Nas bolsas, as declarações de Donald Trump contendo a ameaça de aplicar mais e gravosas taxas aos produtos Made in China, caíram que nem uma bomba e os seus estilhaços chegaram aos mercados europeus à velocidade de um míssil balístico, atingiram a Ásia com a intensidade de artilharia pesada e as américas como uma carga de infantaria.

O petróleo afundou nas tabelas dos mercados de Londres (Brent) e de Nova Iorque (WTI) como já não acontecia há meses, graças aos disparos sucessivos de tweets de Donald Trump, apontando para um prolongamento sem fim à vista da batalha que trava com o Governo de Pequim.

Da China, a resposta é à altura de quem sabe que tem poderio semelhante e está preparado para contra-atacar se necessário, embora a paciência chinesa esteja sempre na linha da frente do argumentário bélico, apelando, face à fanfarronice da Administração Trump, para mais negociações antes de declarar a impossibilidade de garantir a paz na forma de um tratado comercial que satisfaça ambas as partes.

Em causa está a certeza repetidamente firmada de Donald Trump de que a China está há décadas a enganar os Estados Unidos, país para onde o gigante asiático mais exporta no mundo, gerando vantagens através do apoio estatal ao sector exportador privado para garantir vantagens competitivas aos seus produtos, ao mesmo tempo que mantém o seu imenso mercado de 1,3 mil milhões de habitantes com limitações legais às exportações norte-americanas.

O que Trump diz querer é que a China importe mais dos EUA, especialmente bens agrícolas/alimentares e, entre outras áreas, tecnologia ou viaturas, ao mesmo tempo que o Governo chinês abandone progressivamente o apoio estatal às empresas privadas, gerando vantagens competitivas que as congéneres americanas não conseguem ter e está na génese dos mais de 300 mil milhões USD de défice para os EUA nas contas do comércio entre os dois países.

Isto já levou, desde que Trump chegou, há cerca de dois anos, à Casa Branca, os EUA a aplicarem 200 mil milhões USD de taxas extra às exportações chinesas, o que foi conseguido com a aplicação de uma taxa de 10% em cima de centenas de produtos Made in China e que, agora, face a este novo episódio da guerra comercial - já há quem lhe chame telenovela comercial - o Presidente norte-americano quer aumentar para 25%, antecipando já a possibilidade de alargar a lita de bens "alvejados".

Se essa tarifa extra for aplicada, a carga passará de 200 mil milhões de "sanções" para os 250 mil milhões.

Liu He a caminho de Washington

A parte chinesa, sempre apostada em não destruir as pontes existentes para a mesa das negociações, já prometeu fazer mais para manter Trump sentado à mesa, organizando uma comitiva de alto nível para ir a Washington, liderada pelo vice-primeiro-ministro Liu He, que é um dos conselheiros próximos do Presidente Xi Jinping.

Nas batalhas anteriores, a China respondeu às taxas extra dos EUA sobre os seus produtos com tarifas sobre os bens importados da América, em valores próximos dos 50 mil milhões USD, o que é, obviamente, substancialmente menos que os 200 mil milhões disparados do outro lado e que já amanhã, sexta-feira, pode ser severamente alteradas para cima, como ameaçou fazer Trump se não obtivesse uma clara cedência chinesa.

Agora, o ministro do Comércio chinês veio, como é apanágio da paciente diplomacia do gigante asiático, dizer que esta guerra não é benéfica para ninguém e muito menos para os povos dos dois países.

"A Chine lamenta profundamente se os EUA aplicarem estas tarifas extra, mas não nos retará alternativa que não seja a aplicação de imediatas contra-medidas", disse Zhong Shan.

Mas, apesar desta abertura chinesa para negociar, Donald Trump acusa, num violento tweet, a China de ter uma postura "inflexível" porque espera que no futuro chegue à Casa Brabca um inquilino fraco e que isso lhe permita continuar a "roubar" 500 mil milhões USD por ano aos EUA.

Porém, de acordo com números oficiais da Organização Mundial do Comércio, o défice norte-americano com a China é de 335 mil milhões USD, embora tenha vindo a crescer anualmente, sendo disso nota o facto de em 2005 este défice estava nos 201 mil milhões.

Mesmo que noutra entrada do Twitter, o mesmo Trump se tenha vangloriado de que "afinal" a parte chinesa estava quase a claudicar com a chegada a Washington de uma equipa para nova ronda negocial. "Vamos esperar para ver, porque eu estou contente a ver entrar 100 mil milhões em tarifas nos cofres".

Um acordo comercial, nestas circunstâncias, é cada vez mais visto pelos analistas como estando a escapar-se por entre os dedos de Trump e Jinping, e o resultado está agora e já bem visível na perda de vigor das economias dispersas pelas quatro pontas da rosa-dos-ventos.

Os efeitos colaterais nas bolsas mundiais são num único sentido e estão quase todas a cair, começando pelas norte-americanas, com o índice S&P 500, que fechou na quarta-feira a perder 0,16%, enquanto o electrónico Nasdaq recuou 0,26%, passando pelas principais na Europa ou na Ásia.

Já no petróleo, o sentido é o mesmo, para baixo, com o nova-iorquino WTI a descair 0,77%, para os 61 USD por barril, enquanto no Brent de Londres, o mais importante para Angola por ser ali que a média do valor das exportações nacionais é definido, está hoje a cair 0,71%, mantendo-se abaixo da faquia dos 70 USD por barril, nos 69,87 USD.

Mas, pelo comportamento da recta final do dia de ontem nos mercados, seja do petróleo, seja das bolsas, se as indicações da comitiva chinesa, à chegada a Washington, foram de que existe abertura para um acordo, a reacção será em alta imediata.

Isto, também devido à eventual escassez do lado da oferta de crude por causa da persistente crise na Venezuela, por causa do retomar da guerra civil na Líbia e ainda devido às sanções revigoradas dos EUA às exportações iranianas.