Agée Matembo, dos Negócios Estrangeiros, e Lambert Mende, porta-voz do Governo de Joseph Kabila, os dois governantes que já se pronunciaram sobre este assunto, estão a reagir a uma situação que está a gerar forte polémica na RDC, através das redes sociais e dos media tradicionais, que têm estado a fazer reportagens sobre a chegada dos mais de 180 mil congoleses que foram expulsos das áreas diamantíferas de Angola nas últimas duas semanas.

Apesar de as autoridades militares e policiais angolanas estarem a insistir de que não se trata de expulsões mas sim de saídas voluntárias de Angola de cidadãos congoleses-democráticos que estavam em situação migratória irregular no país, especialmente nas províncias das Lundas, Norte e Sul, Bié e Zaire, as autoridades congolesas não aceitam essa formulação e falam na expulsões e os media dão voz a dezenas de pessoas que relatam perseguições violentas, pilhagens e agressões por parte de militares e polícias angolanos.

A reacção de Kinshasa a esta crise tem como pano de fundo o complexo processo eleitoral que decorre no país vizinho, onde as circunstâncias políticas e de pré-campanha eleitoral exigem uma posição de força do Governo congolês, sob pena de ser acusado de fragilidade e incapacidade de garantir os direitos dos seus cidadãos alvo de injustiças.

Em 2017, o Kasai foi palco de uma das mais graves crises humanitárias na RDC devido à violência protagonizada pelas milícias Kamwina Nsapu que espalharam terror pela região e levaram mais de 40 mil pessoas a procurar refugio em Angola, na Lunda Norte, onde muitas se encontram até hoje.

No entanto, esta "Operação Transparência" visa, segundo explicou a Polícia Nacional, regular a imigração nas áreas diamantíferas e acabar com o negócio ilegal de diamantes que, em Angola, está maioritariamente nas mãos de congoleses, bem como criar condições para controlar os fluxos migratórios.

Este cenário apresenta semelhanças com o que se passou em 2009, mas em sentido inverso, quando as autoridades congolesas expulsaram milhares de angolanos que viviam na RDC há décadas, depois de o Parlamento de Kinshasa ter aprovado uma lei que permitiu o recurso a estas expulsões como resposta a um diferendo que os dois países mantinham sobre a exploração conjunta de blocos petrolíferos no mar de Cabinda, partilhado pelos dois países.

Face a este recrudescer da tensão em Kinshasa, o Governo de Kabila já abriu um processo para investigar as acusações de violência sobre os seus cidadãos "expulsos" e criou uma task force constituída pelo vice-primeiro-ministro e pelo ministro do Interior para "recolher informações" de forma a sustentar a resposta "nos próximos dias" ao que considera ser uma situação "muito grave".

ONG exige respeito pelos Direitos Humanos

Também sobre esta crise, que, apesar de o NJOnline estar a tentar, ainda não foi publicamente abordada pelo Governo angolano, a Associação Congolesa para o Acesso à Justiça (ACAJ), em comunicado citado pelo portal mediacongo, pediu, em carta enviada ao embaixador angolano na RDC, que sejam "devidamente protegidos os direitos humanos" dos emigrantes congoleses, mostrando a sua preocupação pelos relatos de violência perpetrada contra estes em território angolano.

O presidente da ACAJ, Georges Kapiamba, pede "medidas específicas de protecção", destacando a urgência de garantir a segurança de mulheres, crianças e idosos, que, como relatam reportagens nos media locais e internacionais, estão a chegar à RDC, com destaque para a província fronteiriça do Kasai e à cidade de Tshikapa, carregados com os parcos haveres que conseguiram levar, mostrando debilidades físicas.

Na mesma missiva é exigido um "inquérito credível" ao que se passa e garantir que os responsáveis pelas atrocidades que virem a ser provadas sejam "devidamente sancionados".

A "operação Transparência" foi iniciada há cerca de duas semanas em conjunto pelas forças policiais e militares angolanas, incluindo o Serviço de Migração e Estrangeiros (SME), com o objectivo de regularizar o comércio de diamantes nas áreas diamantíferas do país e os fluxos migratórios irregulares.

Centrada nas províncias diamantíferas e fronteiriças entre a RDC e Angola, esta operação já conduziu à saída voluntárias de território nacional, segundo as autoridades angolanas, de cerca de 180 mil congoleses da RDC, enquanto do outro lado da fronteira, são apontados acima de 200 mil cidadãos expulsos, sublinhando os media congoleses que entre estes estão milhares que ostentam documentos que permitem a sua permanência em Angola.

Recorde-se ainda que esta operação, que incide sobre os estrangeiros ilegais em território nacional, surge num momento em que o Governo de João Lourenço criou legislação no sentido de facilitar as entradas no país através da simplificação da atribuição de vistos ou ainda da desobrigação de visto para um conjunto alargado de países, incluindo cerca de uma dezena de Estados africanos em cuja lista não consta a RDC.

O NJOnline está a tentar obter um comentário a esta nova crise com a RDC do Ministério das Relações Exteriores (MIREX).