conseguir sair do "lugar da negligência" no conforto da governação, da mesmice dos procedimentos, da miopia dos conselhos e da promiscuidade dirigente que insiste em fazer negócios com o Estado. Temos de ser capazes de construir soluções locais sem ter de copiar, pagando com o dinheiro do povo, leis e programas dos outros, cujo resultado é sempre uma calça que fica menor ou maior do que a nossa perna. Estes cientistas do "copy past" têm que ser retirados da governação, pela vergonha de serem estéreis em soluções que cumpram os nossos interesses e que resolvam, definitivamente, os problemas que temos há 45 anos. Oramos para não continuar a ser uma Nação insegura e órfã de inclusão nacional. Sem justiça social, a Pátria não se constrói. É o POVO e apenas o POVO que tem que ser a prioridade. O resto não faz sequer sentido.