As fake news tornaram-se armas de arremesso, não são apenas falsas, mas são inventadas para serem verossímeis, para confundirem e manipularem os mais distraídos e menos atentos. Há momentos em que perceber o que é acessório e o que é essencial faz toda a diferença e livramo-nos de fazer parte de um jogo bem orquestrado de manipulação social e política com alvos bem definidos.

A desordem é tanta que hoje os sites, plataformas e perfis falsos surgem todos dias como cogumelos, actuam sem ética, rigor e profissionalismo e atacam tudo e todos. O jornalista português Paulo Pena diz que "a desinformação é um processo, é isso que a distingue do simples engano ou de uma opinião mal fundamentada. É uma sequência de actos concebidos por alguém, com o objectivo de manipular as convicções do maior número de pessoas".

As fake news são um instrumento hoje bastante eficaz para atacar direitos de personalidade como a honra, imagem e bom-nome, devassa da vida familiar e privada, um terreno do "vale- tudo", agravado pelo facto em que vivemos numa sociedade que se alimenta da desgraça alheia, do assassínio de carácter, do escárnio e da ridicularização.

As redes sociais são o palco privilegiado para circulação/ disseminação desta desinformação, em que os cidadãos são atacados sem direito ao contraditório e quem ataca permanece impune. Mas, o problema não é ou não está nas mensagens que são difundidas para desinformar, especular ou manipular. Era bom que tudo ficasse por aqui. Não! Produzir, publicar e "espalhar" fake news em Angola já se tornou num negócio bastante lucrativo.

Hoje existem sites criados por cidadãos, alguns deles com carteira profissional e que se apresentam como jornalistas, que vivem de receber dinheiro para a publicação de conteúdos falsos, manipulados com o objectivo de atacar pessoas e instituições. Copiam notícias, opiniões e entrevistas de jornais de facto, de órgãos que pagam impostos e salários aos jornalistas. Verdadeiras "sanguessugas" que se alimentam e deturpam o trabalho alheio. Fazem-no na maior liberdade, com um sentimento de impunidade, sob o olhar impávido e impotente do Ministério da Comunicação Social, da ERCA, da Comissão da Carteira e Ética, do Sindicato de Jornalistas e outros. Quanto mais likes, quanto mais visualizações e quanto mais viral for a desinformação partilhada, maior é a sua base de receitas. Existem também empresas do sector bancário, das telecomunicações e outros que pagam publicidade neste sites, com o objectivo de atingirem um público cada vez maior e iludidos pelos conteúdos virais e que estão a bater, acabando por contribuir para a perigosa e perniciosa máquina de ataque e destruição da democracia. Existem até gabinetes de comunicação de órgãos públicos (ministérios, governos provinciais e embaixadas) e de soberania (tribunais e Poder Legislativo) que pagam estes sites e páginas de Internet para não atacarem ou publicarem informações das suas chefias, havendo até agências de comunicação que fazem isso em relação a determinados clientes.

É um ciclo vicioso que se vai tornando virtuoso. O cidadão "A" produz informação falsa e caluniosa contra o cidadão "B" e paga vários sites para publicarem o conteúdo. O pagamento não é só pela publicação, o tal "pacote desinformativo" obriga estes sites a publicar estes conteúdos também nos vários grupos de Whatsap e tornar a informação viral. O visado/lesado é posteriormente contactado por "intermediários" que se oferecem a agir em sua defesa (mediante um pagamento), no sentido de retirar o conteúdo calunioso e difamatório dos diferentes sites, não sabendo, muitas vezes, que este "intermediário" é também parte do esquema.

Esses sites e os seus gestores são conhecidos, alguns deles exibem carteira profissional, cobrem eventos oficiais e se apresentam como jornalistas. Existindo outro esquema de quem usa o anonimato para desinformar, atacar e criar opinião sobre pessoas ou instituições, mas que, para além disso, encontrou uma forma fácil de ganhar dinheiro. Temos, hoje, em Angola, pessoas que estão deprimidas e afectadas psicologicamente, famílias separadas e desestruturadas, negócios e carreiras prejudicadas por causa desta prática nociva e que fazem dela um negócio. É essa sociedade onde queremos viver? É esse o País que pretendemos deixar para os nossos filhos? Uma sociedade que vive e se alimenta da desinformação, da manipulação e do assassínio de carácter?

Temos todos culpa, quando partilhámos informação falsa, porque não quisemos perder tempo a verificá-la, a cruzar informações e a confrontar factos. Porque gostamos do que lemos lá, porque dizem mal de alguém que não gostamos, desprezamos ou invejamos. Todos temos culpa, porque deixámos de investir e de acreditar no bom jornalismo. Temos culpa, porque deixámos que a desordem informativa ganhe espaço e esteja a lucrar com tudo isso.