A razão é simples, se o crude se mantiver demoradamente abaixo dos 70 USD em Londres, existe um risco claro, como a ministra das Finanças, vera Daves, já o admitiu, de o Governo se ver na contingência de avançar para uma revisão do OGE 2025.
É que o documento reitor das contas nacionais foi elaborado com esse valor médio de referência e se o barril de Brent, a referência principal para as exportações nacionais, não abraçar essa fasquia em breve, a questão da revisão orçamental estará em cima da mesa.
Um economista disse mesmo ao Novo Jornal que esse momento, de analisar essa necessidade, pode muito bem acontecer nas próximas semanas, porque a partir de Junho a equipa económica de João Lourenço vai começar em breve a desenhar o OGE para 2026.
Além disso, nenhum Executivo pode manter as contas afinadas por muito tempo se a sua principal matéria de exportação, da qual muito do seu "sossego" depende, estiver desalinhado com o valor de referência usado para elaborar o "papel" onde assentam o seu deve e haver.
Para já, as notícias que chegam de além-mar apontam para sérias dificuldades nos mercados no que diz respeito a essa subida do valor do barril para os 70 USD, o que não estava nas contas dos analistas depois de a China e os EUA terem assinado um cessar-fogo na guerra das tarifas.
O anúncio das tréguas foi feito na segunda-feira, 12, e, de facto, o Brent ganhou um tom carregado de verde, passando mesmo os 3%, para cima dos 66 USD, mas depois, já no final do dia, caiu, inesperadamente, para os 64,8 USD.
Esta terça-feira, 13, o verde voltou a ser a cor dominante, mas menos acentuada, pelo menos durante a manhã, valendo o Brent 65,04 USD perto das 09:15, hora de Luanda, uma ligeira subida de 0,1 % face ao fecho anterior.
O porquê deste emperrado momento quando a travagem a fundo na guerra tarifária declarada por Donald Trump à China perspectivava um cenário muito diferente, não é claro que seja apenas um factor, mas entre os mais prováveis está a cedência da OPEP+ na velocidade de reposição da produção iniciada em Abril.
Isto, porque os mais de 955 mil barris por dia que em Junho estarão de volta ao mercado, 131 mil em Abrl, 411 mil em Maio e 411 mil em Junho, estão a levar a perdas substantivas entre os países-membros, com destaque para sauditas e russos, mas também Angola, embora o país esteja fora do "cartel" vai para dois anos.
Além disso, com a viagem oficial que o Presidente dos EUA está a fazer por estes dias a Arábia Saudita, Catar e Emiratos Árabes Unidos, a pressão do norte-americano sobre estes países para aumentarem a sua produção será um dos pontos da agenda.
Isto, porque Washington precisa de crude barato para poder combater a crise económica que os EUA atravessam, especialmente a inflação que mostra estar longe de controlada, o que está a impedir Trump de se aproximar de uma das principais promessas feitas antes de chegar à Casa Branca.
Todavia, se a Goldman Sachs estiver alinhada com a sua famosa capacidade de adivinhar o futuro, então, como avançam os media especializados, a OPEP+ poderá rever o seu plano de reposição de produção para reduzir o "buraco" artificial de mais de 6 mbpd somados nos últimos anos, especialmente desde a pandemia da Covid 19.
Aparentemente, segundo o "oráculo" norte-americano, como lembra Charles Kennedy, especialista da OilPrice, vai travar este plano de retoma da produção em Julho, alegadamente porque os experts do "cartel" chegaram agora à conclusão, a que todos já tinham chegado, de que o momento actual da economia planetária não é o melhor para esta medida política que visa agradar aos Estados Unidos como única lógica visível.
De uma forma ou de outra, a verdade é que ao longo dos próximos 90 dias, o prazo definido pelas duas maiores economias do mundo para as suas tréguas na guerra das tarifas, será o denominador comum para o que vierem a ser as decisões da organização que junta a OPEP e a Rússia mais alguns desalinhados desde 2017.
O acordo entre chineses e norte-americanos foi conseguido ao fim de um fim-de-semana de longas e duras negociações, como referem os media especializados, em Genebra, o que foi recebido em festa pelos mercados, não apenas os da energia, ou não fossem estas as duas maiores potências económicas do Planeta.
Recorde-se que, numa escalada vertiginosa, em apenas duas semanas, os EUA subiam até 145% as tarifas sobre os produtos Made in China, com Pequim a chegar aos 135%, tendo o Governo de Xi Jinping anunciado que não mexeria mais nestes valores por se estar já num nível de absurdo em que quaisquer mudanças não fariam diferença.
O acordo, segundo as agências de notícias, estipula uma descida de 115% de ambos os lados, embora os EUA mantenham 20% de tarifas ligadas ao que dizem ser a ajuda de Pequim ao tráfico de Fentanil, uma poderosa droga analgésica que está por detrás de centenas de milhares de mortes nos EUA todos os anos.
Esta medida mutuamente elogiada vai entrar em vigo já na quarta-feira, 14, significando isso que desde esse dia, as tarifas dos EUA sobre os bens importados da China passam de 145% para 30% enquanto os bens Made in USA pagarão 10% na China.
Como Luanda olha para este cenário global?
O actual cenário internacional, que não era tão dramático há anos, muito por causa das tarifas, apesar do alívio momentâneo que se vive, desde a pandemia da Covid 19, tende a manter os preços ainda longe do valor estimado no OGE 2025, que é de 70 USD.
Essa a razão pela qual Angola é um dos países mais atentos a estas oscilações, devido à sua conhecida dependência das receitas petrolíferas, e a importância que estas têm para lidar com a grave crise económica que atravessa, especialmente nas dimensões inflacionista e cambial, onde o esperado superavit (preço acima dos 70 USD) poderia ser importante para contrariar.
Isto, porque o crude ainda responde por cerca de 90% das exportações angolanas, 35% do PIB nacional e 60% das receitas fiscais do país, o que faz deste sector não apenas importante mas estratégico para o Executivo, que pode ser obrigado em breve a avançar para uma revisão do OGE.
O Governo deposita esperança, no curto e médio prazo, de conseguir o objectivo de aumentar a produção nacional, actualmente perto dos de 1,1 mbpd, gerando mais receita no sector de forma a, como, por exemplo, está a ser feito há anos em países como a Arábia Saudita ou os EAU, usar o dinheiro do petróleo para libertar a economia nacional da dependência do... petróleo.
O aumento da produção nacional não está a ser travada por falta de potencial, porque as reservas estimadas são de nove mil milhões de barris e já foi superior a 1,8 mbpd há pouco mais de uma década, o problema é claramente o desinvestimento das majors a operar no país.
Aliás, o Governo de João Lourenço tem ainda como motivo de preocupação uma continuada e prevista redução da produção de petróleo, que se estima que seja na ordem dos 20% na próxima década, estando actualmente pouco acima dos 1,1 milhões de barris por dia (mbpd), muito longe do seu máximo histórico de 1,8 mbpd em 2008.
Por detrás desta quebra, entre outros factores, o desinvestimento em toda a extensão do sector, deste a pesquisa à manutenção, quando se sabe que o offshore nacional, com os campos a funcionar, está em declínio há vários anos devido ao seu envelhecimento, ou seja, devido à sua perda de crude para extrair e as multinacionais não estão a demonstrar o interesse das últimas décadas em apostar no país.
A questão da urgente transição energética, devido às alterações climáticas, com os combustíveis fosseis a serem os maus da fita, é outro factor que está a esfumar a importância do sector petrolífero em Angola.