Encontramos Augusta Cuiela debaixo de uma árvore com outras senhoras, na Chimbemba, no município dos Gambos. Com o olhar preso no chão e em silêncio, ela só desviou o olhar quando abordada pela nossa equipa de reportagem. Vencida a timidez inicial, após alguns instantes de conversa, ela explicou que tem dois filhos mas que o companheiro a abandonou desde que partiu, foi para Luanda, com a promessa de ir em busca de melhores condições de vida. "Nunca mais nos contactou e não está a sustentar a família", lamentou.

A falta de chuva tornou mais difícil a prática da agricultura e Augusta ficou sem possibilidade de plantar na sua lavra. A esperança seriam as empresas que exploram rochas ornamentais na zona, mas poucos moradores do bairro conseguiram emprego nos estaleiros, pelo que se limitam a assistir à passagem dos camiões carregados com os recursos naturais retirados da terra natal. Como resultado, a situação das famílias locais é cada vez mais dramática e a fome uma constante.

O único cultivo que a população local consegue fazer no momento é de tomate que nas hortas locais, às vezes, vingam, resistindo à aridez dos solos. Quando consegue colher alguma coisa, Augusta vai a uma pequena praça local para vender e com o que consegue compra algo para comer. Os dias mais difíceis são penosos. "Quando não temos comida dormimos à fome mesmo, as crianças choram toda a noite e eu só lhes dou água, maboques e figos", relatou a senhora que acrescentou que os frutos silvestres não saciam, servem apenas para, como dizem localmente, "enganar a fome".

A situação da família de Augusta é de tal forma difícil, a ponto de ela e os seus filhos já chegarem a passar três dias apenas a beber água e a comer figos. O dramático relato foi confirmado pelas vizinhas que estavam com ela que fizeram questão de explicar que muitos moradores da zona têm histórias semelhantes para contar. Quem também lamenta as dificuldades que a população local enfrenta é Elma Mutombua, 22 anos, moradora no bairro Rio de Areia, no município dos Gambos. Diariamente ela deixa a casa dos seus familiares em direcção à escola onde frequenta a 9.ª classe.

Muitas vezes o percurso é feito sem ter feito uma refeição, pois a comida é escassa em função da seca que assola a região. A jovem, que tem dois filhos e foi abandonada pelo companheiro, tem nos estudos a esperança de um dia poder "ter uma vida melhor".

Elma vive numa casa com mais 30 familiares que diariamente lutam pela sobrevivência. Nos anos anteriores, dedicavam-se ao cultivo mas com o agravamento da seca deixaram de poder praticar a agricultura e nesta altura nem sequer têm sementes para plantar.

"No nosso bairro há muita fome, muitas pessoas estão a morrer e os bois também não aguentam", lamentou. Quanto à distribuição de ajuda alimentar no bairro Rio de Areia, ela referiu que o Governo está a enviar ajuda mas as pessoas encarregadas de distribuir às populações priorizam "os familiares e amigos".

"Por exemplo, não deram nada na nossa casa e nós estamos a sofrer", acrescentou.

Apesar das dificuldades, Elma garantiu que vai continuar a estudar e já está preocupada com o futuro, pois na zona pode apenas estudar até à 9ª classe e para continuar vai ter de deslocar-se a outros municípios.

"Não vou desistir, sei que tenho que continuar", frisou, com convicção.

Mulheres levantam-se pelos seus direitos

Mais adiante está a igreja principal da Missão de Nossa Senhora dos Gambos, onde há anos a população local trava uma "batalha" para que a água da nascente não seja desviada para outras zonas, deixando os moradores locais sem esse importante recurso que numa zona de seca pode fazer a diferença. A 300 metros do local estão localizadas as paredes da antiga igreja, um edifício da época colonial com mais de 120 anos de existência.

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