Noticiada como “o maior escândalo de corrupção na história do sector do gás e petróleo mundial”, a investigação jornalística conduzida pelos grupos de comunicação Fairfax Media e Huffington Post revela "dezenas de milhares" de emails corporativos que comprovam a entrega de subornos a altas figuras de Angola, por parte da Unaoil – consultora sediada no Mónaco e detida pelos Ashani, um poderoso clã de origem iraniana.

Apesar de referir que a “fábrica de corrupção” enfrentou dificuldades para se instalar em Angola, a investigação – desenvolvida na Austrália a partir do escrutínio da consultora local Leighton Offshore – avança que durante três anos, a partir de 2008, a Unaoil e os seus clientes “alienaram pessoas-chave na hierarquia da petrolífera estatal Sonangol”.

É aqui que o nome de Francisco Gonçalves surge na história, associado a um contrato da empresa suíça Sulzer, especializada em equipamentos.

Segundo os jornais The Age e The Huffington Post, “a firma suíça prometeu pagar a Gonçalves, à época responsável por todos os blocos petrolíferos em Angola, 2,5% de um contrato de 20 milhões de libras”.

A comissão, que ao câmbio actual implicaria o pagamento de cerca de 3,5 milhões de dólares a Francisco Gonçalves, seria, de acordo com as duas publicações, viabilizada através de um “Fundo Social”.

Ainda segundo a investigação, quando a Sulzer assumiu que “não tinha mecanismo” para efectuar o pagamento, o hoje vice-presidente da Sonangol Sinopec International – subsidiária internacional da petrolífera estatal – demonstrou descontentamento e começou a “fazer pressão”.

Processo associado a “centro de investigação fantasma” da Sonangol

A contrariedade levou a Sulzer a solicitar a intermediação da Unaoil, cujos termos foram descritos num memorando da empresa monegasca. “O negócio será similar ao da RR [Rolls Royce], em termos de comissão, desde que consigamos chegar às pessoas certas na Sonangol,” lê-se no documento, que refere a importância do dirigente da Sonangol.

“Temos de conseguir trazer FG [Francisco Gonçalves] para o nosso lado, porque ele parece estar envolvido numa grande parte dos negócios”.

Mais do que a referência a comissões, a transacção menciona o pagamento de “subagent fees” – em português taxas para intermediários –, que deve ser lido como um código para “subornos”.

Embora o valor não seja mencionado nas comunicações, as mesmas referem que as “taxas” da Sulzer são elevadas, em comparação com as da Rolls Royce, marca que a Unaoil também representou em Angola.

Foi, de resto, a ruptura da Rolls Royce com a Unaoil, em 2013, que acirrou as suspeitas sobre os negócios do clã Ahsani, entretanto desmentidas pelo presidente da companhia, Ata Ahsani.

Afinal, escrevem o The Age e o The Huffington Post, tratou-se da "primeira vez que a empresa monegasca tinha sido despedida devido a preocupações sobre corrupção”.

As novas revelações estão a ser associadas, em Oslo, ao escândalo da Statoil, sobre o desaparecimento de cerca de 135 milhões de dólares pagos a Angola.

A densa teia de influências coloca na ordem do dia os alertas lançados por várias organizações internacionais de combate à lavagem de dinheiro e à corrupção.

É o caso da organização não-governamental Transparência Internacional, que tem sido das mais activas na denúncia dos esquemas mundiais de branqueamento de capitais, fenómeno exposto de forma estrondosa pelos chamados Panama Papers (Documentos do Panamá).

“O sector petrolífero é muito opaco. Há muitas ligações que estão a ser expostas apenas pela fuga de informação de uma única firma do Panamá [a empresa de advogados Mossack Fonseca]”, sublinha, em declarações ao jornal norte-americano International Business Times, Lucas Olo Fernandes, coordenador para a África Central da Transparência Internacional.

Entre as ligações reveladas pelo paraíso fiscal panamiano sobressaem as suspeitas sobre o ministro dos Petróleos, Botelho de Vasconcelos.