A desmarcação da visita de Aloysio Nunes, que estava pronto para seguir para o Cairo com uma larga comitiva que integrava dezenas de empresários e elementos ligados à indústria militar brasileira, foi feita em cima da hora, o que, na linguagem diplomática, si9gnifica um "recado" severo de descontentamento.

Confirmada pelo Ministério das Relações Exteriores do Brasil aos media do país, esta atitude do Egipto constitui o primeiro revês sério das opções do Presidente eleito, embora tenha sido utilizado para o efeito uma fórmula comum nestas situações, alegando razões de agenda para o cancelamento "sine die", sem ter sido avançada uma proposta de nova data.

O recado foi claro e os jornais brasileiros já estão a "desmontar" as eventuais consequências desta atitude, sendo uma delas a possível quebra das transacções comerciais com o maior país árabe em África, e um dos mais populosos do continente, com 90 milhões de habitantes, com a agravante de os países árabes do Médio Oriente e norte de África estarem entre os maiores parceiros comerciais do Brasil, para onde o gigante sul-americano exporta grande parte da sua produção industrial e agrícola, avaliada em centenas de milhões de dólares por ano.

Face ao facto de se tratar da maior polémica religiosa do mundo, porque Jerusalém é uma cidade disputada por Israel e pela Palestina, com ambos a querem ali ver reconhecida a sua capital ancestral, e de o mundo muçulmano já ter, em uníssono, garantido que violar esse princípio sagrado é a mais forte linha vermelha, o Brasil corre agora o risco de ver todo o mundo islâmico virar-lhe as costas.

A Turquia poderá ser o próximo veículo do descontentamento muçulmano como o seu Presidente, Recep Tayyp Erdogan, já o afirmou aquando da decisão do Presidente dos EUA, Donald Trump, em mudar a embaixada norte-americana de Tel Aviv, em Maio deste ano.

Erdogan avisou de forma clara que essa era "a linha vermelha inultrapassável" para o mundo do Islão.

Embora a justificação tenha sido de natureza logística, a verdade é que os EUA adiaram por vários meses a abertura da sua embaixada na Cidade Santa.

O Brasil é o mais importante país, a seguir aos EUA, a anunciar, mesmo que através do seu Presidente eleito - Bolsonaro só assume o cargo em Janeiro de 2019 -, que vai mudar a sua embaixada para Jerusalém e as consequências foram imediatas, coma reprovação generalizada dos governos dos países islâmicos, embora o facto de não ser ainda Chefe de Estado esteja, segundo os analistas brasileiros, a refrear as reacções, que deverão ser mais estridentes quando Bolsonaro chegar ao Palácio do Planalto, em Brasília, para assumir os destinos do maior país da América do Sul.

E é a partir dali que terá de reagir ao esperado contra-ataque do mudo árabe à sua decisão, que representa uma clara viragem no histórico compromisso da diplomacia brasileira em apoiar o diálogo como ferramenta para desencravar a escaldante relação entre Israel e a Palestina, e, através desta, de todo o universo islâmico.

Posição que passa a ser contrária à opção oficial das Nações Unidas por uma capital - Jerusalém - para dois Estados, como única via para apaziguar os ânimos na região, colocando-se ao lados do unilateralismo norte-americano sob as ordens de Donald Trump.

Recorde-se que esta questão gerou uma mini-crise diplomática também em Luanda.