O presidente do Banco Privado Atlântico (BPA) e ex-vice-presidente do BCP falava, terça-feira, na qualidade de testemunha, no julgamento do caso Operação Fizz, em que o ex-procurador Orlando Figueira está acusado de corrupção passiva e outros crimes relacionados com o arquivamento de inquéritos-crime em que o suspeito era o antigo presidente da Sonangol e antigo vice-presidente de Angola Manuel Vicente.

Na inquirição, Carlos Silva continuou a negar que tivesse oferecido emprego a Orlando Figueira para ir trabalhar para o BPA Angola, contrariando declarações de Orlando Figueira que o aponta como responsável pelo seu contrato de trabalho, nunca cumprido.

O banqueiro negou qualquer participação na ideia de contratar Orlando Figueira, com um pagamento antecipado de 130 mil euros, observando ainda que nem Manuel Vicente, nem o engenheiro Armindo Pires (arguido e amigo de longa data de Manuel Vicente) alguma vez lhe falaram de dinheiros destinados ao ex-procurador do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP).

Apesar de admitir que teve uma vez um "almoço de cortesia" com o ex-procurador, Carlos Silva negou que alguma vez tivesse falado directamente com Orlando Figueira ou por interposta pessoa sobre a contratação do ex-magistrado para trabalhar na banca angolana.

Questionado pelo juiz presidente do colectivo, Alfredo Costa, sobre as razões que terão levado Orlando Figueira e Paulo Blanco a apresentarem uma versão dos factos que o envolvem no processo Operação Fizz e na contratação do ex-procurador, o banqueiro respondeu que "ainda não conseguiu encontrar explicação".

Contudo, mais à frente no seu depoimento, e perante a insistência do juiz, a testemunha admitiu que a situação é "anacrónica e grave demais", comentando: "Deve haver aí uma agenda escondida".

À saída do tribunal, Castanheira Neves, advogado que acompanhou o banqueiro apesar de este ser apenas testemunha no processo, admitiu aos jornalistas ter "uma ideia" do que será essa "agenda escondida" indicada por Carlos Silva, mas que não ia divulgá-la.

Durante a inquirição, o banqueiro rejeitou que fosse amigo próximo de Manuel Vicente, embora tivesse com ele bom relacionamento profissional, e demarcou-se também de qualquer intimidade ou excessiva proximidade com o advogado Paulo Blanco, alegando que este nunca o representou em qualquer processo em Portugal, apesar de o advogado representar interesses angolanos em território nacional.

Carlos Silva foi, porém, confrontado pelo colectivo de juízes com uma série de e-mails que lhe foram enviados por Paulo Blanco, tendo a testemunha alegando que não tomou conhecimento de muitas das mensagens, alegando que tinha uma assistente que filtrava a chuva de e-mails que recebia quase diariamente no banco.

No final da audiência, Paulo Blanco revelou aos jornalistas que todos os seus e-mails estão apreendidos nos autos e que "curiosamente" o Ministério Público nunca juntou ao processo as respostas de Carlos Silva aos seus e-mails, o mesmo se passando com os contratos e outras mensagens de correio electrónico.

"Julgo que isto é sintomático do curso da investigação", declarou Paulo Blanco aos jornalistas, dizendo ser com "enorme perplexidade" que constatou que o MP desde o princípio da Operação Fizz "omitiu factos que estão contidos no processo".

"Julgo que têm que fazer essa pergunta à Procuradora-Geral da República", atirou.

A Operação Fizz assenta na acusação de que o ex-vice-Presidente angolano, Manuel Vicente, corrompeu Orlando Figueira, com o pagamento de 760 mil euros, para que este arquivasse dois inquéritos, um deles o caso da empresa Portmill, relacionado com a aquisição de um imóvel de luxo no Estoril em 2008.

Após a separação da matéria criminal que envolve Vicente, que foi também presidente da Sonangol, o processo tem como arguidos Orlando Figueira, o empresário Armindo Pires e Paulo Blanco.

O ex-procurador do DCIAP está pronunciado por corrupção passiva, branqueamento de capitais, violação de segredo de justiça e falsificação de documentos, o advogado Paulo Blanco por corrupção activa em co-autoria, branqueamento também em co-autoria, violação de segredo de justiça e falsificação de documento em co-autoria.