Esta iniciativa, que contempla cerca de 40 por cento da população angolana, segundo Francisco Queirós, vai ser "um trabalho árduo" para o qual o Governo está preparado.

Este anúncio foi feito em Lusaka, capital da Zâmbia, segundo uma nota do Ministério das Relações Exteriores ,quando discursava na 5.ª Conferência Africana dos Ministros Responsáveis pelo Registo de Nascimento e Estatísticas Vitais, que terminou na sexta-feira.

Este programa, segundo Francisco Queirós, vai ser iniciado, numa primeira fase, em três províncias que ainda não estão definidas quais serão, estando ainda dependente no seu avanço da confirmação da existência de recursos humanos e materiais necessários pelos parceiros.

"Temos disponíveis kits móveis, nomeadamente computadores e impressoras, que serão manuseados por técnicos devidamente formados", numa estratégia que irá privilegiar as soluções criadas localmente, acrescentou o ministro, sublinhando que a atribuição do Bilhete de Identidade ao cidadão é um acto de soberania.

Queirós lembrou nesta mensagem aos seus homólogos africanos que a experiência de Angola dos últimos anos não deve ser repetida porque o país, acrescenta a nota do MIREX, na ultima década gastou cerca de dois mil milhões de dólares com a contratação de serviços e soluções informáticas, num ambiente dominado pela falta de rigor e transparência.

"O inconveniente desta experiência é que, muitas destas empresas agem de má fé. Não repassam conhecimento e, mediante estratégias próprias, tornam reféns as instituições, que se vêm a braços, em situação de renegociação ou rescisão dos contratos", justificou, notando ainda que, à semelhança da maior parte dos estados africanos, em Angola, a questão relativa ao registo de nascimento e estatísticas vitais representa um permanente desafio, nomeadamente por causa do longo período de guerra e da porosidade das fronteiras que permite a entrada de muitas pessoas em buca da cidadania angolana.

Como o NJOnline escreveu em Março deste ano, a associação Handeka tem defendido que o Estado registe os 11 milhões de "não-cidadãos" com base no cartão de eleitor porque "ao entregar um cartão de eleitor, o Estado está a dar ao cidadão a presunção de nacionalidade, pois autorizando-o a votar, está a assumir que é angolano, isto porque apenas os cidadãos nacionais podem votar".

Os motivos para a falta de registo da maior parte da população não variam muito: pais que não assumem a paternidade dos filhos, outros que se desresponsabilizam da tarefa de ser pai, desleixo, ignorância e desconhecimento de direitos e deveres, extorsão, engano de uns quantos miseráveis sobre outros tão ou mais miseráveis, a tão falada corrupção que tudo corrói, sobretudo a vida dos mais desvalidos, vergonha, pobreza, miséria. Resultados vários de uma guerra que continua a fazer vítimas entre os mais frágeis, os desvalidos que ninguém quer ver e de que poucos parecem querer saber. Uma guerra que resvalou das trincheiras, depois se fez selva de dólares desbaratados, deixando um rasto de profunda desumanidade.

O artigo 32 da Constituição da República de Angola, tal como o artigo 6 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, reconhece que todas as pessoas têm direito a uma personalidade jurídica, o que não acontece com quase metade da população angolana.

O problema já não é novo nem desconhecido, mas isso pouco tem ajudado quem não tem registo e, por isso, "não existe" enquanto cidadão.