Enquanto em Portugal a tónica das intervenções dos apresentadores da obra, nomeadamente Francisca Van-Dúnem, angolana de Luanda, ex-ministra portuguesa da Justiça, e Manuel Dias dos Santos, de Benguela, sociólogo e historiador, era centrada na urgência de o País ouvir todas as vozes, em Luanda o ataque à mãe de todas as liberdades assumia contornos graves e perigosos.

Na Casa da Imprensa, na capital portuguesa, mais de uma centena de individualidades juntaram-se num acto político-cultural para ouvir dizer não à silenciocracia, num momento em que o medo volta a ser a principal arma utilizada para silenciar jornalistas e críticos que pugnam por uma Angola diferente.

As notícias sobre o assalto sem arrombamento de portas ou janelas da sede do SJA, com os ladrões da Liberdade a levarem apenas o CPU (Unidade Central de Processamento do computador que concentra todas as principais operações do aparelho), são de gravidade extrema, sobretudo quando o silêncio tumular e, consequentemente, cúmplice é a resposta vinda de quem jurou cumprir e fazer cumprir a Constituição, ou seja, fazer de Angola um País livre e democrático.

Quando se atacam jornalistas e as suas organizações, como acontece em sociedades totalitárias, com o objectivo de intimidar, condicionar a sua missão, ataca-se a Liberdade de Imprensa e de Expressão, bem como a Liberdade em sentido lacto.

Neste ataque com contornos de espionagem terrorista, os ladrões da Liberdade deixaram "o monitor, o teclado, assim como os cabos e tudo o resto", segundo Teixeira Cândido, secretário-geral do SJA.
Três dias depois, mostrando a sua impunidade, sem que alguém tivesse visto, os assaltantes "devolveram" a CPU, deixando-a à porta do Sindicato, como fazem os gangsters criados para travar o curso da História, da luta de oprimidos que se querem libertar.

Em Lisboa, angolanos da Diáspora ou de passagem, com alemães, brasileiros, cabo-verdianos, bissau e equato guineenses, italianos, marroquinos, moçambicanos, portugueses, santomenses, timorenses e outros, aplaudiram com muito entusiasmo a defesa da Liberdade feita por Francisca Van-Dúnem e Manuel Dias dos Santos.

A plateia, constituída por políticos, diplomatas, líderes religiosos, activistas, jornalistas, intelectuais, académicos, artistas, estudantes e outros, aplaudiu também o elogio à pluralidade nas vozes de Armindo Laureano, director deste Jornal, e de João Ricardo, da Perfil Criativo, editor do livro que reúne 38 crónicas publicadas maioritariamente nesta coluna quinzenal.

Já em Angola, as ameaças sobre quem tem coragem e ousadia de pensar diferente e de denunciar as mazelas do Poder atingem níveis altos com a colaboração de jornabófias, uma espécie perigosa que cresce como cogumelos e ajuda a transformar Angola num País de terror.

Por isso, entre os jovens angolanos que diariamente fogem do País, sobretudo para Portugal, por razões económicas e sociais, encontram-se também jornalistas que, por situações políticas, busca de liberdade e segurança, fogem das pressões e aliciamentos, para que se convertam em jornabófias.

No lançamento do livro, os apresentadores ressaltaram a minha coragem em pôr o dedo na ferida podre e mal cheirosa do País, elogio que merecidamente endosso ao resistente Teixeira Cândido, a quem os ladrões da Liberdade e da Dignidade, depois de "devolverem" a CPU, enviaram uma mensagem ameaçadora dizendo: "Boa tarde, viste o aviso que te deixámos".

Dias antes, Ludmila Pinto, mulher de Cláudio Emmanuel Pinto, activista e jornalista da Rádio Despertar, afecta à UNITA, sofrera o terceiro ataque em dois meses, perante a inacção das autoridades.

Ataques efectuados por homens armados e mascarados, que invadem a residência do casal, geralmente na ausência do jornalista, torturam, agridem e cortam os braços e pernas da vítima, para além de ameaçar matar o seu filho de 15 meses de idade.

Desta onda de terror dos últimos dias, em Angola, regista-se ainda a agressão policial ao jornalista José Honório, por tentar defender zungueiras da perseguição de agentes da Polícia que, cumprindo ordens, combatem por todos os meios aquelas mulheres que encontram na zunga a única forma de sobrevivência.

Os ataques causaram graves ferimentos ao jornalista, resultantes de pontapés e cabeçadas, como se vê em imagens e vídeos que circulam nas redes sociais, atestando a brutalidade da polícia no cumprimento de "ordens superiores".

Este cercear das liberdades mostra que nunca saímos do "tempo em que a única coisa impossível de acontecer em Angola era insultar publicamente o Comandante-em-Chefe e sobrar para contar a ousadia", como muito bem escreve o escritor e jornalista José Luís Mendonça no seu último livro "As Metamorfoses do Elefante, Fábula Angolense".

Os ladrões da Liberdade usam a violência, ameaça e assassinato de jornalistas, políticos, sindicalistas e activistas, para criar pânico e terror na sociedade e sedimentar a fobocracia, regime que usa o medo como elemento de controle dos cidadãos.

Em tempos de confinamentos causados por pandemias ou guerras, insistir em confinar o pensamento de uma parte dos cidadãos é mais do que um retrocesso civilizacional, é um acto de terror de consequências imprevisíveis, porque lutar pela Liberdade significa lutar pelo mais valioso dos poderes.

Em Portugal, os tentáculos da silenciocracia, que parece ter um raio de acção sem fronteiras, vão-se tornando cada vez mais visíveis, como aconteceu no lançamento do livro, onde a TPA se destacou pela ausência, contrastando com a presença de diferentes equipas da TV portuguesa.

A TPA, que insiste em confundir o P de pública com o de partidária, que em Portugal faz cobertura de inauguração de lojecas de grogue e de óleo de palma, não encontrou interesse editorial para incluir na sua agenda noticiosa o lançamento de um livro que reúne o pensamento de uma angolana, com prefácio de Jean-Michel Mabeko-Tali, historiador africano de referência.

Onde Mabeko-Tali, a partir de Washington, viu um livro que resulta "duma actividade jornalística longe de futilidades sensacionalistas", e textos que "são um valioso contributo ao debate sobre questões de actualidade, da vida de jovens estados-nações africanos, como também da Europa", a TPA, obedecendo à mão nada invisível que a capturou, disfarça mal a sua indiferença.

Enquanto a imprensa internacional, nomeadamente francesa, cabo-verdiana, portuguesa, entre outras, marcou presença no lançamento, mostrando interesse pelo livro e temas que aborda, os media de capitais públicos angolanos primaram pela ausência.

Todo esse comportamento interno e externo descredibiliza o Poder em Angola e suas instituições, ajuda a aumentar o descrédito nos políticos e suas políticas e, por arrasto, na comunicação social de capitais públicos, uma espécie de braço direito dos ladrões da Liberdade.

Com desenho de capa de Dilia Fraguito Samarth, talentosa artista angolana que do seu Kwanza-Norte leva ao Mundo uma arte com traços únicos, onde Angola e sua História estão sempre presentes, o livro resulta da minha permanente reflexão e inquietação perante a miséria humana em Angola, África, Portugal e Europa.

Contra os silenciamentos, a maior parte dos textos do livro agora lançado foi escrita como forma de atenuar a dor da discriminação, das desigualdades, da marginalização, da subjugação e de todas as formas de totalitarismos e colonialismos, mesmo que disfarçados de solidariedade.

Neste contexto, Anil e Dilia Samarth escrevem no posfácio: "Esta Filha de Angola não tem medo de falar a verdade em público, denunciando patologias que alastram a toda a velocidade no tecido social angolano, e em outras geografias da nossa Mãe-Terra".
E acrescentam: "As suas palavras são um apelo à meditação na beleza, na grandeza dos rebeldes e das zungueiras e nas virtudes da contemplação quando houver água e luz em todas as casas".

Por isso, como no poema de José Craveirinha, magistralmente lido no lançamento por Elsa de Noronha, poetisa moçambicana, de 88 anos, "Quero ser tambor" para continuar a expandir a voz dos que não têm voz.