O que este Presidente não pode, porém, é, em matéria de liberdade de imprensa, ser visto como a alma gémea de quem, nos últimos quarenta anos, formatou o poder político dominante em Angola.

Não pode ser acusado de ter colocado por aqui, sob "quarentena", o exercício de um jornalismo aberto, livre e crítico, nem de ter submetido, por aqui, a "confinamento financeiro" as empresas de comunicação social.

Nem de longe, nem de perto. E não pode porque, em matéria de liberdades democráticas, como agora se diz em linguagem pandémica, não existem "pontos de contacto" entre um e o outro.

Não pode porque "o confinamento financeiro" se deve em grande parte também à má gestão das empresas jornalísticas e o passado e o presente estão a demonstrar que um bom jornalista não é, necessariamente, um bom gestor de uma empresa jornalística.

Não pode porque os jornalistas, muito pouquíssimos, podem ser bons na arte de escrever e na direcção de projectos editoriais, mas, quando se trata de fazer contas e de enfrentar os desafios empresariais, são, grosso modo, uma verdadeira calamidade.

Não pode porque os destroços do despenhamento das sucessivas direcções e administrações dos órgãos públicos por aqui estão à vista. E o descalabro da gestão da totalidade dos órgãos privados, segue-lhe as peugadas...

Desse desastre não se podem assacar responsabilidades nem ao actual Presidente, nem ao seu antecessor. Mas, tendo estado um e outro, durante muitos anos ligados pelo mesmo cordão umbilical, há dois anos uma cirurgia política de grande profundidade acabou por separá-los de vez.

Este Presidente, na relação com a comunicação social, não pode ser comparado ao seu antecessor porque entre um e outro houve uma diferença crucial: o tempo. O primeiro acabou por ser surpreendido pelo tempo. O segundo está a surpreender o tempo.

O segundo fê-lo logo à chegada. E agora, dois anos depois, volta a surpreender. O primeiro andou sempre atrás do tempo. O segundo está a gerir o tempo. O primeiro, ultrapassado pelo tempo, colocou sempre um "Muro de Berlim" à frente da liberdade de imprensa.

O segundo, avançado no tempo, depois de ter derrubado o "Muro" logo à chegada, na semana passada, desfez-se de mais alguns vestígios do cadáver, dando uma pronta resposta ao grito de socorro lançado pelo Sindicato dos Jornalistas.

Este Presidente surpreende porque tem a noção de que o eventual apoio publicitário do Estado à imprensa privada não representa favor algum dos poderes públicos.

Surpreende porque lida com a comunicação social sem preconceitos, sem complexo de arrogância e despido do rancor aos "pasquins" incorporado no ADN do seu antecessor.

Surpreende porque aceita críticas da comunicação social e reparos da opinião pública, como ficou demonstrado no caso do Bairro dos Ministérios ou na ida à Namíbia em plena crise pandémica.

Surpreende porque - contrariamente a outros governantes, políticos, deputados e juízes, que não são órgãos de soberania... - convive bem com o direito ao protesto e à indignação dos cidadãos.

Surpreende porque, neste capítulo, em relação ao seu antecessor, promove o "distanciamento social" recomendado pelos serviços de saúde democrática...

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