A propósito do 1º de Maio, Dia Internacional do Trabalhador, que se assinala sexta-feira, o Novo Jornal ouviu políticos e sindicalistas, numa altura em que o mundo se debate com a pandemia Covid-19 e começam a surgir dados sobre um aumento do desemprego e da diminuição de direitos laborais.

A ideia de que os trabalhadores angolanos devem ser constantemente valorizados não é nova, mas que condições existem para que, pelo menos, neste contexto de crise, o desemprego não descole e os direitos laborais não sejam postos em causa? O Novo Jornal foi à procura de respostas.

O deputado da UNITA Alcides Sakala lamenta o facto de o Governo violar sistematicamente os direitos dos trabalhadores, quando deveria, sempre que existam conflitos de interesses, negociar com eles e encontrar plataformas de entendimento.

"Más condições de trabalho, salários em atraso, intimidação política, entre outras irregularidades, são a realidade dos trabalhadores angolanos desde que o País conquistou a independência em 1975", disse o deputado, frisando que "os direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores são elementos fundamentais de todo o Estado de Direito".

Manuel Fernandes, quarto vice-presidente da Assembleia Nacional, eleito pela CASA-CE, disse ao Novo Jornal que o 1º de Maio deste ano terá lugar num momento em que o País e o mundo atravessam uma pandeia que pode afectar de forma severa o mundo laboral e a vida das pessoas.

"A Pandemia já está a causar o desemprego de milhares de pessoas e vai aumentar a pobreza. A queda no emprego também significa grandes perdas de rendimento para os trabalhadores", observou o político, argumentando que "muitas empresas vão aproveitar a Covid-19 para despedir trabalhadores", exigindo, por isso, uma atenção especial do Governo.

O jurista Salvador Freire dos Santos, da associação Mãos Livres, questionado sobre a realidade laboral actual em Angola, e perante o actual contexto de crise, manifestou ao Novo Jornal a intenção de promover acções para de defesa e promoção de uma revisão da Lei Geral do Trabalho porque no seu entender "a actual penaliza os trabalhadores".

Deve-se criar um estado de opinião na sociedade para a revisão do diploma", sugeriu, sublinhando que "a Lei actual contribui para o aumento da precariedade laboral e empobrecimento acentuado das famílias".

Gregório Muanda, sociólogo, lamenta o facto de a taxa de desemprego no País ser superior a 30 por cento., um número que coloca em causa o próprio desenvolvimento nacional.

"Os dados do Instituto Nacional de Estatística apontam que 4.150.676 pessoas, maioritariamente mulheres e jovens, estão no desemprego. Este cenário não ajuda o desenvolvimento do País", frisou, acrescentando que um número considerável de empresas no País foi à falência por causa desta crise, o que permite adivinhar um novo aumento no desemprego.

"O encerramento de empresas em Angola nos últimos anos foi a causa do aumento da taxa de desemprego. A crise económica e financeira afectou muitos negócios, tendo muitos empresários sido obrigados a despedir pessoal", salientou, admitindo que este cenário se poderá agora agravar.

O secretário-geral da União Nacional dos Trabalhadores (UNTA) - Confederação Sindical, Manuel Viaje, sobre o contexto nacional e global em que comemora mais um Dia do Trabalhador, disse que este ano, a jornada de celebração será transformada numa jornada de reflexão e de solidariedade.

"Não estamos autorizados a fazer manifestação. Vamos comemorar o dia Internacional do Trabalhador reflectindo sobre as consequências que Covid-19 está causar no que diz respeito às vidas humanas e à economia", disse.

Questionado sobre as denúncias sobre a violação dos direitos do trabalhador, o sindicalista admitiu que estes são "pisoteados e humilhados pelas entidades empregadoras" aproveitando o contexto de crise e de medo social.

"Em muitas empresas tem havido violação dos direitos do trabalhador. As pessoas têm medo de denunciar porque existe o risco de perderem o emprego", avançou, apelando para uma maior vigilância contra as arbitrariedades.

O secretário-geral da UNTA - Confederação Sindical insistiu que, mais uma vez, este Dia do Trabalhador vai ser palco da defesa e da continuidade da luta pela revisão da actual Lei Geral do Trabalho, no sentido de esta ser mais eficaz na defesa de quem trabalha.

"A actual Lei é factor de instabilidade no emprego. Vamos continuar a dialogar com Governo para a sua revisão porque os trabalhadores precisam de estabilidade e de garantias", apontou, notando que essas condições são essenciais para a construção de um País mais justo.

Segundo Manuel Viaje, os sindicatos angolanos estão preocupados com o impacto da Covid-19 no sector laboral porque a situação pode ser aproveitada para medidas drásticas por parte do patronato que se quer ver livre dos seus trabalhadores.

O secretário-geral da Central Geral de Sindicatos Independentes e Livres de Angola (CGSILA), Francisco Jacinto, defendeu a necessidade de aumento salarial, pelo facto de os salários actuais estarem muito aquém das necessidades diárias, porque o poder de compra baixou substancialmente.

"Os salários estão aquém das necessidades diárias. Os trabalhadores são explorados. Por isso, defendemos o aumento dos ordenados dos funcionários e operários no País", acrescentou.

Defendeu ainda a necessidade da intensificação das acções de fiscalização nas empresas para a melhoria das condições de trabalho e a garantia dos direitos dos trabalhadores e deveres da entidade patronal.

Nos últimos quatro anos, de acordo com Francisco Jacinto, milhares de pessoas perderam o emprego, principalmente nos sectores da construção civil, comércio, prestação de serviços e indústria transformadora.

"Com o fortalecimento e crescimento dos sindicatos, o Estado organizou-se e tem vindo a criar leis e políticas que tiram a autonomia dos sindicatos para evitar possíveis embates entre os empregados e empregadores", frisou, lamentando que o Executivo esteja a abandonar os trabalhadores.

"Os governantes saquearam o erário público e abandonaram o País. Esse não foi o propósito da nossa independência", referiu, salientando que o 1º de Maio deste ano será comemorado num momento de tristeza face à pandemia que o mundo atravessa.

O secretário-geral da Central Geral de Sindicatos Independentes e Livres de Angola, Francisco Jacinto, receia que depois do fim da pandemia haja despedimentos em massa de muitos trabalhadores.

"Esperamos que isso não venha acontecer, porque os trabalhadores não são culpados do fenómeno que surgiu", explicou, acrescentando que estarão atentos ao desenrolar da situação.

O Dia Internacional dos Trabalhadores ou Festa do Trabalhador, uma das datas de maior abrangência mundial, sendo escassos os países que não a têm no seu calendário de festividades, nasceu da luta encetada na cidade de Chicago, EUA, em 1886, quando uma greve foi organizada para exigir melhores condições de trabalho, especialmente a redução do número de horas diárias, que ali era de 17 horas diárias, para oito.

Esta greve levou a confrontos com a polícia, tendo resultado em dezenas de mortes e centenas de detenções entre os trabalhadores, o que acabou por conduzir e inspirar muitas outras greves e manifestações com o mesmo objectivo, acabando por se instituir como o Dia Internacional do Trabalhador e um dos marcos mais sólidos das conquistas do mundo laboral sindical.