Este novo foco da doença, que já registou oito casos e quatro mortos, foi detectado na área de Mbandaka, uma cidade situada na margem esquerda do Rio Congo, a cerca de 600 quilómetros de Kinshasa, capital da RDC, com quem tem ligações por barco diárias, aproveitando o facto de esta via fluvial ser das mais importantes em todo o país, onde as estradas asfaltadas são escassas.

Por exemplo, para ligar por rio estas duas cidades, são precisas entre 10 e 20 horas, em média, com pouco mais de 600 kms para percorrer, sendo que, por estrada, esta distância sobe para mais de 2.000 quilómetros e pode demorar 48 horas a percorrer.

O Rio Congo liga ainda Mbandaka à fronteira norte de Angola, na província do Zaire.

Este surto epidémico surgiu quando a epidemia no leste do país, junto às fronteiras com o Uganda e o Ruanda, nas províncias do Kivu Norte e Ituri, que dura há dois anos e já matou milhares de pessoas, ainda não foi totalmente debelada, fazendo com que, de facto, a RDC se confronte actualmente com duas epidemias de Ébola, para além da Covid-19, sendo um dos países africanos mais afectados, e com uma vasta epidemia de sarampo, que já matou, em escassos meses, mais de 6.000 pessoas.

O próprio director-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, face a este novo surto de Ébola, afirmou que se trata de um "importante aviso" para o facto de a OMS, mesmo estado focada no combate à Covid-19, "continua a bater-se noutros campos onde responde a múltiplas ameaças e emergências"

E neste caso, o vírus do Ébola mostra estar a deslocar-se de forma rápida na região porque o último caso foi detectado na zona de Bikoro, uma cidade a 150 quilómetros de Mbandaka, junto ao Lago Tumba, que está ligado ao Rio Congo pelo canal Irebu.

Este paciente foi infectado, segundo as autoridades de saúde congolesas, depois de ter assistido ao funeral de uma das primeiras vítimas deste novo surto epidémico de Ébola.

Governo de Kinshasa atento e preocupado

O ministro da Saúde da RDC, Eteni Longondo, citado pelos media locais, informou que a declaração de epidemia, que teve lugar esta semana, foi antecedida pela confirmação da morte de quatro pessoas na cidade de Mbandaka com esta febre hemorrágica.

A sua declaração surge ainda quando, apesar de controlada, continuam a surgir casos no Leste, nas províncias do Kivu Norte e Ituri, junto às fronteiras com o Uganda e o Ruanda, onde, nos últimos dois anos, teve lugar uma das mais longas epidemias de Ébola, com vários milhares de casos, registando-se até ao momento 2.200 mortos, sendo a 2ª mais grave de sempre.

Eteni Longondo tem, nestas últimas 24 horas, mostrado a preocupação do Governo da RDC e tem garantido uma rápida resposta de forma a evitar que este surto evolua para uma epidemia de grandes dimensões.

O Ébola é uma doença hemorrágica que tem nos fluídos corporais a principal via de transmissão, sendo a sua letalidade, dependendo das condições sanitárias das comunidades atingidas, entre os 25% e os 85%, tendo a última, no leste da RDC, chegado aos 60% de mortalidade.

A concentração de pessoas e o deficiente saneamento básico são factores que facilitam a dispersão do vírus, o que em Mbandaka é um risco acrescido porque ambas as situações ocorrem, com muitos milhares de pessoas a viverem em comunidades pobres e degradadas e sem qualquer tipo de saneamento, bem como escassa resposta em unidades de saúde - a fotografia que acompanha esta notícia é de um dos acessos ao Rio Congo na cidade de Mbandaka.

Porém, esta doença já conta com uma vacina considerada eficaz no seu tratamento, embora não a 100%, mantendo-se como um perigo real e grave à saúde pública em África.

A primeira vez que foi detectada, em 1976, na província do Equador, onde esta nova epidemia está a deflagrar agora, os especialistas concluíram que o vírus chegou aos humanos através da carne de animais selvagens consumidos localmente, desde macacos a morcegos, entre outros, tal como se crê ter sido a causa da actual pandemia de Covid-19.

O risco de o Ébola chegar a Angola é real

Com esta nova epidemia localizada em Mbandaka, o risco de Angola, embora não evidente e reduzido, é, no entanto, real, porque esta cidade tem uma ligação directa com a fronteira norte angolana, o Rio Congo, uma espécie de auto-estrada fluvial nesta região de África, onde escasseiam as vias terrestres.

Isso mesmo lembrava em Agosto de 2019 o representante da OMS em Angola, Hernando Agudelo, reconhecendo que o ébola é uma ameaça para o país, depois de ter sido declarada a epidemia no leste da RDC, localizada em torno da cidade de Goma, a capital do Kivu Norte, que fica a cerca de 2.000 quilómetros de Angola e a cerca de mil de Kinshasa, a capital congolesa, que tem o maia directo acesso a Angola.

Neste caso, Mbandaka fica apenas a cerca de 600 quilómetros de Kinshasa e há, segundo informações recolhidas em sites de viagens, dezenas de barcos a fazer o percurso, embora as ligações directas sejam menos frequentes, embora existam várias por semana.

Nessa altura, como o Novo Jornal noticiava, Hernando Agudelo lembrou que, desde que o surto chegou à província do Goma, região com ligação directa com a cidade de Kinshasa, capital da RDC, que partilha a fronteira com Angola, a preocupação deveria ser maior.

O responsável confirmou, em declarações à imprensa, que embora esteja no nível dois em termos de territórios em risco, que partilham fronteira com a República Democrática do Congo, Angola deve ter capacidade de reacção rápida diante de um caso suspeito de ébola, uma vez que as medidas exigem supervisão e simulações, para garantir uma preparação adequada.

Segundo o representante da OMS em Angola, nas províncias que fazem fronteira com a RDC - Zaire, Uíge, Lundas Norte e Sul e Moxico - havia, na altura, há cerca de um ano, várias equipas de efectivos das Forças Armadas e da polícia fronteiriça a receber treino com o apoio da OMS, para aprenderem a lidar com o surto e passar os ensinamentos à população, pois, segundo o responsável, "é fundamental, em caso de diagnóstico, a população saber os procedimentos respeitantes à prevenção e ao manuseamento do risco clínico, nomeadamente no contacto com doentes e cadáveres, porque "a doença é altamente transmissível".