"Já é um mês sem sair, alimentação sempre a mesma e uma preocupação constante", disse Euclides Simeão, representante dos estudantes angolanos em Wuhan, em declarações à agência Lusa.

"Psicologicamente estamos esgotados", afirmou o aluno de engenharia de Ciências da Computação, temendo que, da "maneira que as coisas estão", a quarentena vá durar até três meses.

"Procuramos notícias boas, mas só vemos a situação piorar", declarou à Lusa.

"Há universidades que fornecem alimentação aos estudantes, as três refeições diárias, mas há outras que não têm acorrido tanto", esclareceu, informando que a Universidade de Tecnologia de Hubei, onde estuda e reside, está a "facilitar a vida", ao destacar funcionários para fazer compras nos poucos supermercados da cidade que permanecem abertos, assegurando assim o acesso a produtos frescos.

Cristo José Sebastião, outro aluno ouvido pela Lusa, diz que o mesmo não se passa na Universidade Huazhong, e reclama da falta de bens essenciais, incluindo água mineral.

"A água que eles fornecem é água da torneira. Por estes dias, tenho comido farinha com água e açúcar. Só me restam cinco garrafas de água", expõe.

O Parlamento angolano votou na quarta-feira, 19, uma moção onde os deputados mostraram a solidariedade do País para com os estudantes que estão na China, nas zonas mais afectadas pelo coronavírus.

O documento foi aprovado com 117 votos a favor e 55 abstenções, sem votos contra.

Mas, em declarações de voto separadas, a UNITA e a CASA-CE pediram mais, nomeadamente que o Executivo trate de organizar o repatriamento dos estudantes angolanos na China.

O deputado Raul Danda, da UNITA, acusou a maioria do MPLA de estar a evitar retirar os estudantes angolanos da China para não melindrar o Governo chinês "por causa do dinheiro que Angola recebe da China".

O parlamentar acrescentou que esta inacção se deve ao facto de os deputados da maioria não terem os seus filhos na posição dos que estão actualmente na cidade de Wuhan, que estão a clamar nas redes sociais pelo repatriamento.

Manuel da Cruz Neto, do MPLA, disse não concordar com esta posição da UNITA porque "todos estão preocupados com os estudantes na China", acrescentado que esta moção hoje aprovada é um incentivo para que o Executivo actue de forma a defender os interesses dos angolanos na China, sublinhando estar o MPLA convencido de que assim vai acontecer.

O vírus pelo continente

Apesar de o Governo garantir que estão acauteladas as situações que obriguem a medidas de contenção de um surto, o mesmo não pensa o bastonário da Ordem dos Enfermeiros de Angola, Paulo Luvualo, que afirmou ao Jornal de Angola que os hospitais do país não reúnem as condições necessárias para uma tarefa dessa dimensão e isso facilita a ocorrência de casos de contágio.

"Sabemos que os enfermeiros são quase sempre os primeiros a ser infectados em caso de epidemias, pelo que apelamos a quem de direito no sentido de criar condições para se enfrentar eventuais ocorrências de coronavírus", disse o enfermeiro, exemplificando com o facto de haver departamentos de pediatria onde, por exemplo, numa cama estão deitadas seis crianças, como sucede no hospital de Malanje.

"Imaginemos que dentro da pediatria haja uma criança com coronavírus, o que vai acontecer com as demais?, questionou, acrescentando o Jornal de Angola que o bastonário, enquanto técnico, considera que não há condições nos hospitais para fazer face à doença caso esta chegue a Angola.

Em África, o único caso confirmado permanece limitado ao Egipto, onde na semana passada foi detectado um caso referente a um cidadão chinês recentemente chegado daquele país, o que permite ao director-geral da Organização Mundial de Saúde (OMS), Tedros Adhanom Ghebreyesus, perspectivar um cenário onde este coronavírus não atinge com violência o continente africano.

E África continua a ser um dos focos de atenção da OMS apoiando os países a estarem preparados para conter um eventual surto, seja pelo envio de kits que permitem diagnósticos rápidos, seja pela informação sobre como criar centros de quarentena e para o controlo das fronteiras.

Em cerca de uma semana, 40 países no continente africano vão estar equipados com material de uso pessoal, como fatos de protecção integral, minilaboratórios com capacidade de detectar precocemente os contágios eventuais por Covid-19.

Como era o caso de Angola, até aqui a maioria dos países africanos viam-se na obrigação de enviar amostras de sangue para outros países, África do Sul ou Senegal, e esperar uma semana pelos resultados, enquanto agora esses testes são feitos localmente e os resultados são conseguidos em menos de 48 horas.

O vírus, o que é e o que fazer, sintomas

Estes vírus pertencem a uma família viral específica, a Coronaviridae, conhecida desde os anos de 1960, e afecta tanto humanos como animais, tendo sido responsável por duas pandemias de elevada gravidade, como a Síndrome Respiratória do Oriente Médio (MERS), transmitida de dromedários para humanos, e a Síndrome Respiratória Aguda Grave (SARS), transmitida de felinos para humanos, com início na China.

Inicialmente, esta doença era apenas transmitida de animais para humanos mas, com os vários surtos, alguns de pequena escala, este quadro evoluiu para um em que a transmissão ocorre de humano para humano, o que faz deste vírus muito mais perigoso, sendo um espirro, gotas de saliva, por mais minúsculas que sejam, ou tosse de indivíduos infectados o suficiente para uma contaminação.

Os sintomas associados a esta doença passam por febres altas, dificuldades em respirar, tosse, dores de garganta, o que faz deste quadro muito similar ao de uma gripe comum, podendo, no entanto, evoluir para formas graves de pneumonia e, nalguns casos, letais, especialmente em idosos, pessoas com o sistema imunitário fragilizado, doentes crónicos, etc.

O período de incubação médio é de 14 dias e durante o qual o vírus, ao contrário do que sucedeu com os outros surtos, tem a capacidade de transmissão durante a incubação, quando os indivíduos não apresentam sintomas, logo de mais complexo controlo.

A melhor forma de evitar este vírus, segundo os especialistas é não frequentar áreas de risco com muitas pessoas, não ir para espaços fechados e sem ventilação, usar máscara sanitária, lavar com frequência as mãos com desinfectante adequado, cobrir a boca e o nariz quando espirrar ou tossir, evitar o contacto com pessoas suspeitas de estarem doentes.