Actualmente, muitos cidadãos têm tido dificuldades sérias em pagar as suas dívidas, por falta de liquidez ou por não conseguirem obter novos créditos para pagá-las. Nestas circunstâncias é frequente os credores - instituições de crédito ou fornecedores - intentarem acções para penhora de bens e com o produto da venda satisfazerem os seus créditos.

Para evitar que o resultado dessas acções prejudique outros credores e dificulte o pagamento de outras dívidas, a pessoa singular pode lançar mão do mecanismo da insolvência, introduzido no nosso ordenamento jurídico pela Lei n.º 13/21 de 10 de Maio. Sob o manto deste mecanismo, as acções de penhora contra a pessoa singular devedora serão suspensas, e o Tribunal convocará os demais credores para reclamarem o pagamento dos seus créditos, os quais estarão sujeitos à verificação e graduação e, mediante um plano de pagamentos, serão satisfeitos nos termos do compromisso assumido.

E se o plano de pagamentos não conseguir satisfazer os créditos? Bem, na hipótese de o plano revelar-se ineficaz, a pessoa singular devedora poderá socorrer-se do mecanismo da exoneração do passivo restante - oriundo do direito insolvencial norte-americano - que é uma das grandes novidades da nova lei. Através desse mecanismo, a pessoa singular devedora poderá obter o perdão das dívidas que não foram integralmente pagas no processo de insolvência ou depois de um certo período de tempo após o seu encerramento, conforme o art.º 266.º da Lei acima referida. Trata-se de um fresh start, isto é, uma forma de a pessoa singular devedora começar de novo a sua vida, apagando-se do seu passivo todas as dívidas que não conseguiu pagar, excepto as tributárias e da segurança social que são imperdoáveis.

Importa realçar que, para a pessoa singular devedora puder beneficiar desse privilégio, a lei exige - cumulativamente - a verificação de determinados pressupostos, por exemplo, (i) não ter beneficiado por duas vezes desse mecanismo ou (ii) não ter incumprido o dever de se apresentar à insolvência ou, caso este incumprimento se tenha verificado, não o tenha feito com culpa e não tenha causado prejuízo relevante aos credores (art.º 267.º da Lei n.º 13/21 de 10 de Maio).

Saliente-se de resto que, depois do processo de insolvência e durante o período fixado para o pagamento das dívidas, a pessoa singular devedora deverá agir de boa-fé. Ou seja, deverá adoptar os comportamentos previstos na lei, sob pena de, violando-os, perder o referido benefício e ser obrigada a pagar todas as dívidas sob gestão e controlo apertado de um fiduciário nomeado pelo Tribunal.

Portanto, caso se encontre numa situação de incapacidade financeira para cumprir as dívidas vencidas, e não disponha de liquidez nem de crédito para o efeito, pedir a insolvência pessoal e beneficiar-se das prerrogativas que ela oferece afigura-se a solução mais acertada em detrimento da negociação individual que no final poderá revelar-se caro e muito prejudicial.

*Licenciado em Direito pela Universidade Católica de Angola e Mestre em Direito e Gestão pela Universidade Católica de Portugal, Escola do Porto. É membro da AIDA - Associação Internacional de Direito dos Seguros.