A dispersão da população apresenta-se como um desafio sério à provisão dos serviços públicos de maneira eficiente e eficaz, nomeadamente os de educação, de saúde, de água e de electricidade, partindo-se do princípio de que quanto mais concentrada estiver a população mais fáceis são as soluções. Foi em decorrência disso que no Plano de Desenvolvimento Nacional 2018-2022 se identificou a "dispersão do povoamento rural" como factor que dificultava a "infra-estruturação" e contribuía para a "insuficiente cobertura territorial e de qualidade na prestação dos serviços sociais".

Consideramos, por isso, que, à partida, os poderes públicos devem implementar políticas indutoras de uma cada vez menor dispersão da população nos assentamentos humanos, as quais devem ter em conta a idiossincrasia dos grupos populacionais alvo e ser desenhadas e implementadas com a sua participação. Tal indução por meio de políticas públicas deve pressupor a existência de instrumentos estratégicos do Estado, nomeadamente as Principais Opções de Ordenamento do Território, com base nas quais se definiriam: as áreas de conservação, de exploração agrícola, de exploração florestal e de exploração mineira; as áreas de implantação de infra-estruturas de transporte (redes viárias, ferroviárias e aeroportos) e de implantação de indústrias; as áreas para os assentamentos humanos; e os Planos de Ordenamento do Território, os Planos Urbanísticos, os Planos Rurais e os Planos de Directores locais.

Mas, enquanto não se verificar a desejada concentração da população, a abordagem das soluções, intermédias, para a optimização da provisão dos serviços, traduzida em eficiência e eficácia, deve ter em conta a natureza do serviço a prover, o universo da população a atender, a dimensão dos equipamentos requeridos, os custos envolvidos e os resultados pretendidos. No que aos serviços de educação e saúde diz respeito, a maior dispersão da população coloca como principal desafio a combinação da necessidade da aproximação dos serviços à população, face a questões de mobilidade, e a de se evitar a ineficiência de uma demasiada "atomização" das unidades de prestação dos serviços (escolas e unidades de saúde); quanto aos serviços de água e de electricidade, o principal desafio estará em vencer a ineficiência da grande extensão exigível para as redes técnicas (de transporte e de distribuição) para servir, entretanto, pequenos núcleos populacionais, face ao seu elevado custo e impacto reduzido.

Assim, no que diz respeito aos serviços de educação e de saúde, as soluções envolvem decisões sobre a localização das escolas e das unidades de saúde, respectivamente, a sua dimensão e o seu número - tendo em conta o número de habitantes a atender e a sua maior ou menor dispersão -, os custos e o impacto esperado. Quer-se é que as escolas e as unidades de saúde estejam o mais próximo possível dos habitantes, pois o seu afastamento coloca o problema de mobilidade e, consequentemente, de acesso, e que tenham capacidade para atender ao número de habitantes da localidade considerada.

Então, no caso das escolas, passando por avaliação custo-benefício, as soluções podem passar pela criação de escolas com salas de aulas dispersas, bem como escolas em regime de internato. No primeiro caso, as salas de aulas acompanhariam a dispersão da população, o que requereria a que se garantissem as condições de mobilidade dos professores; no segundo caso, os alunos seriam recolhidos e permaneceriam em internatos durante as semanas lectivas, retornando às residências familiares nos períodos não lectivos, obviando-se a deslocação dos mesmos diariamente por longas distâncias.

Quanto às unidades de saúde, uma solução passa pela existência de unidades autónomas móveis devidamente equipadas - inclusive com meios de comunicação -, que prestariam os serviços de saúde de modo itinerante nos aglomerados populacionais, associadas e em articulação com unidades fixas, mais diferenciadas, localizadas, por exemplo, nas sedes comunais.

Em relação à água, dependendo das condições locais, as soluções podem passar por poços e furos artesianos localizados, assim como pequenos sistemas de captação e tratamento a partir de rios ou riachos, enquanto a distribuição pode incluir chafarizes e redes limitadas em função do maior ou menor grau de dispersão dos núcleos populacionais.

No que à electricidade diz respeito, a situação actual do sector eléctrico nacional angolano é paradigmática de opções ineficientes e ineficazes em situação de grande dispersão da população, o que nos terá suscitado a presente reflexão.

No nosso artigo anterior (edição do Novo Jornal de 22.07.2022), demos conta do facto de responsáveis do sector da electricidade terem referido, durante a edição do "Café CIPRA" de 07.06.2022, o facto de Angola ter, neste momento, capacidade de produção de electricidade excedendária, mas que, por limitações das redes de distribuição, o nível de electrificação do País ser de apenas 42,8%. Avalia-se que a capacidade em excesso seja de entre 30 e 40%, com tendência a aumentar face aos investimentos em curso em grandes empreendimentos de produção, como é o caso da barragem hidroeléctrica de Caculo-Cabaça, associado a um ritmo mais lento de investimentos nas redes de distribuição.

A significativa discrepância entre a produção excedentária de entre 30 e 40% e do défice de cobertura de 57,2% decorrerá, fundamentalmente, do facto de se continuar a privilegiar, como opção para a geração, grandes empreendimentos a integrar na rede do sistema eléctrico nacional, ao contrário do que seria a construção de unidades de geração independentes e dimensionadas às necessidades presentes e futuras das comunidades dispersas consideradas. Tal é o caso das centrais fotovoltaicas do Biópio e da Baía Farta que agregaram mais cerca de 275 MW à rede nacional - que já tem geradores ociosos - e, consequentemente, fizeram alargar a discrepância produção-cobertura. Isso decorre do facto de tais opções requererem investimentos em linhas de transportação em alta e média tensão, além das redes de distribuição em média e baixa tensão localizadas, as quais se mostram ineficientes e ineficazes porque onerosas por se destinarem a atender várias localidades dispersas e com reduzida densidade populacional.

É por isso compreensível que, com tal abordagem, a meta mínima de cobertura para 2027, que consta no Programa de Governo do MPLA, seja de apenas 50% (apenas mais 7,2 pontos percentuais em relação à cobertura actual, embora representando um aumento da cobertura de cerca de 25 pontos percentuais quando considerada a taxa de crescimento da população), quando a capacidade de produção actual já é suficiente para uma cobertura de 100% e ter-se ainda um excedente de entre 30 a 40%. A tal ritmo, seriam necessários aproximadamente mais cerca 40 anos para se atingir a electrificação total do País.

Entretanto, a capacidade excedentária existente sobre as necessidades de consumo actuais e a que resulta da limitação do consumo por insuficiente rede de distribuição sequer pode ser rentabilizada via exportação, já que, por exemplo, não foi avante o projecto do Western Power Corridor (WestCor) da SADC, o qual se propunha interligar as redes de electricidade dos países da costa ocidental africana membros da SADC, a partir da República Democrática do Congo e passando por Angola, pela Namíbia, pelo Botswana e indo até a África do Sul. Então o País tem capital considerável empatado.

Há, por isso, que se reconsiderar as opções, no que à provisão de serviços de electricidade diz respeito, a favor de sistemas de geração autónomos e independentes, para atender as localidades dispersas e para as quais não se mostra eficiente e eficaz fazerem-se linhas de transportação do sistema eléctrico público nacional. Dependendo das condições das localidades, as soluções podem incluir mini-hídricas e unidades fotovoltaicas.