A cada dia, sabemos mais sobre este vírus, mas ainda sabemos muito pouco. Na dúvida, optou-se pela salvaguarda do bem principal, confinando e ganhando tempo.

A replicação acrítica e universal do mesmo tipo de medidas de contenção compreende-se à luz da falta de margem temporal para pensar e definir estratégias alternativas, adequadas às realidades locais. Académicos como Alex Broadbent, da Universidade de Joanesburgo, ou o moçambicano Elísio Macamo, alertaram para a não razoabilidade do lockdown em contextos de grande debilidade social e económica, servidos por sistemas de saúde quase inexistentes e já fustigados por um leque alargado de doenças endémicas.

Se fechar foi uma decisão difícil, reabrir será ainda mais. À agência Efe a médica nigeriana Adaora Okali dizia esta semana que, "sem medidas governamentais de mitigação, muitas pessoas prefeririam morrer de covid-19 do que de fome". A capacidade de resiliência de Estados com economias pouco robustas e grande informalidade é escassa, pelo que devolver os cidadãos às ruas se afigurará, mais cedo ou mais tarde, como um imperativo de sobrevivência.

O "novo normal" permanece uma incógnita. Socialmente, sabemos que o distanciamento possível vigorará por um período relativamente longo, com todas as implicações que isso acarreta. O uso obrigatório de máscaras apresenta-se como uma certeza.

Economicamente, adivinham-se anos de grandes dificuldades, resumidas em declarações recentes de Alex Vines, da Chatham House: "para África, a maior ameaça pode ser o impacto económico das perturbações trazidas pela covid-19, mais do que o vírus propriamente dito".

Nos países com forte dependência de um único produto ou serviço, mormente petróleo ou turismo, o choque será maior e a retoma mais demorada.

Esta terça-feira, o ministro das Finanças nigeriano, Zainab Ahmed, usou a expressão "golpe duplo" para descrever a dimensão do problema que o seu governo tem em mãos, não fosse a Nigéria um dos principais exportadores mundiais de petróleo - matéria-prima que negoceia em mínimos históricos.

Também o número de turistas internacionais poderá diminuir de 60 a 80%, segundo estimativas da Organização Mundial do Turismo, que antecipa que 100 a 120 milhões de postos de trabalho podem estar ameaçados em todo o mundo.

Com discussões em curso sobre a reestruturação da dívida de muitos países africanos e o risco de default a aumentar, as agências de notação financeira revêem em baixa os ratings dos mais expostos.

A incerteza é muita, até face ao número de infecções reportadas pelas autoridades de saúde africanas. Qualquer plano que esteja a ser traçado deve considerar uma grande falibilidade.

Pediram-nos que nos preparássemos para o pior. E o pior ainda está para vir.