Logo após o jornal português Expresso ter divulgado uma notícia, no seu site online, sobre este relatório da Pangea Risk, rapidamente retomada pela Lusa e outros media, nacionais e internacionais, nas redes sociais foi imediato o sobressalto com centenas, mesmo milhares, de reencaminhamentos de notícias ou retoma do assunto, ou num evidente contra-ataque organizado, com desmentidos oficiosos em prosa ou através da estampa de fotografias e printscreens com o selo de "falso", tendo sido mesmo geradas "notícias" com alegados elementos ligados à consultora a desmentir a existência de tal relatório.

Perante esta notória "guerra" de "fakes", o Novo Jornal procurou recolher uma reacção da Presidência da República porque o documento da Pangea RIsk incide sobre o Presidente da República e não sobre o cidadão João Lourenço, referindo-se às consequências para Angola no capítulo das medidas de atenuação da crise económica, como, por exemplo, a reestruturação da dívida ou o financiamento multilateral, ou ainda a possibilidade de poderem comprometer as relações bilaterais com os EUA.

Foi com um seco "nada a comentar" que o gabinete de comunicação da Presidência respondeu ao Novo Jornal.

No entanto, o que é referido de maior substância no relatório desta consultora - que pode ler aqui se for assinante - de gestão de risco, anteriormente denominada EXX Africa, é que procuradores norte-americanos estão a investigar, há cerca de um ano, João Lourenço, a sua mulher, Ana Dias Lourenço, e um conjunto alargado de dirigentes nacionais próximos do Presidente da República sobre alegadas violações da legislação norte-americana incidindo estas em negócios feitos pelas pessoas referidas no "report" da Pangea Risk.

Recorde-se que uma das linhas de "defesa" oficiosa, com forte vinco nas redes sociais, dos dirigentes angolanos passa por ligar este relatório e a própria Pangea Risk a interesses próximos de Isabel dos Santos, um dos principais alvos da luta contra a corrupção declarada em Angola por João Lourenço assim que assumiu o poder, em Setembro de 2017.

De acordo com essa defesa oficiosa nos bastidores das redes sociais, sem relação oficial à Presidência ou ao MPLA, que também é visado negativamente, este relatório é alegadamente parte de uma estratégia de interesses ligados à filha do ex-Presidente José Eduardo dos Santos e de outras figuras directamente visadas no combate à corrupção e ao branqueamento de capitais para conter os efeitos na desintegração dos impérios e fortunas erguidas na vigência dos mandatos anteriores à chegada de João Lourenço ao poder.

A linha de raciocínio mais saliente no documento da Pangea Risk passa por sublinhar que a estratégia de combate à corrupção de Lourenço permitiu uma maior facilidade de acesso a financiamentos internacionais, nomeadamente por parte do Fundo Monetário Internacional (FMI), fundamental para diluir os efeitos dramáticos da crise gerada, primeiro, pela baixa do preço do petróleo, que depois foi exponenciada pelo surgimento da pandemia das Covid-19, mas que, agora, com esta "investigação" nos EUA, podem estar comprometidas de forma séria.

Mais ainda porque o documento evidencia uma disponibilidade da nova Administração norte-americana de Joe Biden em incentivar estas investigações que envolvem os dirigentes angolanos e as suas ligações a "negócios" que ferem a legislação dos EUA.

A Pangea Risk diz mesmo que as facilidades geradas a partir dos sinais dados por Angola de que o combate aos crimes de colarinho branco era mesmo a sério podem desaparecer num ápice a partir do momento em que forem sendo conhecidos novos contornos de ilegalidades com ligação a estes dirigentes angolanos, que tem no centro o nome do Presidente João Lourenço.

Em causa estão investigações, aponta o relatório, no âmbito da FCPA - Foreign Corrupt Practices Act/ Lei das Práticas de Corrupção no Estrangeiro (de 1977) -, a legislação que aborda crimes como transferências bancárias à margem da lei, práticas de branqueamento de capitais e corrupção no estrangeiro que tenha links para a aquisição de bens nos EUA ou visem defraudar o Departamento de Justiça, que podem ter um forte impacto no relacionamento futuro de Luanda com as instituições internacionais.

É referida uma lista de empresas, das quais se destaca a brasileira Odebrecht, que terão pago subornos a empresas com ligação aos dirigentes angolanos referenciados no relatório, ou ainda eventuais fraudes cometidas em transacções envolvendo empresas do mesmo universo, incluindo bancos e construtoras, ou ainda pagamentos à margem da lei a empresas de lobbying nos EUA, havendo mesmo risco de estas entidades verem contas congeladas ou até a proibição de viajar para território norte-americano.

Para a Pangea Risk, se estas alegações se revelarem sólidas, o relacionamento entre Angola e os EUA pode estar comprometido.

Todavia, segundo algumas abordagens a este relatório controverso, algumas ideias nele incluídas denotam uma presumível intenção de aliviar a pressão sobre o antigo circulo do poder de José Eduardo dos Santos, desde logo centrado na sua filha, Isabel, como é o caso, por exemplo, desta frase transcrita pela Lusa: "Está cada vez mais claro que a campanha anticorrupção que tem como alvo a família dos Santos apenas encobriram a criação de uma nova rede de clientelismo e apropriação de fundos públicos".