Numa entrevista à agência Lusa, a propósito da contenda entre os pastores brasileiros e um grupo de dissidentes angolanos da Igreja Universal do Reino de Deus em Angola, o embaixador do Brasil em Angola, Paulino Franco de Carvalho, afirmou que o Presidente angolano garantiu ao seu homólogo brasileiro que o diferendo IURD terá o "tratamento adequado.

Paulino Franco de Carvalho disse que o Chefe de Estado angolano respondeu por escrito a Jair Bolsonaro, reiterando "a excelência das relações bilaterais entre os dois países "e assegurando que, no que diz respeito às autoridades angolanas, esta integridade será garantida.

Na carta, "o Presidente João Lourenço afiança ao Presidente Bolsonaro que tudo o que diz respeito a esse diferendo entre a IURD aqui em Angola e ex-membros da IURD terá o tratamento adequado, cabível na justiça angolana", adiantou o embaixador brasileiro à Lusa.

Paulino Franco de Carvalho assegurou que o objectivo do governo brasileiro e, por extensão, da embaixada "não é imiscuir-se nas decisões tomadas pelas autoridades angolanas", mas solicitar que sejam protegidos os direitos dos cidadãos brasileiros que vivem em Angola, em particular os da Igreja Universal, sem entrar na disputa entre a direcção da IURD e a ala dissidente.

Na carta do Presidente do Brasil, divulgada no Twitter pelo seu filho no dia 14 deste mês, Bolsonaro dizia-se preocupado com "os recentes episódios em Angola de invasões a templos e outras instalações da Igreja Universal do Reino de Deus".

Na missiva enviada a João Lourenço lia-se ainda que se "registam relatos de agressões a membros da IURD, que em certos casos teriam sido expulsos das suas residências".

Bolsonaro considerava, na carta, que é "preciso evitar que fatos dessa ordem voltem a produzir-se ou sejam caracterizados como consequência de "disputas internas"".

O Presidente brasileiro lembrava que "há perto de 500 pastores da IURD em Angola e, nesse universo, 65 são brasileiros".

Para Bolsonaro, "os aludidos actos de violência são atribuídos a ex-membros da IURD, que também têm levantado acusações e, com isso, motivado diligências policiais na sede da entidade e nos domicílios de dirigentes seus".

A carta foi publicada por Eduardo Bolsonaro, filho do Presidente Brasileiro e deputado federal, depois de, na sexta-feira, 10, o Serviço de Investigação Criminal da Polícia Nacional de Angola (SIC) ter desenvolvido acções de busca e apreensão contra pastores da IURD por suspeita de evasão de divisas e de lavagem de dinheiro. Os templos religiosos também foram alvo dos mandados judiciais do SIC.

De lembrar que um grupo de fiéis e pastores brasileiros da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) tentaram tomar, pela força, a Catedral do Morro Bento, na Avenida 21 de Janeiro, em Luanda, no dia 24 de Junho.

Durante a tentativa de tomada, à força, do templo, houve resistência da parte angolana que não aceitou abandonar o local, chamando aa Polícia Nacional (PN), assim como efectivos da SIC, que em pouco tempo chegaram ao local para manter à ordem e a tranquilidade pública, e evitar que o pior acontecesse.

Segundo o porta-voz do Comando Provincial de Luanda da Polícia Nacional, inspector-chefe Nestor Goubel, tanto a parte brasileira como a parte angolana foram encaminhados para a 21.º esquadra, no Rocha Pinto, para prestarem declarações, como avançou o Novo Jornal.

"Eles não estão detidos, apenas convidamos os jovens e os pastores brasileiros, assim como os angolanos, a depor em função do sucedido durante a madrugada. Tão logo termine o depoimento, o caso será entregue ao Ministério Público", disse, na altura, Nestor Goubel, ao Novo Jornal.

O porta-voz da PN em Luanda assegurou que as autoridades estão a acompanhar toda a situação da Igreja Universal do Reino de Deus mas caberá aos tribunais decidirem a problemática que a IURD esta a viver.

Na segunda-feira, 22 de Junho, um movimento de bispos e pastores da Igreja Universal do Reino de Deus tomaram 30 templos em seis províncias do País, designadamente Benguela, Kwanza-Sul, Huambo, Malanje e Namibe.

Sob liderança do bispo Valente Bezerra, os pastores angolanos decidiram romper com a representação brasileira em Angola, encabeçada pelo bispo Honorilton Gonçalves, a quem acusam de uma série de irregularidades.

O movimento reivindicativo diz-se pronto para iniciar as reformas na igreja e não aceita ser conotada com dissidência nem o rótulo de "ex-pastores", como os brasileiros pretendem fazer passar junto da opinião pública.

"A Comissão Instaladora da Igreja Universal do Reino de Deus Reformada em Angola, continua a testemunhar actos de discriminação racial, castração, abortos forçados às esposas dos pastores angolanos e usurpação das competências da assembleia-geral de pastores", disse ao Jornal de Angola, o pastor Agostinho Martins da Silva, porta-voz da referida denominação.

Estas acusações juntam-se às de fuga de divisas para o estrangeiro, acusação que já remonta a 2016, como o Novo Jornal noticiou na altura, quando um ex-bispo desta igreja, Alfredo Paulo, fez severas acusações à liderança da IURD em Angola.

Situação é tensa desde 2016

Entretanto, segundo o porta-voz dos 300 pastores angolanos, a Comissão Instaladora decidiu montar o seu "Estado-Maior" na Catedral do Morro Bento, localizada na Avenida 21 de Janeiro, em Luanda.

O abuso de confiança na gestão financeira, assim como as irregularidades no pagamento da segurança social aos pastores e privação de visitas aos familiares, estão igualmente na base desta rotura com os pastores brasileiros.

De recordar que, em Novembro do ano passado, os bispos e pastores da Igreja Universal do Reino de Deus em Angola anunciaram, em Luanda, a rotura com o bispo Edir Macedo, por, alegadamente, este ter desenvolvido práticas doutrinais contrárias.

Num comunicado assinado por mais de 300 bispos e pastores angolanos, estes contaram, na ocasião, que a liderança brasileira, por orientação de Edir Macedo, passou a forçar os pastores angolanos a submeterem-se ao procedimento cirúrgico de "esterilização", tecnicamente conhecido como vasectomia.

Esta prática viola, de acordo com os contestatários, de forma grave, os direitos humanos, de acordo com a Constituição da República de Angola.

Os bispos e pastores angolanos acrescentam que, além disso, a liderança brasileira tem promovido a evasão de divisas para o exterior do País.

No mesmo mês, o director de Gabinete de Comunicação Institucional e Imprensa do Ministério do Interior, subcomissário Waldemar José, disse que uma comissão formada por representantes dos ministérios do Interior, da Cultura e da Justiça e Direitos Humanos estavam acompanhar as investigações na IURD e que a mesma se encontrava sob sigilo.

Apesar disso, Waldemar José, afirmou que "todos os indícios probatórios estão a ser investigados e isso vai permitir que seja determinada a relação criminal entre todos os envolvidos. Caso as denúncias sejam comprovadas, os responsáveis, individualmente ou até mesmo colectivamente, serão legalmente responsabilizados".