Do período em referência, destaca-se o dia 14, em que os mais de 41 minutos de noticiário governamental representam 85% do espaço do Telejornal.

Se por um lado, nesse período, não houve qualquer notícia de e sobre iniciativas, posicionamentos da oposição, nomeadamente do maior partido da oposição, a UNITA (mal vai a democracia quando a oposição, que pretende ser poder, em três dias desaparece completamente), por outro, é dado destaque ao comunicado final da reunião de 15 de Maio do Secretariado do Bureau Político (BP) do MPLA, chegando ao ponto de o apresentador ler que o BP aprovou a nomeação do chefe de um qualquer gabinete afecto ao secretário-geral do partido no poder.

Mesmo quando os líderes da CASA-CE e do PRS (terceiro e quarto partidos angolanos) aparecem em curtas declarações, é para elogiar a audiência com o Presidente João Lourenço, no Palácio da Cidade Alta, naquilo a que o oficioso Jornal de Angola definiu como acto da "governação aberta", a lembrar as "presidências abertas" de Mário Soares, enquanto Chefe de Estado português.

Atendendo a que a televisão do Estado, como principal órgão de comunicação social do País, não deve ser partidária nem partidarizada, dada a sua responsabilidade de reportar o quotidiano, as angústias e as agruras da sociedade, os dados atrás expostos indiciam a existência de censura e de um alinhamento da TPA com o poder.

Como compaginar Liberdade de Imprensa e de Expressão, a mãe de todas as liberdades, com censura seja ela auto ou hétero?

Que liberdade de imprensa é essa que obriga a TV pública a ler na íntegra irrelevantes comunicados oficiais de instituições públicas, governamentais e do partido no poder, transformando-a em caixa de ressonância do poder e, consequentemente, matando o jornalismo?

Porque não há democracia sem liberdade, nem esta sem Liberdade de Imprensa, e, roubando as palavras ao filósofo francês Alexis de Tocqueville, "Quanto mais observo os efeitos de uma imprensa livre, mais me convenço de que, no mundo moderno, a liberdade de imprensa é o principal e, por assim dizer, o elemento constitutivo da liberdade", então é a democracia que está em causa, quando a censura toma conta do jornalismo.

Se a visitação dos media representa, nas sociedades modernas, a terceira ocupação do ser humano, depois do trabalho e do sono, a falta de Liberdade de Imprensa e de Expressão é o caminho mais curto para a manipulação e alienação dos cidadãos.

Onde fica a Liberdade de Imprensa, quando o poder mediático é partidário, a principal estação televisiva do País se transforma em canal do Executivo e seus departamentos, o seu noticiário é reflexo de um poder monopartidário de facto, mesmo não sendo de jure, demonstrando que o partido no poder é sinónimo de "partido-Estado", para usar a expressão do historiador Jean-Michel Mabeko-Tali?

Se liberdade é sinónimo de pluralidade, com a TV monopolizada pelo poder, sem pluralismo, dá-se a aniquilação estrutural do discurso da oposição e a Liberdade de Imprensa transforma-se numa miragem.

Só pode ser Liberdade de Imprensa de fachada, quando, por um lado, se permite a criação/existência de órgãos de comunicação privados, independentes e, por outro, se instala a desigualdade de oportunidades, de acesso às fontes entre jornalistas dos meios de comunicação social públicos e privados.

Quando a media detida por capitais privados é excluída de actos públicos dos governantes, como conferências de imprensa ou deslocações do Chefe de Estado, isso é Liberdade de Imprensa? Se não há igualdade de oportunidades, onde está a Liberdade de Imprensa?

Como falar em Liberdade de Imprensa, se apesar de divulgado pelo Jornal de Angola, a notícia de que no Zango, em Luanda, "um número considerável" de angolanos tem como único alimento ratos, a TPA ignora o assunto, preferindo destacar anúncios do Executivo sobre hipotéticos programas de combate à fome e à pobreza?

Ou será que os profissionais da TPA não estão entre os principais leitores do Jornal de Angola, contrariando, desta forma, a tese defendida pelo sociólogo francês Pierre Bourdieu, segundo a qual os jornalistas são os maiores "consumidores" dos media?

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