Mas foi sol de pouca dura e as nuvens negras estão a voltar a ensombrar aquilo que poderia, e parecia, ser o fim da situação de guerra iminente entre as duas coreias, do Norte e do Sul, com os EUA na posição de protectores de Seul face ao já confirmado arsenal de armas nucleares na posse do regime de Pyongyang.

Depois de um encontro igualmente histórico entre os Presidentes da Coreia do Norte e da Coreia do Sul, seguiu-se um período de distensão, com alguns actos simbólicos pelo meio que alimentaram a esperança do fim do perigo de a Península Coreana se transformar no epicentro de uma eventual III Guerra Mundial, como foi o desmantelamento do sistema de som de propaganda que ambos os países atiravam para o outro lado da fronteia há décadas ininterruptas, ou ainda as imagens que correram o mundo daquele pequeno salto do Presidente sul-coreano, Moon Jae-in, com Kim Jong-un pela mão, na linha divisória entre os dois países.

Mas eis que tudo parece voltar à primeira forma e a ameaça voltou a instalar-se depois de, nas últimas horas, a Coreia do Norte cancelar uma cimeira de alto nível entre os dois países para preparar o caminho para um possível tratado de paz e deixar como séria possibilidade anular a cimeira com Donald Trump e Kim Jong-un que, se tivesse lugar, seria um dos momentos mais importantes da história mundial do século XXI.

A justificação oficial de Pyongyang é que os exercícios militares que começaram há escassos dias e devem durar duas a três semanas entre os EUA e a Coreia do Sul, que se têm realizado anualmente, são claramente a preparação de uma invasão à Coreia do Norte.

O preço pelo rasgar do acordo com o Irão?

Mas, para os analistas que hoje estão a ser ouvidos e citados na imprensa mundial, a decisão do Presidente norte-americano, Donald Trump, de rasgar o acordo nuclear com o Irão, apesar de ter sido assinado em 2015 com um conjunto de países europeus, China e Rússia, foi visto pela Coreia do Norte como um aviso para o que pode acontecer se assinar com os EUA um acordo que consagre o desmantelamento do seu programa nuclear, ficando militarmente à mercê do poderio militar convencional dos vizinhos do Sul e dos EUA.

Kim Jong-un viu como um aviso para o que lhe pode acontecer na forma como Donald Trump não cumpriu um compromisso com o peso de um acordo internacional envolvendo as maiores potências mundiais - União Europeia, a Rússia e a China -, como foi o acordo com o Irão, visando o desmantelamento do seu programa nuclear a troca do levantamento das sanções económicas.

Alias, Kim Jong-un já tinha outras indicações de como os compromissos internacionais deste género têm sido aproveitados pelas potências ocidentais para fragilizarem alguns países como antecâmara de ataques militares de larga escala, sendo disso exemplo a Líbia de Muammar Kadaffi, que desmantelou também um programa nuclear e de criação de sistemas de mísseis balísticos, ficando depois sem defesa para os ataques de uma coligação liderada pelos EUA que levou à queda do seu regime e à sua morte humilhante às mãos de rebeldes.

Apesar da anulação da cimeira Trump-Jong-un ser o cenário mais provável se os exercícios militares mistos Coreia do Sul-EUA, que já decorrem não forem suspensos de imediato, a administração norte-americana já veio dizer que não recebeu nenhum sinal de Pyongyang nesse sentido e que tudo continua a ser preparado para o encontro marcado para Singapura.

Todavia, é já claro que a cimeira com Kim Jong-un pode bem ser a primeira vítima da forma unilateral e criticada por quase toda a comunidade internacional como os EUA de Trump rasgaram o acordo nuclear com o Irão.