Os dirigentes políticos e partidários angolanos não foram capazes de evitá-la, o que teria sido possível, acabando por serem presas dela e com eles o povo angolano.

Com a implosão de um dos pólos da bipolaridade, no caso da ex-URSS, o fim da guerra em Angola era, como foi, uma questão de tempo.

Jonas Savimbi acabou por ser sacrificado a essa inevitabilidade.

Os avultadíssimos meios financeiros para suportar o esforço da guerra provinham na sua quase totalidade do petróleo, chegando a atingir 140 dólares por barril.

A guerra favoreceu a intermediação de beneficiários de comissões muito elevadas por efeito da compra de armamento e ainda por efeito dos que, directa ou indirectamente, comercializavam o petróleo, gerido pela Sonangol.

O fim da guerra fixou como objectivo a reconciliação nacional, com a consequente integração de militantes da Unita em postos de responsabilidade, a todos os níveis, o que foi alcançado com êxito, facto que não pode deixar de ser levado a crédito à acção do ex-Presidente José Eduardo dos Santos.

O reverso da medalha esteve na persistência do paradigma após a paz, da forma de gestão da economia e das finanças, continuando exclusivamente assente nos recursos do petróleo e na manutenção em postos de responsabilidade dos beneficiários das comissões passando estes a exibir de forma inaceitável fortunas chocantes, influenciando transversalmente toda a sociedade.

A teoria da chamada concentração primitiva do capital através da necessidade da criação de uma burguesia nacional pela entrega sem garantias de recursos públicos, abastardando a concepção marxista, que nada tem a ver esta forma de pensar e agir, conduziu de forma acelerada ao que se vive em Angola.

E o que se vive é resultado da queda brutal do preço do petróleo, agora em cerca de 30 dólares o barril, da forte diminuição do PIB, que conduziu a um ciclo vicioso pela ausência significativa do investimento público na diversificação da economia afecto antes a beneficiários egoístas, evidenciando-se agora na crise gerada o colapso do sistema financeiro e a carência de divisas, fazendo crescer em exponencial o desemprego.

A situação actual é, por isso, muito difícil neste mundo global e muito pouco solidário e há que contar sobretudo com as próprias forças.

O Presidente João Lourenço tem demonstrado coragem no combate a um grande mal endémico, que é a corrupção, mas esse combate para ser totalmente consequente tem de ser, não só coerente e percebido como deve correr a par de objectivos estratégicos com vista à diversificação da economia procurando, ainda, responder à gravíssima crise social existente.

É difícil existir uma quadratura mais complexa do que aquela que existe, e sendo a liberdade de expressão inequívoca em Angola, o que é um grande bem, é útil ter, porém presente que as pessoas não se alimentam de papel e agora cada vez menos nesta época do predomínio do digital.

O que o Sr. Presidente da República, por ser um militar conceituado e prestigiado, sabe bem é que nesta guerra, como em qualquer outra, não se pode deixar de cuidar dos soldados, o que neste caso significa cuidar das necessidades do povo.

Sabemos da complexidade do que isso representa, mas não há situação mais complexa do que a própria guerra, quando prosseguida sem meios de toda a natureza, o que não significa em função da vontade e determinação dos soldados e da firmeza estratégica dos generais que ela não possa resultar vitoriosa. Tudo depende da intensidade e sensibilidade da mobilização e da estratégia.

É por isso que nos parece que é muito importante que o poder político cuide de olhar para as reais necessidades dos cidadãos, por ser por aí que passará o futuro, ainda que se tenha que ter em conta os constrangimentos económicos e financeiros existentes. Como a História demonstra.

* Para celebrar os 18 anos de Paz, o Novo Jornal convidou personalidades com origem e ligações afectivas e profissionais a Angola, como Vitor Ramalho, secretário-geral da UCCLA - União das Cidades Capitais de Língua Portuguesa, nascido em 1948, na Caála, Angola.