"O que falta aqui é que os actores principais ou já não estão em cena ou é difícil encontrá-los, porque o 'apartheid' acabou e muitos deles morreram", declarou Joaquim Chissano aos jornalistas à margem da cerimónia em Maputo de homenagem ao primeiro Chefe de Estado moçambicano, falecido a 19 de outubro de 1986.
Chissano, antigo ministro dos Negócios Estrangeiros de Machel e que lhe sucedeu como chefe de Estado, disse que se referia ao antigo Presidente sul-africano durante o regime de minoria branca "apartheid" Pieter Botha e ao ex-ministro da Defesa Magnus Malan, ambos já desaparecidos, e "aos generais que poderiam esclarecer o segredo revelado pela caixa negra [do avião] durante as investigações".
O antigo estadista moçambicano fazia uma alusão a um alegado rádio-farol (VOR) falso que terá sido colocado na véspera do desastre em Mbuzini, local da queda do aparelho que transportava Machel, com objectivo de desviá-lo na sua aproximação ao Aeroporto Internacional de Maputo.
Este assunto, disse hoje Chissano, "não foi cavado e é difícil cavar agora", quando a suposta existência do VOR falso pode ser a chave para a explicação da queda do Tupolev 134, de fabrico russo, que matou Machel e 34 membros da sua comitiva no regresso a Maputo de uma viagem à Zâmbia.
As autoridades moçambicanas usaram várias vezes a versão de que o avião foi derrubado intencionalmente pelo então regime sul-africano do "apartheid", mas as investigações foram inconclusivas, persistindo dúvidas sobre a existência do rádio-farol e quem o colocou no local, além da suposta realização de exercícios militares na região do desastre.
"O inquérito foi inconclusivo porque aqueles que podiam responder a essas perguntas recusaram-se a responder e outros recusaram-se a continuar a investigar, até que morreram", comentou o ex-Chefe de Estado, acrescentando que o exército sul-africano mantinha muitos segredos, incluindo "um exército secreto dentro do exército, que fazia o que entendia e matava em toda a região, de Angola a Dar-es-Salam".
O Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, disse hoje, na cerimónia de homenagem a Machel, que "a justiça ainda deve ser feita", referindo-se às causas da morte do estadista, depois de na segunda-feira o primeiro-ministro, Carlos Agostinho do Rosário, ter declarado numa cerimónia em Mbuzini que se tratou de um assassínio, cuja explicação é "uma prioridade nacional e um imperativo patriótico".
Mas Joaquim Chissano considera difícil que a verdade venha um dia a ser conhecida.
"Não sei como. A esperança é sempre a última a morrer, mas não é uma coisa para mim palpável, que eu possa ver os caminhos que possam conduzir a isso", referindo que ele próprio, se fosse incumbido para investigar, não saberia como.
"Vamos dizer assim: que um dia se faça justiça, que um dia a luz venha ao de cima, mas não posso dizer como", afirmou ainda.