Desta vez, com um novo inesperado, assistimos à aterragem em todo o mundo da pandemia do coronavírus. Que, pelos vistos, recebeu uma resposta "enérgica" dos nossos notáveis deputados que, mesmo tendo sido à margem das recomendações da OMS, acabou por se revelar "eficaz" na prevenção da infiltração e da propagação do vírus nos amplos e confortáveis gabinetes de trabalho do nosso majestoso Parlamento...

Antecipando-se aos seus estragos, os nossos ilustres deputados, para "corrigir o que esta(va) mal" e para poupar recursos do Estado, decidiram comprar, mensalmente a preço do saldo 300 esferográficas por apenas 1.000.000.00 Kz e 300 pacotes de papel higiene por apenas 750.000.00 Kz...

Antecipando aos seus estragos, os nossos queridos deputados foram às compras e abarrotaram os seus gabinetes com remessas industriais de rolos de papel higiénico para proceder à "limpeza" da aritmética do Ministério das Finanças e para ornamentar o "apagão" registado na fiscalização feita pelo Tribunal de Contas...

Antecipando-se aos seus estragos, os nossos distintos deputados, para dar largas à sua vocação como requerimentistas de 1.ª classe e para conferir brilhantismo às suas teses, decidiram comprar sofisticados aparos para os mergulhar agora em tinteiros almofadados em "suave" papel higiénico...

O resultado, parlamentarmente chancelado pelo Diário da República, está embrulhado em documentos aprovados pela magna Casa das Leis cuja serventia, como escreveu Alves da Rocha no seu artigo da semana passada no Expansão, "não tem classificação na gama de adjectivos da gramática da língua portuguesa"...

O resultado, perante tanta fartura de papel higiénico e à desesperada procura de talentos por parte do júri do Prémio de Literatura da Sonangol, abre aos nossos criativos deputados, uma oportunidade de ouro para que estes possam, finalmente, libertar o seu inesgotável gênio literário e, desta forma, arrecadar o almejado galardão...

Não espanta, por isso, que, ante o desfile de tão abundante naipe de talentos, o Parlamento angolano se sinta agora orgulhoso por ter sido "eleito" pela OMS como a única instituição do nosso país que previu, com avisada antecipação, a chegada da Covid-19...

Ao entrar pelas nossas casas sem pedir licença, esta pandemia está agora a obrigar-nos a alterar a rotina. Mas, esta inesperada tragédia não veio sozinha. Com ela chegou também uma mais ou menos esperada remodelação governamental.

Uma mudança?

Calma.

Calma porque se mudaram os tempos e se mudaram as vontades, mas o país continua prisioneiro da antiga visão suburbana do poder e por arrastamento do mesmo atraso político, da mesma megalomania estrutural e do mesmo subdesenvolvimento mental.

Calma porque se mudaram os tempos, mudaram-se as vontades e, com isso, o Presidente procedeu agora à mudança da embalagem do Governo com novas imagens no rótulo, mas nada garante que o efeito do produto final, em muitos casos, não venha a ser o mesmo.

Calma porque destapado o interior da nova embalagem, poderosos e obscuros interesses financeiros que se entrelaçam nas escadarias do poder, continuam a fazer patinar o arranque da máquina governativa. Portanto, calma.

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