Mas não muito, do fecho de sexta-feira para hoje, segunda-feira, os gráficos do preço do barril de Brent, vendido em Londres mas com a importância para Angola de determinar o valor médio das suas exportações, estão a variar negativamente apenas 0,3 %, embora isso esteja a seguir em contra-mão com as expectativas geradas durante os dois dias que a OPEP e a OPEP+ estiveram a trabalhar em Viena, na Áustria, para garantir uma linha de defesa contra eventuais ataques ao valor do barril.

O barril de Brent abriu hoje a perder cerca de 23 cêntimos de dólar, passando dos 64,43 de sexta-feira ao final do dia para 64,20 hoje, perto das 09:00, o que não representa um perigo para o objectivo de sauditas, russos e parceiros, como Angola, que era - e é - manter o barril com um preço controlado e bem arrolhado face à avalanche de más notícias que sempre surgem, desde os dados da economia chinesa aos avanços e recuos das negociações entre americanos e chineses para acabar com a guerra comercial que travam há quase dois anos.

Em cima da mesa, nas reuniões de quinta e sexta-feira passadas, recorde-se, estava - o que os analistas já davam como garantido - um corte de entre 400 mil e 500 mil barris por dia na produção global da OPEP+, que representa cerca de 40% da produção mundial actual. E isso foi conseguido. Mas havia uma surpresa.

O ministro da Energia saudita, príncipe Abdulaziz bin Salman subiu ao púlpito e atirou com a surpresa que iria fazer disparar o preço do barril. Aos 500 mil barris acordados para acrescer aos cortes que já estavam em vigor de 1,2 milhões de barris por dia (mbpd), Riade vai cortar de forma unilateral mais 400 mil bpd, perfazendo um valor total de cortes de 2,1 mbpd. Esta nova tabela começa a ser aplicada a 01 de Janeiro de 2020.

E, do ponto de vista dos países produtores/exportadores - os EUA, por exemplo, são o maior produtor actual, com mais de 12 mbpd, mas não são um país exportador - a festa estava mesmo a correr bem, porque entre estes, um grupo alargado ainda é economicamente dependente das exportações de crude, como é disso bom exemplo Angola, e uma subida de 2 ou 3 dólares por barril é uma extraordinária ajuda orçamental para fazer frente às severas crises económicas que atravessam.

Sauditas, mas também angolanos, nigerianos, venezuelanos, iraquianos... precisavam com urgência de uma resposta destas dos mercados, apesar de o ministro dos Recursos Naturais e Petróleo angolano, Diamantino Azevedo, ter diro antes da reunião de Viena que Luanda defendia um preço que reflectisse os interesses tanto de exportadores como consumidores, apontando para cortes semelhantes aos que estão em execução e vão continuar assim até 01 de Janeiro de 2020, quando a nova "tabela" entra em vigor.

Estas palavras de Azevedo, recorde-se, absorvem a nuance angolana neste contexto que é ter criado toda uma nova estratégia para o seu sector de petróleo & gás, desde logo a legislação nova, para fazer crescer a produção, o que pode vir a contrastar com os objectivos inerentes ao que ficou acordado na capital austríaca. Mas não para já...

Para já, Angola não enfrenta quaisquer problemas de maior, porque o que acordou foi um corte de 47 mil bps, com uma referência global de 1,528 mbpd, sendo o objectivo chegar aos 1,481 mbpd embora a realidade, segundo dados da Bloomberg, seja que a produção angolana - devido aos problemas surgidos após a crise de 2014 - se tenha ficado pelos 1,356 mbpd, ainda muito aquém da meta, o que significa que o esforço do Executivo em aumentar a produção nada sofre com os compromissos assumidos no contexto das mais recentes negociações em Viena.

Mas...

Mas o que está a acontecer hoje, e não é uma surpresa, veio colocar alguma água na fervura, levando mesmo o barril a descer em Londres, embora ligeiramente, na abertura do mercado, cerca de 0,5%.

Os dados oriundos da performance da economia chinesa já tiveram melhores dias, com os valores das exportações, tanto de bens como de serviços, a encolherem pelo quarto mês consecutivo, como uma das mais indeléveis consequências da guerra comercial entre os Estados Unidos e a China, os dois gigantes da economia planetária.

Segundo os dados avançados pelas alfândegas chinesas, em Novembro as exportações da 2ª maior economia mundial caíram 1,1 por cento, o que dá uma indicação aos mercados trágica para os interesses dos países exportadores de crude, a matéria-prima mais sensível a estes amuos da economia chinesa.

Isto tudo surge apesar de alguns sinais que normalmente indiciariam bons presságios, como é o caso de os indicadores chineses para as suas importações de crude - é o maior importador de petróleo mundial - que estão a subir como não sucedia há muito tempo, o que alguns analistas apontam como podendo ser um indicador de que a guerra comercial entre chineses e norte-americanos pode estar a ser sobrevalorizada no seu impacto real para corresponder a alguns interesses estratégicos negociais.

Porém nada disso retira ao facto de hoje ter sido quebrado um ciclo longo de subidas no valor do crude nos mercados internacionais com esse impulso a ser alimentado pelas sucessivas notícias e rumores de mais e mais profundos cortes na produção no seio da OPEP+, organismo que assumiu esta designação depois de a Rússia e um conjunto de países produtores terem aderido à estratégia da OPEP para controlar os preços em alta.

O histórico da "guerra" OPEP-EUA

Com a chegada ao poder de Donald Trump nos EUA, o petróleo ganhou um novo fulgor enquanto matéria estratégica para a maior economia mundial, que começou a apostar biliões na sua produção interna, desde logo na expansão da sua infra-estrutura produtiva offshore até à famigerada indústria alternativa do fracking, ou petróleo de xisto, que consiste em fazer explodir esta rocha a grandes profundidas com recurso a químicos e água em alta pressão, sendo considerado um método trágico para o ambiente ao contaminar intensamente os lençóis freáticos, entre outras nefastas consequências.

Apesar disso, este esforço levou os EUA ao topo dos maiores produtores mundiais, ultrapassando largamente sauditas e russos, que estão "aprisionados" na estratégia de cortes, embora possuam maior potencial extractivo que os Estados Unidos.

Face a isso, a que acresce a forte pressão política de Washington sobre os seus aliados do Médio Oriente para manter os preços em baixa, Trump tem conseguido controlar os preços também através das notícias de avanços e recuos nas negociações com Pequim para acabar ou prolongar a guerra comercial.

Com isso, Trump garante petróleo menos caro, o que lhe serve na perfeição a estratégia eleitoral para a sua reeleição em Novembro de 2020, onde, para além de corresponder aos anseios da sua indústria, em muitos aspectos obsoleta e de enorme consumo de crude, garante o elemento vital para a campanha eleitoral que são os combustíveis baratos para os automobilistas norte-americanos.

Esta reacção dos EUA tem sido mais evidente desde que a OPEP e a OPEP+ iniciaram, em Janeiro de 2017, o ciclo de cortes, primeiro com menos 1,8 milhões de barris por dia, depois baixou para 1,2 mbpd e agora, a partir de 01 de Janeiro de 2020 vai para 2,1 mbpd, com o "cartel" a ter calendarizada uma nova reunião em Viena de Áustria para Março ou Abril desse ano, altura em que vão analisar os efeitos conseguidos.