O procurador, Pascoal Joaquim, defendeu, durante a leitura da acusação, que os réus não pretenderam devolver voluntariamente os valores em causa.

"Para impedir o rastreio dos 500 milhões USD, o réu Valter Filipe, enquanto governador do BNA ordenou a transferência verbalmente, usurpando competências do Conselho de Administração do BNA sem qualquer registo do montante, violando por isso as normais do BNA que atestam que os valores acima de um milhão de USD só podem ser transaccionados pelo Conselho de Administração", explanou.

De acordo com o MP, para ocultarem os 500 milhões USD transferidos ilegalmente do Banco Nacional de Angola para uma conta no Credit Suisse de Londres, a transacção foi efectuada no Departamento de Gestão de Reserva do BNA sem qualquer registo na ocasião, tendo apenas ocorrido esse registo em Dezembro de 2017, "quando em rigor primeiro faz-se o registo e só depois a operação de transferência".

Segundo o procurador Pascoal Joaquim, depois de realizada a transferência, os valores foram congelados em Londres por não terem sido observadas as regras do compliance, ou seja, "os valores foram transferidos em desconformidade com as leis internas e externas".

Diante dessa situação, prossegue o MP, os réus tentaram convencer o então ministro das Finanças Archer Mangueira, testemunha no processo, a assinar um documento em representação do Governo de Angola, a confirmar que a transferência dos 500 milhões de USD visava uma operação legal, prometendo a esse, se assim se procedesse, que seriam transferidos para o País a quantia de 2,500 milhões USD na semana seguinte.

Já o advogado de defesa de Zenu dos Santos, António Figueiredo Simão, disse que o seu constituinte serviu apenas de ponte entre o Executivo e os promotores e que a condução do processo dos 500 milhões USD foi feito por Walter Filipe, conforme documento nos autos.

A sessão de discussão e julgamento procegue amanhã, terça-feira, com a audição dos primeiros declarantes.

Estão a ser julgados 4 réus, 11 declarantes e Três testemunhas.

Recorde-se que o antigo presidente do Fundo Soberano (FSDEA), José Filomeno dos Santos "Zenu", e o ex-Governador do Banco Nacional de Angola (BNA), Valter Filipe, começaram hoje a ser julgados no Tribunal Supremo (TS), em Luanda, acusados de branqueamento de capitais e peculato, no âmbito do conhecido caso dos 500 milhões USD transferidos ilegalmente do BNA para o estrangeiro.

A José Filomeno dos Santos e a Valter Filipe juntam-se ainda, na condição de arguidos, Jorge Gaudens e António Samalia Bule.

Zenu aparece neste julgamento pronunciado pelos crimes de peculato e branqueamento de capitais no seguimento da transferência dos 500 milhões USD para um banco em Londres, Reino Unidos, em Setembro de 2017, cuja finalidade era criar um fundo estratégico de 35 mil milhões USD que deveria viabilizar projectos estruturantes para a economia nacional, entre outras valias, nomeadamente a disponibilização de uma quantia avultada em moeda estrangeira - cerca de 300 milhões USD por semana - para responder às necessidades cambiais do país.

José Filomeno dos Santos, Jean-Claude Bastos de Morais, presidente da Quantum Global, uma empresa suíça que estava a gerir com Zenu o FDSEA, e Valter Filipe, estiveram cerca de um ano, até Março deste ano, em prisão preventiva.

O empresário Bastos de Morais, com dupla nacionalidade, suíça e angolana, após ter chegado a acordo com o FDSEA, deixou o país, logo após ter sido libertado, porque esse mesmo acordo consubstanciava a retirada de todas as queixas em tribunal contra si.