A lei fundamental é clara ao determinar que só são inelegíveis os cidadãos que que sejam "titulares de alguma nacionalidade adquirida" e não que tenham essa dupla nacionalidade originária.

A empresária e filha do antigo Presidente José Eduardo dos Santos admitiu a possibilidade de uma candidatura presidencial numa entrevista à portuguesa RTP na quarta-feira.

Após o arresto preventivo dos seus bens e contas bancárias em Angola pelo Tribunal Provincial de Luanda, a pedido da PGR em nome do Estado, ficou a saber-se que Isabel dos Santos mudou parte da sua estrutura empresarial para o Dubai, onde fixou residência, utilizando para o efeito a sua nacionalidade russa, que possui pela via materna.

Como reacção a essa notícia, Isabel dos Santos não negou possuir a nacionalidade russa, embora tenha negado ter alterado o seu nome para os procedimentos fiscais aquando da mudança de residência para os Emirados.

Face a isto, e de acordo com o Artigo 110.º da CRA, subordinado ao capítulo da elegibilidade do PR, "são elegíveis ao cargo de Presidente da República os cidadãos angolanos de origem, com idade mínima de trinta e cinco anos, que residam habitualmente no País há pelo menos dez anos e se encontrem em pleno gozo dos seus direitos civis, políticos e capacidade física e mental".

A CRA diz ainda que estão impedidos de serem candidatos "os cidadãos que sejam titulares de alguma nacionalidade adquirida".

Numa explicação detalhada feita ao NJOnline, o jurista Albano Pedro avançou que a CRA determina apenas essa impossibilidade para os cidadãos que tenham outra nacionalidade adquirida e não para aquelas que a possuam de forma originária.

A cidadania originária é obtida normalmente pela via sanguínea, como é o caso de Isabel dos Santos, cuja nacionalidade russa, se a possuir, de facto, salvaguarda o jurista, é porque a sua mãe é russa, estando, assim, posta de parte a possibilidade de Isabel dos Santos ser enquadrada pelo Artigo 110º da CRA, referente ao impedimento por via da nacionalidade adquirida.

Mudança no xadrez político

Isabel dos Santos admitiu esta quarta-feira uma candidatura à presidência de Angola. A revelação da empresária e filha do antigo presidente José Eduardo dos Santos foi feita numa entrevista à televisão pública portuguesa RTP.

"É possível", afirmou Isabel dos Santos, em resposta a uma pergunta do jornalista da RTP que se deslocou a Londres para entrevistá-la.

A empresária admitiu a possibilidade de concorrer ao lugar que durante 38 anos foi ocupado pelo seu pai depois de dizer que fará tudo o que tiver de fazer para "defender e prestar os serviços" ao seu País, declarando que está a ser alvo de perseguição judicial em Angola para ser neutralizada politicamente.

E, num tom consistente com aquele que tem usado nas múltiplas entrevistas que deu nos media nacionais e internacionais, bem como nas declarações feitas a partir das redes sociais, Isabel dos Santos afirmou que se em Angola se quiser lutar contra a corrupção "devemos olhar para onde ela está".

A empresária, e agora, uma das possíveis candidatas à Presidência da República em 2022, quando o actual Presidente João Lourenço se candidatará a um segundo e último mandato permitido pela Constituição, afirma ainda nesta entrevista à RTP que não se pode usar a "suposta luta contra a corrupção de forma selectiva para neutralizar o que achamos que possam ser futuros adversários políticos".

Isto, porque, como já dissera também em entrevistas recentes, Isabel dos Santos vê-se como uma vítima de "perseguição política" que entende partir de uma estratégia gizada no seio da liderança do MPLA e conduzida pela justiça angolana porque o que João Lourenço pretende com a sua luta contra a corrupção, avançou, é atingir pessoas que lhe possam fazer frente no no campo político e "representem alguma influência ou alguma popularidade dentro do próprio MPLA", como entende, como se subentende a partir desta afirmação, ser o seu caso.

"Tenho um grande sentido de dever em relação a Angola e farei tudo para defender e prestar os serviços à minha terra e ao meu país", afirmou como antecâmara para aquela que seria a frase mais explosiva da sua última entrevista, aquela onde diz que "é possível" vir a ser candidata à Presidência da República em Angola, país onde defende que o seu paí, que governou o país durante 38 anos, deixou um enorme legado político que "muitos angolanos gostariam de ver respeitado".

Nesta entrevista à portuguesa RTP, a mais conhecida empresária angolana diz ainda que a "perseguição" que lhe está a ser feita é uma consequência da sua passagem pela administração da Sonangol, onde, lembra, procurou alterar procedimentos que eram "opacos".

O Tribunal Provincial de Luanda decretou, no final de Dezembro, o arresto preventivo de contas bancárias pessoais da empresária Isabel dos Santos, do marido, Sindika Dokolo, e do presidente do Banco de Fomento de Angola (BFA), Mário Leite da Silva, para além de congelar as contas de várias empresas nas quais detêm participações, nomeadamente nos bancos BIC e BFA, e nas empresas UNITEL, ZAP, FINSTAR, Cimangola, CONDIS, Continente Angola e SODIBA.

Isabel dos santos tem negado as acusações, dizendo não compreender "nem se conformar com este enquadramento num Estado de Direito democrático como é Angola" e afirmando que pretende "opor-se a cada uma destas alegações em sede e tempo próprio nos termos estabelecidos na lei angolana".