Apesar de estar de saída do poder após a realização das eleições agendadas para Dezembro, Kabila dá a cara pela denúncia da ingerência externa no preâmbulo das eleições: "Nós não podermos fazer da ONU uma organização para todos se a ingerência característica de alguns governos nos assuntos relevantes, sem dúvida, da política interna dos Estados, violando as regras que os regem, se tornam perigosamente toleradas, mesmo banalizadas".

Joseph Kabila, recorde-se, deixa agora o poder, depois de uma forte pressão exercida pela comunidade internacional, com Angola numa das primeiras linhas, mas esteve dois anos no poder para lá daquilo que eram os prazos legalmente limitados pela Constituição.

Os dois mandatos sucessivos de Kabila terminaram em Dezembro de 2016, mas, após uma vaga de violência e centenas de mortos, estas foram adiadas, através de um acordo de última hora - São Silvestre - com a oposição, para 2017, onde, no meio de violência, sofreram novo adiamento, desta feita para 23 de Dezembro deste ano.

A manutenção no poder através de expedientes foi a grande plataforma de críticas feitas pela comunidade internacional, incluindo a ONU e a União Africana, cenário que Kabila exponencia ao recusar quaisquer apoios externos para a realização das eleições, seja financeiro seja na logística, como, por exemplo, nos imprescindíveis helicópteros para que a votação possa chegar aos milhões de eleitores em zonas remotas ou sem acessos rodoviários devido à falta de manutenção de estradas.

E, sem melhor alvo para disparar o seu descontentamento, Kabila foi à ONU virar-se contra... a ONU.

Acusou a MONUSCO, a mais alargada e dispendiosa missão de paz e estabilização da ONU no mundo, de fazer parte do esquema de ingerência externa e exigiu a sua saída da RDC: "Vinte anos depois da chegada das forças da ONU ao Congo, e face à ausência de resultados operacionais positivos, o meu Governo reitera a exigência de retirada destas forças e que esse processo de retirada tenha início de imediato".

Kabila deixa fisicamente o poder mas tem estado a erguer uma teia que lhe deverá garantir a manutenção de uma grande influência nos destinos do Congo, nomeadamente através do impedimento de algumas candidaturas potencialmente ganhadoras, como a de Jean-Pierre Bemba, antigo vice-Presidente da RDC, e de Moise Katumbi, empresário e ex-governador do Katanga, ambos através de expedientes jurídico-legais.

O que deixa apenas nas mãos de Félix Tshisekedi a responsabilidade de bater nas urnas, se for afastada a possibilidade de irregularidades durante a votação, como a oposição tem denunciado estarem a ser preparadas, Emmanuel Ramazan, o ex-ministro do Interior, seu homem de confiança e escolha para candidato de Kabila.