Não sendo o exercício do jornalismo uma actividade que esteja isenta das falhas que possam advir da imperfeição humana, pelo menos a nosso favor reside o facto de não sermos nós a tomar partido sobre as coisas ou sobre os assuntos que constituem a principal agenda de trabalho desta nobre profissão. Para todos os efeitos, a nossa missão é única e exclusiva com a busca pela verdade dos factos. Uma busca que produziu, nas diferentes latitudes, resultados que ajudaram a moldar modelos de sociedades que hoje são conhecidas sobretudo pelo respeito pela dignidade humana.
Angola precisa, muito mais do que ontem, de uma imprensa que em definitivo saia das amarras dos grupos de interesses que procuram hoje, à custa de uma campanha pouco dissimulada de branqueamento de reputação, posicionar-se na esfera nacional como guardiões da moralidade pública, quando de moral já só lhes resta pouco mais do que uma manifestação de interesse que não vai por aí além!
É preciso que haja quem se posicione no interesse de uma imagem de decência que não ouse abrir mão de valores e princípios que a nobreza desta profissão dá a qualquer um de nós, como marco de um exercício de cidadania que acrescenta tanto valor a Angola como qualquer ente que pense o país com o sentido de Estado que se espera imperar nos dias que correm.
Apesar de reconhecermos os ossos do ofício da nobre missão que temos em mãos, há claramente, na abordagem da imprensa angolana, aqueles que decidiram colocar-se no lugar de instrumentos ao serviço de certos grupos de interesses, com a única finalidade de serem peças úteis. Há mesmo quem, percebendo a exposição que dá a profissão, se coloque na fila da frente para ser visto e tirar partido deste lugar de destaque. Em causa estão benesses que pensam não serem alcançáveis através da profissão, caso decidam manter-se fiéis a ela.
A estes colegas de profissão caberá tomar a decisão de escolha, de continuarem na profissão como meros instrumentos de actores económicos e/ou de entes políticos que tomaram de assalto o erário e que agora se sentem com legitimidade de quererem passar uma imagem de respeitabilidade, quando não a têm ou quando todos sabemos que pouco ou nada podem fazer para depurar uma imagem carcomida pela corrupção.
Compreende-se quando a pressão ou a imposição da censura, por exemplo, advenha do Poder Político. No entanto, o que se não compreende é que sejam os próprios jornalistas a tomarem a iniciativa de imporem a «lei da rolha», em troca de uns quantos tostões que não acrescentarão nada à sua reputação.
É por estas e outras que hoje o país atingiu o nível de ingovernabilidade que atingiu, porque não houve apenas aqueles que delapidaram o país. Houve também aqueles que foram cúmplices; aqueles que sempre souberam e que nunca tiveram a coragem de denunciar por estarem a receber contrapartidas monetárias e materiais.
Se estas contrapartidas se limitassem simplesmente à realização pessoal destas figuras e não tocassem na imagem reputacional da nossa profissão, com certeza que não estaríamos a escrever um artigo a dar conta destes caminhos inglórios trilhados por alguns dos nossos companheiros de profissão. Mas, não, estas realizações atrasaram e vão continuar a atrasar o país.
Claramente que não é este exercício da profissão que gostaríamos de ver em 2020, um ano em que os desafios políticos hão-de continuar os mais ambiciosos, sobretudo numa altura em que o país precisa de estar atento às decisões políticas que vão ditar o futuro de todos nós.
Com as mudanças políticas que se esperam, era suposto que fossem os jornalistas a tomar parte de um projecto de país que se recusasse a proteger aqueles que sempre foram os grandes responsáveis pela desgraça que tomou de assalto o país. É preciso que Angola acorde para o amanhã, mas que o faça com todas as suas forças úteis, e os jornalistas não podem ser mais uma peça instrumental para o aprofundamento das assimetrias sociais. Que o ano de 2020 nos prove o contrário daquilo que até fomos: cúmplices.
O colectivo de jornalistas deste semanário deseja a todos os angolanos
e não só um Feliz Natal e Próspero Ano Novo. Voltamos a estar juntos em 2020