Por detrás desta decisão de Bruxelas, que em termos diplomáticos é uma afronta, está o impasse eleitoral na RDC, onde o Presidente Joseph Kabila, que chega ao fim do seu segundo e último mandato permitido pela Constituição, se prepara para manter o lugar artificialmente por, pelo menos, mais dois anos sob o expediente do atraso na actualização do registo eleitoral.

Depois da extrema violência com que a polícia respondeu à manifestação convocada pela oposição, a 19 de Setembro, para exigir o cumprimento do calendário eleitoral previsto legalmente, que deixou um rasto de dezenas de mortos, a situação política no país não parou de se deteriorar.

Ainda ontem foi dado um passo de gigante no agudizar da tensão, quando o principal rosto da oposição a Kabila, Etienne Tshisekedi, prometeu mostrar um "cartão vermelho" ao ainda Chefe de Estado no dia em que terminar o seu mandato, a 19 de Novembro, deixando a porta aberta para novas manifestação e a eventual reacção das forças de segurança, como, de resto, é norma em Kinshasa.

Perante este cenário, onde tudo é possível, até o regresso do caos à RDC, o ministro dos Negócios Estrangeiros belga, Didier Reynders, em entrevista ao jornal Le Soir, mostrou estar muito preocupado com o "day after" à expiração do tempo máximo do mandato de Kabila, 20 de Novembro.

Essa dúvida é uma das justificações para a limitação a seis meses do prazo máximos dos vistos aos governantes da RDC, porque, apontou o ministro, "não se sabe o que vai acontecer a seguir, nem que tipo de contexto legal passará a vigorar. Mas estaremos, em todo o caso, perante um lógica diferente".

Os anteriores vistos tinham como duração máxima 12 meses.

A indefinição do futuro político da RDC tem como combustível o atraso no registo eleitoral que, segundo a oposição congolesa, foi o expediente encontrado por Kabila para contornar o impedimento constitucional de se recandidatar a um terceiro mandato, e da tentativa gorada em Janeiro de 2015 de alterar a Constituição para mudar os artigos que limitam a dois os mandatos seguidos.

Em Janeiro de 2015 ocorreram graves confrontos, com dezenas de mortos, levando o regime de Kabila a recuar nesta pretensão, e há cerca de três semanas voltou a violência quando a oposição convocou uma manifestação para exigir a eleição presidencial até 20 de Novembro.

O que, é já seguro, não vai acontecer, porque o registo eleitoral, segundo a comissão eleitoral independente, CENI, vão ser precisos mais dois anos, mais coisa menos coisa, para que tudo esteja preparado e possam, então, ter lugar as eleições. A confirmar-se este cenário, Kabila consegue prolongar o actual mandato por dois anos, quase metade de um terceiro se tivesse conseguido alterar a Constituição em 2015.

Comunidade internacional teme o pior na RDC

Depois de todas as organizações internacionais, da União Europeia à ONU, passando pela União Africana, pela organização que agrega os países francófonos, é agora a vez da acção da Conferência dos Grandes Lagos (CIRGL), a que Angola preside, tentar baixar os ânimos em Kinshasa.

Para isso está já agendada uma Cimeira para Luanda no próximo mês da CIRGL, com a questão da RDC como ponto único da agenda, onde o mundo terá então os olhos fixados, esperando que o Presidente angolano, José Eduardo dos Santos, que lidera a organização, e pela influência conhecida junto do Governo de Joseph Kabila, possa abrir uma brecha nas trincheiras da oposição e do Governo em Kinshasa.

Para já, as duas posições externas mais duras são as da França, com o próprio Presidente Hollande a acusar directamente Kabila de ser responsável pelo "desastre" no país, e agora da Bélgica, com esta limitação dos vistos ao Governo de Kabila, que, ao que parece, abrange o próprio Chefe de Estado.

Esta decisão de Bruxelas não deverá deixar de ser vista como uma atitude agressiva em Kinshasa e é, naturalmente, esperada uma resposta diplomática equivalente.