Na Casa dos Comuns, a câmara baixa do Parlamento britânico (na câmara alta têm assento os lordes), defendeu o acolhimento das três mil crianças sírias que chegaram à Europa sem família.

Foi a primeira da sua família a chegar à Universidade. Não deu o tempo por perdido. Em Cambridge, licenciou-se em Estudos Políticos e Sociais e, no London School of Economics, aprofundou os conhecimentos numa área diametralmente oposta.

Ainda jovem, trabalhou na primeira campanha eleitoral de Barack Obama. O seu perfil e a paixão por causas sociais fizeram-na subir na Oxfam, organização internacional fundada em Inglaterra, em 1942, por um grupo de intelectuais, activistas e académicos de Oxford, liderado pelo cónego Theodore Richard Milford, com o objectivo de convencer o Governo britânico a permitir o envio de alimentos às populações famintas da Grécia, então ocupada pelos Nazis.

Hoje as causas são outras e Jo Cox estava embrenhada nelas até à medula, tal como o marido, Brendan Cox, antigo executivo da organização não-governamental Save the Children e conselheiro do Partido Trabalhista. Trabalhavam em duas frentes pelas crianças. A sua atenção estava, nos últimos tempos, centrada na Síria. Nos meninos que a guerra fizera órfãos, que separara das famílias, muitas delas acabaram por vir parar à Europa sozinhas.

Pelas crianças sírias e pelo seu direito a um tecto, que lhes assegurasse cuidados e afectos, bateu-se no Parlamento Britânico. A sua eleição como deputada em 2015 levou-a para o grupo parlamentar "Amigos da Síria", que co-presidiu e onde se discutia a abordagem britânica à guerra civil no país de Bashar al-Assad. Como deputada, posicionou-se sempre a favor da imigração e da diversidade, dois dos ingredientes que fortaleceram o Reino Unido.

"As nossas comunidades foram profundamente beneficiadas pela imigração, seja de católicos irlandeses ou de muçulmanos de Gujarat, na Índia, ou do Paquistão", afirmou, em Junho do ano passado, num dos primeiros discursos que fez na casa das leis.

Na quinta-feira, 15, Cox regressou ao seu condado natal, em West Yorshire, para fazer campanha contra a saída do Reino Unido da União Europeia. Passavam poucos minutos da uma da tarde, quando, acompanhada pelo seu assistente, saiu da Biblioteca de Birstall, na Market Street, depois de um encontro com moradores. A partir daqui os relatos são difusos e ainda imprecisos. Há quem diga que foi baleada depois de intervir numa discussão, tentando apaziguar os envolvidos na contenda; há relatos da aproximação de um homem que lhe desferiu três tiros e, depois, com ela já no chão, continuou a agressão com uma arma branca.

"Perdemos uma mulher maravilhosa, perdemos uma deputada maravilhosa, mas a nossa democracia continuará. O seu trabalho perdurará. Enquanto estamos de luto, trabalharemos em nome da sua memória para chegarmos a um mundo melhor para o qual ela passou a vida a trabalhar", testemunhou o líder do Partido Trabalhista Jeremy Corbyn, enfatizando o retrato feito pelo primeiro-ministro britânico, David Cameron: "Perdemos uma grande estrela. Ela era uma grande deputada em luta com uma compaixão enorme, com um grande coração".

O agressor, descrito como um sujeito pacato, sem emprego e sem carro, que fazia a vida ajudando os vizinhos nas tarefas de jardinagem, terá gritado repetidamente "Britain, first" (nome de um partido de extrema-direita, anti imigração), enquanto desferia os tiros e a apunhalava. Não fugiu, não resistiu. Manteve-se deitado, manietado pela polícia, cara voltada para o chão. Em silêncio, encolhido pelo ódio. Morto por dentro. Mais morto do que Cox. Ela viverá nos filhos que gerou, no trabalho que desenvolveu, no exemplo que deu.

Pouco depois de conhecida a morte, o marido de Jo escreveu aquele que podia ser o testamento político da mulher. "Ela quereria duas coisas acima de tudo. A primeira, que os nossos preciosos filhos sejam banhados em amor. E, em segundo lugar, que nos unamos na luta contra o ódio que a matou. O ódio não tem credo, raça ou religião. É venenoso".

Absorver estas palavras é a melhor forma de homenagear uma "mulher que acreditava num mundo melhor e se bateu por ele todos os dias" e de lembrar todas as vítimas do ódio, quer seja no Reino Unido, em Orlando, ou noutro qualquer lugar do mundo.