"Hospital Dom Alexandre do Nascimento está há quatro meses sem receber verba do Estado, o que obriga a permanente negociação com fornecedores e a fintar dificuldades de tesouraria - O Complexo Hospitalar de Doenças Cardiopulmonares Dom Alexandre do Nascimento, em Luanda, que deveria receber mensalmente 500 milhões de kwanzas, está desde Fevereiro sem receber dinheiro do Estado para pagar aos fornecedores de medicamentos, material gastável e outros serviços." [Novo Jornal, 03 de Junho de 2024].
Em Abril de 2024, as autoridades informaram que o país tinha um défice de cerca de 1.800 unidades sanitárias, das quais 90% de cuidados primários (cf. em:
https://www.youtube.com/live/ITJupbvT7R8?si=OeeB6X5mbfabHXEL ). Entretanto, a prioridade dos investimentos públicos no sector tem sido em hospitais secundários e terciários. Ainda assim, como evidencia essa amostra de notícias, sequer se assegura o pleno funcionamento dos mesmos, já que são descurados os recursos humanos e o financiamento adequado das despesas da sua operação e manutenção.
"Kilamba e KK 5000 correm o risco de desabar dentro de três anos - A centralidade do Kilamba e a urbanização KK 5000 correm o risco de desabar, nos próximos dois ou três anos, porque a Estação de Tratamento de Água Residuais (ETAR) está inoperante e não se faz manutenção na rede de águas residuais e pluviais desde que começou a receber moradores (há 13 anos), segundo a directora da Unidade Técnica de Gestão e Saneamento de Luanda (UTGSL), Zenilda Mandinga." [Jornal O País, por Stela Cambamba , 10 de Maio de 2024. ]
A ETAR do Kilamba terá sido abandonada - quando se transferiu do promotor/empreiteiro para as autoridades - por incapacidade, incompetência e descaso. Daí a sua degradação e inoperância, observando-se a obstrução, ruptura e transbordo dos esgotos. Então, na visita que efectuou ao referido equipamento, o Governador Provincial referiu que, no período de dois anos, ele seria recuperado. E, claro, tal recuperação custará ao Tesouro Nacional recursos que, de outro modo, serviriam para melhorar a prestação de outros serviços públicos.
"Angola triplicou capacidade de produção eléctrica em apenas oito anos - Luanda - Angola ampliou a sua capacidade instalada de produção de energia eléctrica de 2400 megawatts em 2015 para 6200 megawatts em 2023, o que representa um aumento de 258%, nos últimos oito anos.
[...]
O governante [Secretário de Estado da Energia de Angola, Arlindo Bota] (...) deu a conhecer também que Angola dispõe actualmente de uma taxa de electrificação de 43% e que dez das 18 províncias angolanas estão ligadas à rede nacional de transporte de energia. "Temos um excedente de produção de energia, sendo prioridade do sector proceder à interligação das demais províncias, concorrendo este objectivo para o aumento da taxa de electrificação até 50% no ano de 2027", disse. [GiraNotícias, Redacção, 10 de Maio de 2024.]
Se com uma capacidade de produção actual de 6,2 gigawatts de electricidade o País excede as suas necessidades de consumo, não se mostra coerente que se continue a priorizar o aumento da capacidade de produção da rede nacional em detrimento da distribuição, como sugere o facto dela vir a aumentar para 9 gigawatts com a conclusão de Caculo-Cabaça e se ter como objectivo de electrificação o alcance de uma taxa de apenas 50% em 2027.
"Dois anos e meio depois da inauguração, terminal rodoviário nunca funcionou e continua abandonado - Inaugurado a 22 de Junho de 2022, o Terminal Rodoviário Interprovincial Urbano de Passageiros do Kilamba nunca funcionou. Com um investimento de 2 mil milhões Kz, que à data da inauguração correspondiam a 4,76 milhões USD, está abandonado e com sinais claros de degradação." [Expansão, José Gonga, 30 de Outubro de 2024.]
"Assinatura do contrato de concessão para exploração, gestão e manutenção do Terminal Rodoviário de Luanda, 24/12/2024" [Cf. em: https://www.antt.gov.ao/pt/Comunicados].
Quase três anos depois da inauguração do Terminal Rodoviário do Kilamba, o Ministro dos Transporte veio a anunciar que os terminais rodoviários de passageiros entrariam em funcionamento entre Abril e Maio de 2025. E como justificação para o tempo em que o terminal de Luanda se manteve inoperante, relevou - pasme-se! - ter sido necessário realizar-se um concurso público para a sua gestão privada.
"Novo plano estratégico de universalização do BI prevê emissão nos municípios e comunas em 72 horas - Luanda - O Executivo angolano apresentou um novo plano estratégico para a universalização do bilhete de identidade, visando simplificar o acesso ao documento em todo o País.
O plano prevê a descentralização da emissão, que passará a ocorrer em cada município e, em alguns casos, até mesmo em comunas. O objectivo é garantir que cada cidadão possa a receber seu bilhete de identidade no local onde o solicitou, com um prazo de emissão de até 72 horas. Para isso, os Balcões Únicos de Atendimento ao Público (BUAP), criados para o registo eleitoral, serão adaptados para se tornarem repartições públicas dedicadas ao atendimento dos serviços de identificação." [Jornal o Guardião, José Luís Mussemo, 30 de Outubro de 2024.]
Em Agosto de 2009, na sequência da aprovação Lei n.º 4/09, de 30 de Junho - Lei Sobre a Identificação Civil (LIC), foi introduzido um novo modelo de Bilhete de Identidade (BI) e iniciada a implementação de um projecto de emissão do documento na hora 1. O projecto baseava-se numa base de dados centralizada e na recolha dos elementos de identificação e impressão do documento descentralizado nos postos de identificação. O mesmo veio a enfrentar dificuldades de natureza logística, relacionadas com a falta de fiabilidade dos sistemas de informação e comunicação e do suprimento regular do material para a impressão.
Em 2017, a LIC foi alterada pela Lei n.º 20/17, de 31 de Agosto, com a qual se introduziu o modelo de BI dito integrado, por poder conter outros dados relevantes dos titulares 2.
Subsequentemente, em Novembro de 2019 o Governo inaugurou, em Luanda, o Centro de Produção do Bilhete de Identidade (CPBI) - um projecto de 243 milhões de USD - com o qual declarou que operaria uma "revolução" no acesso dos cidadãos ao BI, prevendo que atingiria uma cobertura, no final de 2022, acima da meta dos 77% do PDN 2018-2022. Além da produção, foi também centralizada no CPBI a impressão do BI. Surgiram depois relatos de atrasos no prazo da entrega do BI, por dificuldades com a transportação dos BI para as localidades de residência dos seus titulares.
Assim, em Setembro de 2022, responsáveis dos serviços de identificação falaram da implementação de alguns centros regionais de emissão e distribuição, o que constituiu uma admissão do fracasso da "revolução" então anunciada.
Agora o Governo anuncia um "Novo Plano Estratégico de Universalização do Bilhete de Identidade" - que vai absorver mais recursos públicos com equipamentos, como impressoras e não só - com o qual se retorna à emissão e impressão descentralizada do BI.
Passamos, assim, por uma amostra que nos permite perceber que o constante adiar da "resolução dos problemas do povo" estará relacionado com opções e prioridades erradas das políticas públicas, das quais resultam desperdício de recursos públicos. Mas como compreender a insistência e persistência das autoridades em tais opções e prioridades?
Em Roads to Nowhere: How Corruption in Public Investment Hurts Growth, Tanzi e Davoodi 3 sustentam, de um modo geral, que, em países com elevada corrupção e sistema de fiscalização, fracos políticos corruptos tendem a escolher projectos de investimento não com base no seu valor na resolução dos problemas existentes, mas pela oportunidade que oferecem de extracção de renda, o que tende a aumentar o número de projectos de investimento, o seu tamanho e a sua complexidade.
No caso angolano, temos ainda o deficiente escrutínio público, com os jornalistas dos órgãos públicos a actuarem mais como "comissários políticos" e os comentaristas/analistas de serviço não passam de spin doctors, pois quase sempre vêem mérito em todas as acções/realizações do Governo.
1 Cf. Guido, Luís Alberto. O identificador e a actividade de identificação civil e criminal angolana. ISSN: 2675-6218 -
RECIMA21 - Ciências Exatas e da Terra, Sociais, da Saúde, Humanas e Engenharia/Tecnologia, v.4, n.4, 2023, pág. 7.
2 Ibidem, pag. 8-9.
3 Tanzi, Vito e Davoodi, Hamid, International Monetary Fund, March, Economic Issues 12, 1998.