Grande parte dos comentários e críticas surge do facto de a lei vir a permitir que pessoas condenadas por crimes económicos e patrimoniais sejam recompensadas pelos desvios aplicados ao erário público, sugerindo ainda os mais críticos que, com esta lei, estaremos a promover e a aplaudir a corrupção.

Ora, o fenómeno da corrupção não é apenas "facilitado" pelo perdão. É encorajado por todo o angolano (e outros visitantes) que usa o Kwanza ou outros meios financeiros e patrimoniais ao seu dispor para ganhar vantagem sobre outros, para conquistar um lugar melhor na empresa em detrimento dos mais capazes, para conseguir matricular o filho na escola pública menos má, para que o polícia de trânsito feche os olhos à sua infracção, para manter os processos bem "oleados", para "descomplicar" a vida de alguém.

Enfim, um sem-número de eufemismos para encobrir a corrupção desenfreada e o hábito de agilizar processos e descaminhos.

Mas podemos ver também este perdão colectivo como uma forma de poupar os já parcos recursos do Orçamento Geral do Estado. Pode ser que, com a libertação dos 8 mil reclusos, mais dois ou três, haja uma melhoria significativa na dieta alimentar dos restantes detidos.

A poupança do Estado poderá permitir que os presos "de facto" possam comer mais produtos nacionais para além da fuba. Talvez tenham acesso a umas bananas de produção nacional e a uma variedade de hortícolas regados com a água do Kwanza e de outras fontes ainda não poluídas.

Um perdão colectivo já foi dado em 2002, aprovado por unanimidade, abrangendo os crimes de guerra e os crimes contra a segurança de Estado abrindo assim as avenidas para uma nova Angola que vai superando o trauma da guerra mas não o da desconfiança e o do oportunismo, que não deve ser confundido com o sentido de oportunidade.

O que é comum neste processo todo é que a nossa moeda vai aguentando o barco titubeante, onde um misto dos mais corajosos e dos sem outras opções continuam a remar nas águas turvas, tentando manter a cabeça fora d"água.

O nosso Kwanza, que já foi reajustado no passado, já foi novo novamente, já foi forte como o rio, agora volta aos seus velhos hábitos.

Fraquito, cambaleante. Deve ser o único que ainda não foi amnistiado e não cumpre os requisitos da actual lei. Por isso, proponho que a nossa moeda também seja beneficiada de um indulto presidencial sem precedentes; será a primeira moeda no mundo a ser indultada pelos crimes que cometeu ou que outros cometeram em seu nome, completamente desautorizados.

O Kwanza tem duas facetas. É esperado por todos no final do mês mas também é o motivo de muita desgraça quando chega, pois não chega, de

insuficiente que é, para fazer face às despesas. Propinas que sobem apesar dos limites impostos, terrenos baldios cuja pseudo venda acaba com a morte dos compradores, pedidos onde o Kwanza é substituído por moeda estrangeira, esquecido. Nos combas é motivo de discórdia.

O pão carcaça custa 80 Kwanzas; no candongueiro a corrida é encurtada mas o preço sobe; com ou sem luz no final do mês paga-se por estimativa; na água a música é a mesma; a única portagem é sobre o rio Kwanza; o câmbio está tipo vaivém espacial. A culpa é sempre do Kwanza. Não tem valor. Está desvalorizado, desmoralizado. Já não se sente à vontade no banco e esconde-se no garrafão ou no colchão.

Os americanos ficam com vontade de invadir Angola quando verificam que no mesmo soutien suado onde a kinguila guarda as notas de 2.000 Kwanzas também esconde uma ou várias notas de cabeças grandes, onde o Benjamim Franklin fica com um ar amarrotado. Não há respeito pelo dólar americano. E a culpa é do Kwanza, atrevido.

O salário está atrasado, perdido nas curvas e contracurvas da Leba. E a culpa é do Kwanza. Os recursos são encaminhados para funcionários ??????-fantasmas que dão aulas que não se vêem. É o Kwanza a diversificar os seus caminhos. Não pára quieto. Empreendedor.

Ele não tem culpa nenhuma. O seu actual estado é apenas o reflexo de crimes produzidos por outros. Se esses outros vão ser perdoados, então, por favor, perdoem a nossa moeda. Deixem-na voar livre como as aves desenhadas no seu anverso. Kwanza fraco como moeda mas forte como rio.