Vladimir Putin é visto nalguns corredores da diplomacia mundial como um exímio jogador de xadrez, e, como é comum nestes, o seu trunfo é sempre antecipar as jogadas do adversário, mas o movimento de Volodymyr Zelensky dificilmente poderia ser antecipado.

O Presidente ucraniano contra-atacou movimentando a peça mais valiosa do seu lado do tabuleiro de xadrez, ele mesmo, anunciando a sua disponibilidade, a vontade do "Rei", para ir a Istambul, na Turquia, falar tête-à-tête com Putin.

Foi um golpe de mestre ou uma jogada que garante aquilo que Zelensky queria, que era afastar totalmente o recomeço das negociações directas entre os dois beligerantes, como o chefe do Kremlin pretendia, mas não com um frente-a-frente Presidencial?

Putin fez a proposta (ver links em baixo) de recomeço das negociações interrompidas em Março de 2022, semanas depois da invasão, e onde as partes já tinham um draft assinado para cessar as hostilidades quando o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, entrou ruidosamente em cena.

Johnson, respaldado pela NATO, foi a Kiev "obrigar" Zelensky a sair das negociações com a Rússia prometendo-lhe, sabe-se hoje, uma entrada rápida na NATO e um corredor vermelho para a Ucrânia entrar na União Europeia, além de dinheiro e armas num fluxo ilimitado até à derrota dos russos no campo de batalha.

Entre Abril de 2022 e hoje, 13 de Maio de 2025, há um imenso calendário preenchido pela mais violenta e mortífera guerra no continente europeu desde a II Guerra Mundial, com centenas de milhares de mortos e feridos de um e do outro lado... e nada de paz, nem de Ucrânia na União Europeia e muito menos na NATO

Nem da vitória prometida por Boris Johnson, ou tão pouco a continuação do apoio ilimitado dos aliados ocidentais, porque os EUA de Donald Trump não são os EUA de Joe Biden, e na Europa ocidental, franceses, alemães e britânicos só ameaçam Moscovo quando Washington lhes garante a retaguarda.

Pelo contrário, é evidente que as forças russas, ao longo de toda a linha da frente, de mais de 1.000 kms, estão em vantagem, como nota o analista militar major-general Agostinho Costa, "as condições para um cessar-fogo nunca são impostas por quem está a perder uma guerra".

Curiosamente, nesta altura, outra incongruência começa a ser evidenciada por analistas que é a mudança de postura da França, Alemanha e Reino Unido, que ao longo da guerra sempre recusaram qualquer cessar-fogo e agora pedem aos russos que aceitem parar a guerra sem condições.

À recusa dos aliados europeus de Kiev em refutar todas as pressões para negociações de paz com a Rússia sucede uma mudança de posição de 180 graus, sendo agora franceses, alemães e britânicos quem exige a Moscovo um cessar-fogo de 30 dias sem condições.

Alias, as indicações do francês Emmanuel Macron, do alemão Friedrich Merz, e do britânico Keir Starmer, como ficou claro na sua frenética deslocação a Kiev este fim-de-semana, são para que Zelensky só avance para negociações com garantias prévias russas de um cessar-fogo.

E quando parece estar afastada a possibilidade de Vladimir Putin se deslocar esta quinta-feira, 15, a Istambul para se encontrar com Volodymyr Zelensky, o que seria um caso raro na diplomacia global, com Presidentes a reunirem sem rondas técnicas prévias, o Kremlin também já veio dizer que qualquer cessão de hostilidades só ocorrerá após conversações.

O Porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, apesar disso, assumiu a disponibilidade e vontade russa de iniciar o processo de negociações, mas através de delegações, como, de resto, acontecia em 2022 antes de serem abrasivamente interrompidas pelo circense Boris Johnson.

Em Kiev a questão mantém-se na posição de ir já para um tête-à-tête entre Zelensky e Putin, com o ucraniano a dizer que vai estar em Istambul à espera do russo embora o russo ainda não tenha dito ou mandado dizer categoricamente que não vai comparecer.

É que essa possibilidade não está totalmente posta de lado porque, entretanto, o norte-americano Donald Trump, como lhe é peculiar, veio baralhar tudo de novo, voltando a dar cartas ao seu "amigo" Vladimir Putin, admitindo que ele próprio pode ir à Turquia.

E se Trump der, com a sua presença, uma profundidade de campo negocial mais pesada, Putin pode repensar a sua decisão, até porque tanto o norte-americano como o ucraniano conhecem bem as suas condições para a mesa de negociações e o norte-americano até concorda que as "raízes do conflito" têm de ser revisitadas sejam quais forem as conversas.

Donald Trump disse mesmo, numa flamejante declaração na sua rede social, Social Truth, que Kiev tem de aceitar negociar com os russos sem condições, como foi proposto pelo Kremlin, porque é uma oportunidade imperdível para parar o "banho de sangue" no leste europeu.

Apesar de ser muito complexa e difícil de organizar em tão pouco tempo, uma viagem de Putin a Istambul seria, sem quaisquer dúvidas, o mais robusto avanço diplomático para acabar com a guerra na Ucrânia... mas tal dificilmente terá lugar.

E também as conversas entre delegações parecem estar igualmente afastadas, porque Kiev e os seus aliados europeus exigem que estas apenas ocorram depois de Moscovo aceitar um cessar-fogo incondicional de 30 dias.

Ora, como referiu Putin, um cessar-fogo, como pretendem os aliados europeus de Zelensky, apenas serviria para "rearmar, reorganizar e concluir o processo de recrutamento acelerado" para o fragilizado e depauperado Exército ucraniano poder continuar os combates de seguida.

A não ser que Donald Trump, usando da sua prorrogativa que é saber que sem o apoio dos EUA, os europeus são apenas anões militares e sem capacidade de fornecer o que Kiev precisa para alimentar a frente de batalha, levam avante o seu ultimato para forçar Zelensky a ceder.

Segundo Steve Witkoff, o enviado especial de Trump para este conflito, citado pela TASS, a Casa Branca está mesmo muito empenhada em "fazer deste momento uma oportunidade para a paz", falando mesmo no ultimato que o Presidente norte-americano fez aos dois contendores.

"O Presidente fez um ultimato a ambos os lados sublinhando que sem estas conversações directas e sem um resultado que aproxime a paz rapidamente, os Estados Unidos vão sair de cena deste conflito, signifique isso o que significar sem se envolverem mais nele", disse Witkoff, citado pela russa RT a partir de notícias nos media norte-americanos.

O enviado de Trump avisou, ainda citado pela agência oficial russa, que Washington quer de facto mediar o conflito para chegar à paz, e "acabar com o banho de sangue sem sentido" como referiu Trump, porque, avançou Steve Witkoff, "está não é a guerra dos EUA, não foram os EUA que a começaram, mas querem ajudar".

Em forma de pêndulo a balançar de um lado para o outro nos media internacionais ficará até à próxima quinta-feira, 15, a dúvida se haverá negociações entre ucranianos em Istambuel, se estas terão a presença de Putin e Zelensky e se assim for, se Trump estará ou não presente.