O general na reforma, de 73 anos, fez ontem questão de responder a todo o interrogatório, de mais de cinco horas, em pé, mesmo sendo convidado pelos juízes a sentar-se.

A sessão de ontem ficou ainda marcada pela recusa do general, que começou a ser julgado na quarta-feira pelos crimes de insubordinação e extravio de documentos, aparelhos ou objectos que contêm informações de carácter militar, em aceitar, perante o juiz da causa, que deveria entregado os documentos militares, onde se incluem os referentes à batalha do Cuíto Cuanavale, ao seu substituto, o general Fernando Miala, após ter sido exonerado, sem que antes o Presidente João Lourenço contactasse o seu antecessor, José Eduardo dos Santos.

"Os documentos pertencem ao camarada José Eduardo dos Santos, não ao Estado", respondeu, quando questionado pelo juiz do processo sobre as razões que o levaram a desviar documentos classificados como sendo de caractér militar.

De acordo com o antigo chefe da secreta militar angolana, quando o general Miala foi ao seu encontro e pediu os documentos, não fez a entrega dos mesmos porque o general Miala não se fazia acompanhar do título executivo assinado por João Lourenço.

"Eu nunca devia ter recebido o senhor Miala", afirmou, acrescentando que os documentos estavam guardados na Fundação Eduardo dos Santos (FESA) por orientação do ex-Presidente da República.

"E também porque foi José Eduardo dos Santos que me deu o dinheiro para a recolha dos dados que vieram a constituir os documentos", referiu.

Questionado pelo juiz-adjunto se o dinheiro pertencia a José Eduardo dos Santos ou aos cofres do Estado, o arguido respondeu que o ex-Presidente da República tirou dinheiro do seu bolso, pedindo-lhe para reconstituir a batalha do Cuíto Cuanavale porque não queria morrer sem deixar aos jovens a história do maior confronto militar da Guerra Civil Angolana.

O ex-chefe do Serviço de Inteligência e Segurança Militar, em prisão domiciliária desde Junho, falou ainda do "receio" de "uma cabala" em torno deste processo-crime.

De recordar que o arguido, antes de ser exonerado e passado à reforma pelo Presidente João Lourenço, trabalhava também para a Fundação Eduardo dos Santos e tinha como missão, coordenar a elaboração da história sobre os feitos do seu patrono, o ex-Presidente, incluindo a da da Batalha do Cuíto Cuanavale.

Estão arrolados como testemunhas no processo-crime contra o general Zé Maria os jornalistas da TPA Ernesto Bartolomeu, Isidro Sanhanga e Mário Vaz, pelo facto de os mesmos terem apresentado documentários e programas que reportavam factos sobre a batalha do Cuíto Cuanavale.

Estão de igual modo arrolados no processo como declarantes os deputados Higino Carneiro e Monteiro Leal Ngongo e o ex-presidente da República de Angola, José Eduardo dos Santos.

Fazem parte do colectivo de juízes o conselheiro presidente do Supremo Tribunal Militar, general António dos Santos Neto, e os adjuntos tenente general Carlos Vicente e Fernando Tavira, juízes conselheiros.