Diariamente, a Rede Angolana das Organizações de Serviços de Sida (ANASO) recebe mais de 25 «pedidos de socorro» de portadores do Vírus da Imunodeficiência Humana (VIH) - uma média de 175 pedidos por semana-, implorando por medicação. A organização alega que também se encontra com «as mãos e os pés atados» e nada pode fazer para acudir a situação.

"Por dia, recebemos, em média, mais de 25 pessoas que nos mandam cópias de receitas, para que, junto das autoridades competentes, consigamos algum medicamento. As pessoas estão assustadas e sem medicação", faz saber ao Novo Jornal António Coelho, presidente da ANASO.

O facto deve-se à escassez de anti-retrovirais de segunda linha que se regista no país desde Março. Autoridades justificam escassez com a Covid-19 que, segundo o Instituto Nacional de Lutra contra a Sida (INLS), motivou o «bloqueio» dos anti-retrovirais na Índia, desde Fevereiro de 2020.

Em geral, são mais de 30 mil pessoas com VIH/Sida e que fazem tratamento com medicamentos de segunda linha. O líder da ANASO lamenta que nada possa fazer em relação aos anti-retrovirais. No entender de António Coelho, a única forma de ajudar os seropositivos é fazer pressão ao Estado, para que «desbloqueie», com urgência, os medicamentos retidos na Índia.

"Está-se a fazer advocacia, no sentido de se conseguir trazer os medicamentos para Angola, quer através dos voos humanitários, quer de uma outra forma", sublinha.

País tem mais de 300 mil seropositivos

Estima-se que pelo menos 340 mil pessoas sejam seropositivas em Angola. Destas, apenas 99 mil está em tratamento, sendo que 34 mil precisam de tratamentos de segunda linha. Os lesados ameaçam manifestar-se devido à situação.

Para António Coelho, a falta de medicação pode ter como principal consequência a mutação viral, o que pode fazer que o vírus tenha resistência e seja exigido um tratamento mais agressivo, como o de terceira linha, o que também não há no país. Isso obrigaria a quem necessite a recorrer a países como a África do Sul, Portugal e Brasil.

"O país não tem drogas de terceira linha. Quer dizer que estamos a criar um problema muito grande para quem faz com de segunda linha", frisa.

De acordo com a ANASO, por cada doente de primeira linha, o Estado gasta até 100 dólares mensais em anti-retrovirais. Sem avançar os valores, explica que os medicamentos de segunda linha são mais caros.

Cálculos feitos por este semanário mostram que o país desembolsa mais de seis milhões de dólares, por mês, na compra de anti-retrovirais de primeira linha.

António Coelho declara que a falta de anti-retrovirais se deve, em parte, ao "mau" trabalho de casa.

"Com ou sem Covid-19, o trabalho de casa foi mal feito. Não é a primeira vez que temos ruptura de stock. É uma situação recorrente", conta ao alertar que, caso o bloqueio continue, nos próximos tempos a situação poderá conhecer contornos mais preocupantes, com a ruptura do stock de anti-retrovirais de primeira linha, que já começa a escassear.

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