A construção do mercado abastecedor de Luanda, projecto entregue à empresa espanhola Mercasa, por um valor estimado entre 300 e 533 milhões de euros, envolveu o pagamento de uma comissão de 2% - equivalente a um valor entre seis e 10 milhões de euros - à Fundação Eduardo dos Santos (FESA), indicam as autoridades espanholas.

Segundo os investigadores, que querem saber se esse contrato foi sobrefacturado e se implicou o pagamento de comissões ilegais, vários emails recolhidos durante a operação indicam que a FESA beneficiou com a empreitada, graças ao desvio de dinheiros públicos.

De acordo com o diário espanhol El Mundo "acredita-se que esses 2% canalizados para a Fundação do ex-Presidente da República provêm de pagamentos do Estado angolano ao consórcio público-privado que tinha criado com a Mercasa para a construção do mercado".

O esquema, acrescenta o jornal, terá como pivô o luso-angolano Guilherme Taveira Pinto, fugitivo da justiça espanhola noutra investigação por suspeitas de corrupção em Angola, no caso envolvendo um negócio de venda de armas à Polícia de Luanda pela firma Defex.

"Suspeita-se que o desvio de fundos se articulou através de Guilherme Taveira, que devolveu o dinheiro à Fundação de Dos Santos", lê-se no El Mundo.

Para além da análise de emails, os investigadores sustentam as suspeitas - de corrupção, branqueamento de capitais e organização criminosa - nas provas obtidas durante uma busca realizada em 2014 na casa que o luso-angolano possui em Portugal. Entre os documentos recolhidos estão, por exemplo, extractos bancários e anotações sobre pagamentos suspeitos.

Dinheiro, presentes e viagens a altos funcionários angolanos

Recorde-se que a justiça espanhola constituiu Guilherme Taveira Pinto como arguido e figura principal neste caso.

O juiz espanhol José de la Mata afirma que Taveira Pinto recebia as transferências feitas por empresas espanholas e distribuía-as pelos "seus verdadeiros beneficiários finais", segundo o documento a que a agência Lusa teve acesso em Abril deste ano.

A notificação faz um relato dos vários pagamentos feitos e os indícios colocam em evidência "a existência de uma estratégia concertada e executada entre Taveira e determinadas pessoas com vínculo ao consórcio para obter contratos com as autoridades angolanas através da entrega de dinheiro, presentes, viagens a altos funcionários responsáveis pela adjudicação e/ou execução dos mesmos. Estas dádivas eram sufragadas através da sobrefacturação dos orçamentos apresentados às autoridades angolanas".

O documento aponta ainda vários responsáveis técnicos angolanos e a "estreita relação" que Taveira Pinto tinha com um alto dirigente político angolano e um antigo embaixador de Angola em Espanha.